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Dignificar o emprego científico

O atual debate público sobre o decreto-lei que institui um regime de contratação de doutorados é oportunidade para afirmarmos a estratégia de combate à precariedade do emprego científico. O essencial é a mudança de paradigma: deixamos de ter doutorados como falsos bolseiros e passamos a ter contratos, com os direitos laborais e sociais inerentes, sem qualquer perda de rendimento líquido anual (após impostos e descontos sociais), mesmo para os que comecem no índice remuneratório mais baixo. Subsídio de desemprego, subsídio de refeição, direito a compensação por caducidade no termo do contrato, descontos adequados para efeitos de reforma: não têm as bolsas, terão os contratos.

Mesmo a norma transitória do diploma é elemento importante de correção de injustiças acumuladas, porque obriga à abertura de concurso para contratos que cubram as funções desempenhadas por bolseiros há mais de três anos, seguidos ou interpolados, abrangendo logo mais de metade dos atuais bolseiros. Em sede parlamentar, o PS introduziu propostas para reforçar o sentido correto do diploma, designadamente contra a eternização de situações de contratação a prazo. Se um investigador estiver seis anos com um dos contratos previstos no diploma, essa relação de trabalho só pode prosseguir pela via de um concurso de acesso à carreira com perspetivas de progressão.

Importa sublinhar que o DL 57/2016 é, apenas, uma das peças de uma estratégia global do MCTES para dignificação do emprego científico, que passa, nomeadamente, por novas regras dos concursos para projetos de investigação e para a avaliação das unidades de I&D, que valorizarão as estratégias institucionais assentes na dignificação do emprego científico sustentável. Tal como passa pelos contratos de legislatura celebrados pelo governo e pelas universidades e politécnicos, que criaram um horizonte de estabilidade que permitiu às instituições comprometerem-se a contratar mais três mil docentes e investigadores até 2019. Bem como por outras iniciativas que expandem a procura de cientistas.

Evidentemente, este não é o caminho dos que defendem o regresso ao modelo elitista do Investigador FCT, que remunera melhor os que vencem a maratona com obstáculos, mas é apenas para uns poucos. Não aceitamos uma pequena ilha de suposta excelência, cercada de precariedade por todos os lados. O Investigador FCT representou uma redução brutal do número de contratos ativos com doutorados: o número de contratos que atribuiu em quatro anos é inferior ao número de bolseiros abrangidos apenas e imediatamente pela norma transitória do diploma atual.

O que estamos a fazer é virar a página da razia institucional com que o anterior governo ameaçou o futuro da ciência em Portugal. Porque bem sabemos que a precariedade é má para as pessoas e é má para as instituições.

In Diário de Notícias

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