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“Vencer as autárquicas é o grande objetivo”

Presidente da Câmara Municipal de Vila Real, Rui Santos foi eleito no passado mês de maio como o novo líder da Associação Nacional dos Autarcas Socialistas (ANA/PS), sucedendo a José Luís Carneiro, atual secretário de Estado das Comunidades. Em entrevista exclusiva ao AS Digital, de que hoje publicamos a primeira parte, o novo líder dos autarcas socialistas fala dos objetivos e prioridades para um mandato que se inicia em vésperas de um novo ciclo autárquico e dos principais desafios que envolvem o poder local.

 

Foi eleito há menos de dois meses. Que objetivos e prioridades podem ser desde já identificados para este mandato?

Este mandato ficará indelevelmente marcado pelas eleições autárquicas do próximo ano. A ANA/PS terá que estar muito atenta, perceber que existem 308 realidades autárquicas do nosso país e procurar auxiliar, quer os nossos autarcas, quer aqueles que procurarão vir a sê-lo. Isto será conseguido através da criação de uma estratégia inteligente e ponderada, nunca imposta, e articulada de forma estreita com a direção do partido e todas as estruturas. No final, teremos que vencer as eleições autárquicas, sendo esse o objetivo maior do PS.

Ao mesmo tempo, a ANA-PS procurará ser um parceiro ativo na definição das novas políticas públicas relacionadas com as autarquias. Penso que esta estrutura partidária, que congrega a maioria dos autarcas do país, tem margem para ganhar um novo espaço e ser cada vez mais útil. A experiência acumulada, quer de autarcas mais antigos, quer de novos autarcas, as estratégias seguidas, a partilha de informação, devem estar congregadas. O Partido Socialista afirmou-se, desde a sua fundação, como o grande partido português do poder local. Os valores do humanismo e do socialismo democrático afirmaram-se como aqueles que, de facto, vão ao encontro das aspirações e necessidades dos cidadãos e têm sido os valores que estão por trás de grande parte dos avanços sociais e civilizacionais no nosso país e também no poder local e regional. É este o legado que queremos honrar.

 

A descentralização de competências para as autarquias e o reforço da autonomia local são assumidos como prioridades pelo atual Governo. Que leitura e que avaliação faz deste processo?

A intenção de iniciar o processo legislativo com vista a descentralizar competências próprias obriga a um processo de análise e consulta muito aprofundado e altamente participado por todos. A municipalização de competências na educação, saúde, ação social, proteção civil e segurança pública, cultura, transportes, setor primário e habitação poderão significar uma melhoria dos serviços públicos prestados aos cidadãos, acompanhados de uma melhor distribuição de recursos.

Não representando ainda uma regionalização, poderá permitir a perceção de quais são, de facto, as competências a delegar e a necessária alteração da Lei das Finanças Locais que permita aos municípios e às associações de municípios assumir os compromissos financeiros decorrentes da transferência de competências. Uma Lei das Finanças Locais que, independentemente da questão da delegação de competências, urge ser alterada de modo a poder ser cumprida.

 

As eleições diretas para as áreas metropolitanas e o reforço das CCDR são apontadas como exemplo da estratégia de democratização e descentralização assumida pelo Executivo.

Este processo permitirá também a definição de qual o papel de cada tipo de associação de municípios. As áreas metropolitanas de Lisboa e Porto representam uma realidade muito diferente da maioria das comunidades intermunicipais do país. Realidades diferentes devem merecer abordagens diferentes. Não só as competências a delegar deverão ser diferenciadas como o próprio enquadramento das Áreas Metropolitanas nas regiões plano deverá ser objeto de reflexão. Não será difícil constatar que praticamente todos os indicadores de desenvolvimento socioeconómico das duas áreas metropolitanas falam de um Portugal diferente de todo o resto.

Relativamente às CCDR, relembremos que na sua génese foram essencialmente responsáveis por estudos, planeamento e coordenação de projetos supramunicipais. Mais tarde, a adoção destas estruturas como gestoras dos Programas Operacionais Regionais e de outros fundos comunitários não foi acompanhada da regionalização da escolha dos seus responsáveis, que continua a caber ao governo. Desta forma, deturpa-se a intenção de responsabilização regional pelas opções estratégicas e de desenvolvimento e, em muitas situações, as CCDR acabam por funcionar como uma espécie de direção geral regional, sob tutela do governo central. Torna-se urgente repensar este modelo, introduzindo a eleição dos responsáveis máximos destas estruturas pelos autarcas eleitos no seu âmbito territorial, reforçando as suas competências e reformulando/reforçando os Conselhos Regionais como verdadeiras assembleias regionais representativas do território.

 

Depois da primeira geração de políticas, que se centraram sobretudo nas infraestruturas básicas, em que deverão assentar, em seu entender, as principais prioridades para uma nova geração de políticas autárquicas?

Em primeiro lugar, importa lembrar que a criação de infraestruturas básicas, em muitos territórios, ainda decorre. Posso dar o exemplo do concelho em que sou autarca e cuja taxa de cobertura de saneamento básico se encontra abaixo dos 65%, enquanto a média nacional é superior a 80%. Estamos neste momento a investir cerca de 11 milhões de euros para alterar esta realidade. Não podemos generalizar a noção de que as infraestruturas básicas estão concluídas. Nesta, como em tantas outras questões, Portugal é um país a várias velocidades. Também não devemos esquecer que o abandono a que foram votados os territórios de baixa densidade, nomeadamente pelo anterior governo, obriga os municípios a terem um papel fundamental junto das populações. Começamos agora a discutir a delegação de competências e recursos para os municípios, mas há muitos concelhos do nosso país em que a Câmara Municipal já é a Segurança Social, a delegação de Saúde ou direção de Educação.

Seja como for, a nova geração de políticas autárquicas deverá ser direcionada para a economia e para o desenvolvimento local. Também aqui há realidades muito díspares ao longo do país, mas penso que os autarcas estão bem cientes desta necessidade. A competição para a atração de investimentos, potenciadores da criação de emprego e da fixação das populações, passou a ser uma preocupação central dos municípios. E aqui continuo a considerar que esta luta deveria aliar os territórios de baixa densidade com os outros, nomeadamente do litoral. Criar condições para a convergência do interior com o litoral, nomeadamente no nível e qualidade de vida, é também ajudar a resolver alguns dos problemas do litoral. É necessário ajudar esses territórios a melhorarem a sua capacidade de atração e fixação de pessoas.

in Acção Socialista