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‘Política Com Palavra’ com Álvaro Beleza

‘Política Com Palavra’ com Álvaro Beleza


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Temos de facilitar a maneira das pessoas participarem na política, na decisão

Álvaro Beleza arrancou recentemente para o segundo mandato como Presidente da SEDES. Encara a associação como o berço das políticas progressistas do Portugal democrático e identifica na história dos Governos do PS “as marcas mais civilizacionais” desse progressismo: na criação do SNS, na paixão pela educação, na justiça. Encontra atualmente esse mesmo espírito na aposta no ambiente e no crescimento económico verde. E desafia o PS seguir esse mesmo caminho ao pedir mais espaço para os mais jovens.

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Nuno Sá Lourenço: Bom dia e bem-vindos a mais uma edição do Podcast “Política com Palavra”. Esta semana temos connosco Álvaro Beleza. É médico, foi membro do Secretariado Nacional do PS e atualmente vai no segundo mandato na presidência da SEDES. Muito obrigado por ter aceitado o nosso convite. Já foi dirigente do PS e é agora presidente da SEDES. O que é que o levou a aceitar este desafio de ir para uma organização que junta pessoas das mais variadas áreas políticas?

Álvaro Beleza: Muito obrigado, primeiro, pelo convite, é um gosto eu estar aqui. Pois, eu sou militante do PS desde 85, e estive na Comissão Nacional do PS décadas e já estou na Comissão Política Nacional do PS há mais de dez anos. Portanto, já sou um bocadinho jurássico. A SEDES tem muito a ver com o PS. A SEDES foi criada em 1970 por um conjunto de jovens, na altura quadros do centro-esquerda e do centro-direita – aqui esta sala do Centro da Esquerda é engraçada porque a SEDES é o centro, estava ao meio, mas juntou gente da esquerda e da direita - e das SEDES saíram o PPD/PSD, o Sá Carneiro, o Magalhães Mota era o Presidente da SEDES na altura e foi, aliás, com a mesa que está na SEDES que fizeram a primeira conferência de imprensa. E do Partido Socialista, saíram para o PS, João Cravinho, Vera Jardim, António Guterres, Vítor Constâncio. Portanto, dois líderes do PS, um ex-primeiro-ministro, que é o atual secretário-geral da ONU. Saiu, no fundo, uma certa linha progressista, a SEDES foi feita muito à volta da Capela do Rato (estamos aqui perto). Na altura do Cardeal-Patriarca de Lisboa e do bispo do Porto (o Sá Carneiro era próximo do Bispo do Porto). Portanto, da SEDES, que tentou ser um partido em 1970, e o Marcello Caetano não deixou, saíram depois os partidos da social-democracia. O PSD, laranja, a imitar o SPD alemão, e o Partido Socialista, que foi criado em 1973 na Alemanha, também sempre apoiado pelo SPD. E, portanto, é um partido do Socialismo Democrático, da social-democracia europeia

NSL: Que características que tinham essas pessoas que vieram para o PS?

 
Fotografias: José António Rodrigues
 

AB: A SEDES é a sede do reformismo. Era um conjunto de pessoas, que na altura, como é natural, os jovens eram mais da área do marxismo-leninismo, trotskistas, leninistas, mais revolucionários e, portanto, a SEDES é reformista por essência. O que os motivava era um Portugal social-democrata. Basicamente, todos bebiam nas águas da social-democracia. No fundo, aquilo que o PS é, o partido de centro-esquerda português, que fez reformas essenciais ao país e muitas delas apresentadas na SEDES. Por exemplo, muito daquilo do que António Correia de Campos fez enquanto governante, da construção do SNS, ele é da parte do PS, dos grandes construtores do SNS. O SNS foi criado pelo António Arnaut, num Governo Mário Soares, mas depois a construção teve vários ministros do lado do PS, vários e ótimos ministros: a Maria de Belém, o Adalberto Campos Fernandes, agora a Marta Temido. Mas o professor Correia de Campos, até por ser académico e por aquilo que ele estudou e escreveu, antes de ser ministro - duas vezes em dois Governos – é talvez o grande construtor do SNS e muito que ele escreveu está na SEDES. São cadernos da SEDES, em debates na SEDES. Mas as marcas do Partido Socialista, a SEDES defendia-as: a liberdade de expressão, a democracia parlamentar pluralista - e o PS liderou esse combate na Alameda em 1975 com Mário Soares, é bom não esquecer - depois, a criação de um serviço de saúde universal e gratuito para todos é a grande marca do Partido Socialista., com António Arnaut em 1977. Depois, a criação do sistema de justiça, como o primeiro-ministro salientou e bem, do Salgado Zenha, primeiro, e depois do Almeida Santos, com a separação de poderes, a criação, nomeadamente, do Ministério Público, que é a magistratura, não é assim em vários países europeus, com maior independência e do próprio sistema de justiça, independente do poder executivo e legislativo. Depois, eu penso que a Educação é a grande marca da SEDES. O Veiga Simão que começou a democratização do ensino ainda com Marcello Caetano, mas depois esteve no PS e o PS depois, nomeadamente, com o Governo de António Guterres dá o grande salto do investimento da ciência e tecnologia, com o professor Mariano Gago, o grande homem da explosão do ensino superior em Portugal.

NSL: E, portanto, a marca do PS é a do progressismo e do reformismo?

AB: São várias, é o progressismo é a social-democracia europeia, é o Estado social, nomeadamente, a área da saúde universal. Depois a educação, a educação é muito a paixão do PS, e bem. Portugal era um país muito analfabeto, com muito pouca literacia. Esse era o maior problema, é o maior problema. A Dinamarca há 100 anos, criou creches gratuitas para três anos. Aquilo que estamos a fazer agora. Essa tem sido a grande marca também do Partido Socialista, o investimento na educação. Depois também a marca ambiental de José Sócrates: acabar com as lixeiras, que foi uma guerra difícil, e depois as energias renováveis, que agora se percebe como a dependência da Rússia, com esta guerra, que é por aí o caminho.

NSL: E é essa a marca do progressismo atual que existe no PS: as energias renováveis?

AB: Eu acho que é uma marca do progressismo atual, é o ambiente. E o António Guterres, não é por acaso, ex-líder do PS, quase da Fundação do PS, esse é o combate dele, é pelas alterações climáticas. Ver aqui nisto um problema, mas uma oportunidade para a economia. As indústrias renováveis, toda essa área ambiental, é também uma área importantíssima para o crescimento económico. Nós podemos ter crescimento económico verde. O PS tem essa marca, e bem, e está a adotá-la, nomeadamente para os mais jovens. Hoje penso que é uma causa óbvia para os mais jovens. Outra causa importante que o PS defendeu, que começou com o líder da JS da altura, o Sérgio Sousa Pinto, mas que depois o PS adotou, já no século XXI é a marca do, o PS é liberal nos costumes e nos valores. Da igualdade de género e todas essas áreas. Portugal era muito conservador, e ainda é, e o PS começou esse combate e, portanto, também o agarrou e muito bem.

Os socialistas podem ter orgulho porque há, de facto, marcas de avanços civilizacionais extraordinários que Portugal teve e essas marcas são do PS. As marcas do PSD, da direita, são mais de economia, de crescimento económico, betão, autoestradas ou universidades no Interior. Também são coisas importantes. Mas as marcas mais civilizacionais são do Partido Socialista.

NSL: Falou há pouco nos mais jovens, tem usado a SEDES como plataforma para novas vozes. Acha que é uma necessidade, no país, de trazer os mais jovens para a política, para a discussão, para o debate?

   

AB: Primeiro, acho que é uma necessidade do país e do mundo a força dos moderados e a SEDES é o encontro ao meio, ao centro, da direita moderada e da esquerda moderada. O mundo está, infelizmente, com muitos extremismos, muitos populismos, muito radicalismo. Nesta era digital das redes sociais. Penso que faz muito sentido a pedagogia da moderação e a SEDES é a moderação. Depois também faz sentido a pedagogia da reforma, isto é, da melhoria contínua. E a esquerda sempre se afirmou como progressista. E, portanto, às vezes custa-me ver a esquerda conservadora a querer só manter o que tem e nós temos que evoluir. Depois a questão da juventude. Sim, esse é um problema brutal das sociedades mais desenvolvidas, não é só Portugal.

É que quem participa mais na política são os velhos, que vota mais, quem participa mais são os mais velhos. Os jovens participam pouco, participam muito na rede, mas depois, na hora do voto, não foram votar quando foi do Brexit. E a Grã-Bretanha saiu. Ficaram em casa. Não foram votar quando o Trump ganhou a primeira vez, ele ganhou, foi eleito.

Já foram na segunda, mas não foram na primeira. Os jovens participam pouco na vida política. Esse é o desafio que eu tenho feito por aí, pelo país, para eles dedicarem mais à política. A política é nobre. Eu sou um exemplo disso. Eu faço política desde 15 anos, aqui no Largo do Rato. Ajudei a fundar a JSD, primeiro. E depois atravessei a rua e estou no PS. Nunca tive um lugar político, nunca vivi da política. Eu sou médico, mas gosto da política e tenho muito orgulho nisso.

As pessoas acham que na política não podem ser independentes e livres: podem, eu digo o que quero. Aliás, essa é outra característica do PS, e que faz dele o maior partido português: é ter várias sensibilidades, tratar bem a história, tratar bem as várias sensibilidades, quem está no poder, respeita quem não é dessa sensibilidade. Isso também é uma boa tradição socialista.

Agora, os mais novos participam pouco, sim. Eu acho que ainda hoje participam muito pouco.

NSL: Toda a gente reconhece que é bem-vinda a participação dos mais jovens. Já se fala nisso já nisso. Aliciante. E não se vê grande mudança. O que acha que se pode fazer para passar dos desejos à concretização dessa participação?

AB: Há aqui também outro fenómeno que é uma certa modernização do país e a normalização da política. Isto é, a gente olha para os países europeus e nota que os políticos portugueses são muito grisalhos: Presidente da República, Primeiro-Ministro, é tudo cabelo branco, eu próprio. E olhas para os líderes da Europa do Norte, é tudo jovens mulheres, Primeiras-Ministras, normalíssimo. Aliás, as mulheres, como são maioria na população, são a maioria nos quadros, eu vivo com mulheres na medicina, na saúde, é natural que também sejam maioria na política.  Cá ainda não são. E há muitas mulheres na política, só tivemos uma Primeira-Ministra, que foi aliás a seguir ao 25 de Abril. Mas falta-nos isso: gente nova.

NSL: Mas como fazê-lo?

AB: Dar-lhes lugares na vida política e tornando a política mais sexy? Eu acho que nós também precisamos aqui de mudar algumas regras.

Temos de aproveitar as novas tecnologias para que haja mais voto por correspondência, para que haja mais voto antecipado, que possam votar ao sábado e ao domingo. Que se pense no voto digital.

NSL: E como é que se torna a política mais sexy?

AB: Para já, tem de se mudar as regras, porque as regras de acesso à política estão muito fechadas. O sistema eleitoral português está muito dependente das direções políticas, partidárias, distritais e nacionais e, portanto, quem não se portar bem não cresce. Portanto, tem de se alterar aqui, talvez, regras. No sistema eleitoral, para que as pessoas possam sentir que se forem para a política, para ser mais facilmente deputados, membros do Governo, autarcas do que hoje. Hoje as barreiras estão muito fechadas. Como a minha geração é a geração do 25 de Abril, do António Costa, é a geração que estivemos quando miúdos, no 25 de Abril. É natural que sejamos mais políticos que as outras, porque uma revolução é uma coisa extraordinária e vivemos momentos únicos em que todos fizeram política. Para a gente dar lugar a estes mais jovens, eu acho que temos de mudar um bocado as regras para lhes facilitar a vida. Eu acho que facilitar a vida era que se introduzisse círculos uninominais, que houvesse eleições primárias, que houvesse fórmulas para as pessoas participarem. E todos os partidos socialistas europeus que adotaram eleições primárias, adotaram essa participação cívica que é importante. Havendo mais participação na decisão, com poder, não é participar por participar. Por exemplo, orçamentos participativos. Foi aliás, a Câmara de Lisboa e o António Costa enquanto Presidente da Câmara que começou isso: isso é muito positivo. As pessoas gostam de decidir o que é que querem para sua rua, para a sua praça. Mas na política decidem muito pouco. O sistema está muito fechado. Os deputados respondem perante os chefes dos partidos e não perante os eleitores. Têm muito pouca liberdade individual. Isso, para mim, era a melhor maneira de festejar o 25 de Abril. Era nós fazermos essa reforma eleitoral. E outra, já agora, que é o sistema de voto para diminuir a abstenção, nós temos que ir a casa das pessoas. Isto é, entre aspas, onde é que eu quero chegar? Aproveitar as novas tecnologias para que haja mais voto por correspondência, para que haja mais voto antecipado, que possam votar ao sábado e ao domingo. Que se pense no voto digital. Vários países já têm com as ferramentas que já temos. Aliás, o Partido Socialista, internamente, aplica métodos eletrónicos. Já não há papel nos votos cá dentro do partido. O país tem de adotar isso. Eu acho que isso também tem a ver com os mais jovens, e com todos, as pessoas participarão mais. Temos que facilitar a maneira das pessoas participarem na política, na decisão, porque a República – o PS tem esse propósito, isto é, a República todo, e, portanto, essa seria aquela forma que eu acho que o PS é um partido republicano e tem isso no código genético – essa podia ser a reforma que o PS podia liderar e o PS até é muito aberto em relação à reformas eleitoral. Mas depois não tem que tomado decisões. Há coisas fundamentais para Portugal que são nossas marcas, do PS, mas talvez para o futuro, eu acho que a questão ambiental, da energia, é fundamental, até para o crescimento económico, a educação, continuar a investir nisso, tudo certo. Mas a reforma do sistema político, melhorá-lo, melhorar a democracia. Porque o mundo mudou brutalmente em 50 anos, no sentido digital, claro, com a garantia da segurança e a fiabilidade do voto e o segredo.

NSL: Mas esse tipo de mudanças, são mudanças que obrigariam a um consenso entre os principais partidos.

AB: A reforma eleitoral, por acaso, não, não precisa.

NSL: Certo, mas a questão é depois, com alternância de governo, depois não se desfazer o que foi feito.

AB: E por isso eu sempre defendi haver entendimentos em questões centrais, como essa. Questões eleitorais, acesso ao voto, a justiça, os pilares da democracia, deve haver entendimentos entre os partidos, nomeadamente entre os dois maiores partidos.

NSL: Neste momento temos uma situação em que o PS tem maioria absoluta. Já manifestou disponibilidade para trabalhar com os outros partidos, nomeadamente o PSD, e não tem havido disponibilidade. Como é que olha para a atual direção do PSD?

AB: Eu como presidente da SEDES tenho sido convidado para várias coisas do PSD e tenho-lhes dito isso lá dentro. Eu acho que o PSD devia ir beber muito ao espírito reformista de Sá Carneiro. Isto é: de um partido muito defensor da sociedade civil, da participação política, da cidadania na vida política. E na revisão constitucional ser até um pouco mais audaz, e apresentar um projeto interessante. Mas são pouco audazes. Por acaso acho que o PSD devia, na minha opinião, ser mais audaz e defender aquilo em que acredita, ponto. Para ir para uma negociação, o Partido Socialista tem que defender os pontos em que acredita que devem ser mudados, o PSD também, e depois uma negociação é isso mesmo, uma cedência de parte a parte. Se forem para lá com poucas coisinhas a pensar mais no que o outro pensa, isso não faz sentido. Eu acho que faz sentido partir de uma base em que cada um tem as suas posições de convicção, e depois tentar chegar a acordo. E depois acho que há outra, já agora, que era muito importante fazer: com a Constituição de 1975 acabou-se com a câmara alta. Só há 3 países na Europa que não têm Senado. Acabou-se por uma razão óbvia: era a câmara corporativa, era não-eleita. Hoje em dia, eu acho que fazia todo o sentido haver uma Câmara das Regiões em que, no Senado, estivessem representados por cada distrito, apenas dois eleitos, o que equilibrava o Interior com a cidade. Isto é, se houvesse um Senado em Portugal, em que tem dois senadores de Lisboa e dois de Portalegre, e que, como tem noutros países, o Senado tenha poder, não digo de veto do Orçamento, mas que obrigue o Orçamento a voltar, por exemplo, à câmara baixa, os investimentos no interior, iam ser maiores. como são nos países que têm Senado. Todos os Senados têm um papel de equilíbrio regional. Esse é outro problema de Portugal, porque é óbvio que quando um país se desenvolve, é o litoral que se desenvolve. Nos Estados Unidos, onde é que é desenvolvido? É no litoral, é Loas Angeles, São Francisco, mesmo Chicago é sempre pelo litoral, não é no interior, não é Denver. E, portanto, é natural que o crescimento seja no litoral. Mas nós temos que, na política, tomar decisões também para equilibrar e compensar essa perda. Mas não vejo ninguém falar disso. Mas essa é a minha maneira de política. Eu estou por ideias e por projetos e acho que a SEDES tem essa obrigação de fazer como sempre fez, que é pensar o país, pensar para décadas e depois, tentar influenciar o Partido Socialista, e nomeadamente, o PSD. E os outros, a Iniciativa Liberal os partidos do arco da democracia liberal. Há aqui uma baliza na SEDES. Mas a SEDES fala com todos os partidos com assento parlamentar.

NSL: O Álvaro é médico e há um médico agora como ministro da Saúde. Como é que avalia a nomeação de Manuel Pizarro como ministro?

AB: Pois, eu sou suspeito, porque sou médico, sou colega, sou amigo, fui colega dele mais velho na faculdade. Ele era caloiro, quando eu saí da faculdade e ele entrou no PS pouco tempo depois de eu ter entrado. Acho que que há uma esperança. O que eu sinto no hospital é que os profissionais de saúde têm de facto aqui alguma esperança, porque o SNS está a passar por momentos difíceis. A gente está sempre a atribuir culpas aos Governos, a saúde é muito difícil. A pandemia, tudo o que se passou em todo o mundo, os sistemas de saúde estão a atravessar tempos muito complicados. Mas há de facto, aqui, uma esperança porque ele é médico, conhece bem a saúde, já foi membro de Governo, já foi secretário de Estado, foi deputado, é líder do Partido Socialista do Porto há muitos anos, é uma pessoa experiente. Conhece toda a gente, conhece os profissionais, sabe que é estar num hospital, no terreno, tratar pessoas e isso é muito importante porque é disto que se trata. É preciso ser pragmático. Eu estava a pensar mesmo em medidas que ele está a propor e que fazem sentido: alargar horários dos centros de saúde quando há, no inverno, mais doenças respiratórias, por exemplo. Portanto, eu, sinceramente acho que ele tem estado bem e tenho esperança de que vai fazer um bom lugar. Claro que a saúde é muito difícil, porque a pressão é complicadíssima, é estrutural e conjuntural. A conjuntural é por causa da Pandemia e todas as consequências que ainda estamos a pagar: as listas de espera aumentaram porque as pessoas ficaram em casa um ano a mais. E, portanto, é óbvio que isso é uma pressão brutal. Depois há a questão psicológica dos que trabalham e dos doentes. As pessoas estão muito stressadas. Mais agora com a guerra, o medo da guerra, agora a inflação. Isto não tem sido fácil para todos e reflete-se na saúde e nas doenças, pois quanto mais stressante estamos, estamos mais doentes, temos consequências físicas e fisiológicas. E depois temos as questões estruturais. O SNS tem o problema do sistema político: Foi criado há quase 50 anos e o mundo hoje é um mundo digital. As pessoas hoje têm o doutor Google no telemóvel, querem escolher, temos a concorrência do privado, a concorrência da Europa, vêm buscar os melhores para Inglaterra, França, Alemanha, médicos, enfermeiros.

NSL: Qual deve ser a prioridade a enfrentar agora?

AB: Tem de haver paz e não é possível melhorar nada sem empenhamento dos médicos, dos enfermeiros, dos técnicos, administrativos, de que tem trabalha na saúde. Essa parte eu acho que está a ser bem feita. Está a haver diálogo, está a haver visitas aos hospitais. Acho que a ideia do CEO para o SNS faz sentido.

NSL: Porquê, o que é que muda?

AB: Porque o SNS português foi feito à imagem do inglês, e o inglês tem um diretor geral há muitos anos. Um SNS neste sistema tem que ter uma direção que governe todo o sistema em rede. E cá, nós não tínhamos, ainda por cima depois dividiram-se em ARS regionais, depois, os hospitais de um lado e os cuidados primários do outro. Portanto, a pandemia demonstrou que isto com coordenação e com rede funciona bem. E, portanto, faz todo sentido fazer o que já existe em Inglaterra. Onde o nosso modelo foi quase copiado. Tem que haver uma gestão central que achate, do teto à base. É preciso encurtar a distância entre o hospital, os cuidados primários e quem dirige lá em cima.