“O PS foi o partido mais relevante dos últimos 50 anos em Portugal “
Na semana em que o PS assinala os seus 50 anos, juntamos duas gerações de socialistas no Política com Palavra. Alberto Arons de Carvalho, um dos fundadores do PS, discute com Joana Sá Pereira, uma das mais jovens deputadas do Grupo Parlamentar, o legado e o futuro do “partido mais relevante dos últimos 50 anos em Portugal”.
Nuno Sá Lourenço: Bom dia e bem-vindos a mais uma edição do Podcasts Política com Palavra. Esta semana assinalamos os 50 anos do Partido Socialista. Para isso, convidámos dois militantes do PS. Alberto Arons de Carvalho, fundador do Partido Socialista, e Joana Sá Pereira, uma das mais jovens deputadas da atual legislatura do Grupo Parlamentar do PS. Alberto e Joana, muito obrigado por terem aceitado o nosso convite. Começo por si, Alberto. Quais foram os objectivos que justificaram a criação de um partido?
Alberto Arons de Carvalho: Mário Soares fez um discurso muito assertivo e muito convincente. Eu, por exemplo, mudei de opinião. Tinha uma opinião, que trazia aqui da reunião de Lisboa, de preparação do Congresso e mudei de opinião ao ouvi-lo. Ele invocou, sobretudo, duas razões para a fundação ser feita. A primeira razão tinha a ver com um otimismo muito grande que ele tinha em relação ao fim do regime. Ele achava que, do ponto de vista internacional, o regime estava isolado, estava enfraquecido, que havia um grande descontentamento nas Forças Armadas e apresentou-nos uma visão muito otimista sobre o fim do regime fascista. A segunda razão que apresentou foi dizer que perante isso, tínhamos de criar uma alternativa ao regime que não fosse apenas o Partido Comunista. A oposição tinha que se organizar, tinha de apresentar aos regimes ocidentais, para a opinião pública nacional, uma alternativa consistente, organizada. E, portanto, por muito que pensássemos que a passagem de Ação Socialista Portuguesa para Partido Socialista envolveria riscos - e todos nos lembrávamos da prisão recente de Salgado Zenha, de Jaime Gama, do próprio exílio de Mário Soares - a verdade é que, digamos, a grande maioria das pessoas estavam presentes nessa reunião na Alemanha, ficaram convictas com a intervenção de Mário Soares e votaram a favor da Constituição do Partido Socialista.
NSL: Joana, nos dias que correm não existem os riscos que o Alberto falou. Os objetivos de um Partido Socialista nos dias de hoje são similares aos que foram definidos na altura da fundação do PS?
Joana Sá Pereira: Antes de mais, eu sou uma privilegiada porque sou filha deste atrevimento, que o Alberto e tantos outros tiveram, em construir um partido pluralista, onde todos pudessem encontrar uma causa para participar politicamente. Naturalmente, os desafios hoje são outros. Não sei se são mais fáceis ou menos fáceis. Acho que os tempos também exigem outros desafios. Há coisas que não dependem tanto do nosso controlo. Mas o que é certo é que o Partido Socialista, ao longo destes anos, foi deixando marcas muito consolidadas, muito relevantes na história do País. E por isso, hoje há só mais um desafio, que é o Partido Socialista continuar a ser, como define a sua carta de princípios, um partido laico, constituído por pessoas livres, conscientes dos direitos e deveres que têm enquanto cidadãos, que aceitam oferecer ao partido, segundo uma exigência e uma ética de responsabilidade, o seu empenhamento político. E, portanto, o partido, com todos os seus avanços, com todas as suas bonitas páginas da história, é hoje esta casa onde cada um de nós pode oferecer o seu empenhamento político. Eu estive com o Alberto, há pouco tempo, num evento onde se apelava para que as novas gerações combatam os novos fascismos. Era um evento que evocava os 50 anos do Congresso da Oposição Democrática, no qual o Alberto foi congressista e que também deixou sua marca na consolidação da Democracia em Portugal. O Partido Socialista tem naturalmente muitos desafios, mas sobretudo estar atento para combater estes novos fascismos, estas novas ameaças, que hoje surgem sob uma capa interessante. O filósofo Innerarity tem um livro muito giro que nos obriga a pensar sobre o como uma das principais ameaças à Democracia, atualmente, não é a corrupção, não é a violência, mas o simplismo. E é o simplismo por uma razão bastante elucidativa do tempo que vivemos. Diz ele que o simbolismo ignora, por um lado, a plurissignificação do mundo, a heterogeneidade, o pluralismo em que nos encontramos. E procura, no fundo, uma sensação de descompressão momentânea. Uma resposta que no momento nos alivie da preocupação instantânea que temos, sem pensarmos no contexto, na estrutura, de como a democracia é um processo. E, portanto, é este simplismo que eu acho que nós também temos de combater hoje, como combatemos sempre no Partido Socialista. A democracia é um processo, é um processo que tem variáveis complexas e é essa complexidade, essa riqueza e essa heterogeneidade que faz com que diferentes gerações se encontrem hoje, aqui,a celebrar os 50 anos do PS.
NSL: Alberto, estava à espera que 50 anos depois, a discussão política chegasse quase a este círculo, de termos que lidar com um partido que parece pouco saudosista do antigo regime?
Fotografias: José António Rodrigues / PS
AAC: Bom, eu devo dizer que há 50 anos a minha perspectiva nem sequer era tão otimista como a de Mário Soares. Estava longe de supor que estávamos a pouco mais de um ano do início da Democracia. E esse tempo foi um tempo de preparação, de tentativa de conjugação de esforços para que o regime caísse. Depois do 25 de Abril, o esforço principal foi organizar o partido, o que não foi muito difícil, porque não era preciso convidar as pessoas. As pessoas apareciam nas sedes do PS para se inscreverem, para participarem. E ao mesmo tempo, tínhamos que formular o Programa do Partido Socialista, começar a refletir. A partir de ali não estávamos apenas circunscritos a criticar. Tínhamos que apresentar alternativas e mesmo para participar na governação. Eu creio que ao longo dos anos, a ideia de que o regime democrático estava em risco de regresso de uma posição de extrema-direita nunca foi uma preocupação, porque a memória das pessoas era grande. É claro que passaram 50 anos e há muitas gerações que não viveram essa situação, e que não têm a noção da diferença que há entre um regime democrático e o regime anterior ao 25 de Abril.
Não falo apenas na liberdade, na possibilidade de nós dizermos o que pensamos, de falarmos livremente ao telefone, discutirmos num café e participarmos politicamente, de votarmos em eleições democráticas. Falo, também, na diferença que há a nível do desenvolvimento da sociedade, a nível social, no número de casas que têm hoje ligação à água, que é quase 100%. Na altura do 25 de Abril, metade das casas não a tinham. O número de estudantes universitários ou de pessoas com um curso superior subiu brutalmente.
Quer dizer, há um conjunto de dados que revelam uma mudança brutal da sociedade. No entanto, é evidente que há depois - estamos todos aqui a falar do Chega - quem tente esquecer esse passado, ou pelo menos disfarçar esse passado, e tentar, demagogicamente, iludir a opinião pública prometendo aquilo que não iria conseguir. Há 50 anos, era uma reflexão que não era feita. Estávamos todos empenhados em construir uma sociedade diferente e estávamos convencidos de que não havia o risco do regresso ao passado.
NSL: Joana, assim sendo, como é que se combate isso?
JSP: Tem sido um desafio brutal, e devo dizer até que esperávamos que, para esse combate, convergissem outras forças no Parlamento. Não diria que estamos sós, mas há partidos que estão em negação quanto à sua identidade política. Falo, concretamente, do espaço da direita.
Para o Partido Socialista tem sido um desafio tentar demonstrar às pessoas que as respostas simples que aquele partido preconiza - no caso concreto, o Chega - para um clique instantâneo para satisfazer momentaneamente uma ansiedade de um conjunto de pessoas, não é a resposta mais certa, nem a resposta mais justa. Pode ser a resposta mais fácil. Não tenho dúvidas que o Chega se preocupa em vender respostas fáceis. Mas nós, no Partido Socialista, temos um outro rigor e outra responsabilidade que nos obrigam a pensar na complexidade dos problemas.
É óbvio que, para o Chega, é bem mais fácil, em vez de problematizar sobre os problemas, a responsabilização colectiva, identificar um culpado e, à volta desse culpado, fazer emergir toda uma perceção de que é preciso uma alternativa, sem dizer muito bem como, em que termos, que é preciso fazer diferente. E eu julgo que esse não pode ser só um desafio do Partido Socialista. Eu acho que tem de ser um desafio colectivo, porque, enfim, quem adormece em Democracia pode acordar um dia em Ditadura. E eu acho que todos temos que estar despertos. E este tem que ser um desafio coletivo, transversal a todas as gerações, a todos os partidos. De quão importante é combater este discurso simplista, este discurso divisionista, que procura dividir o país entre os bons e os maus. E é este discurso que se tem aproveitado e se tem alimentado de algum desconforto das pessoas, do descontentamento que existe. É normal numa democracia complexa como a nossa. Essa não é a forma de estar do PS. Nós temos tentado fazer diferente no Parlamento e no país. Eu julgo que a forma como nós hoje respondemos a um conjunto desafios, ao Pós-Troika, a forma como conseguimos sair de um contexto super-austeritário, com a minha geração, a geração dos meus pais, a sofrer na pele diariamente, o contexto exigente económico, com salários cortados, pensões cortadas, adiamento de sonhos, e depois de virarmos essa página, enfrentámos uma Pandemia. Depois de enfrentarmos a página da Pandemia, com uma grande diferença, face às últimas crises: é que nas crises anteriores a escolha era sempre entre mais ou menos cortes. E nestas crises que o Partido Socialista enfrentou a escolha é entre mais ou menos apoios. Portanto, também aí há uma diferença substancial na forma como se lida com todas estas crises. Como estava a dizer, enfrentámos a Pandemia, saímos da Pandemia. Agora temos uma guerra às portas da Europa que tem trazido dificuldades no abastecimento alimentar, na cadeia energética. O Partido Socialista não vive para respostas conjunturais. Nunca foi essa a forma de estar do PS, nós temos atravessado todos estes desafios com o foco seguro de que nós olhamos para o país como um todo, sem procurar fomentar o individualismo nem o divisionismo, e procurando sempre que a minha geração em particular, mas todas as demais, possa ter no nosso país, o futuro que deseja e que merece.
NSL: Alberto, qual acha que foi a maior conquista, o maior legado do PS, nestes 50 anos?
AAC: É muito difícil dizer isso, porque foram vários os aspetos importantes. O PS foi decisivo na conquista da Democracia e também na defesa da Democracia, por exemplo, durante o período de 1975. Mas depois também deixou marcas na consolidação da Democracia. E também deixou marcas do ponto de vista social. Todos nos lembramos do papel decisivo que o PS teve no Serviço Nacional de Saúde. O PS também foi decisivo em colocar no espaço público, e em aprovar na Assembleia da República, matérias importantes como a interrupção voluntária da gravidez e outros direitos das pessoas. Ou seja, um conjunto de questões de natureza social, económica, política, que foram muito importantes.
Não há dúvida que o Partido Socialista foi o partido mais relevante dos últimos 50 anos em Portugal. O que governou mais tempo e o que deixou mais marcas.
Agora, isso traz, para o Partido Socialista, uma responsabilidade acrescida e o PS tem de estar comprometido com a sua história e com o seu passado. Tem que saber explicar às gerações mais novas os riscos da demagogia, os riscos do regresso ao passado e, ao mesmo tempo, ser capaz de adequar a sociedade, de adequar as políticas públicas aos novos desafios trazidos pela era digital, trazidos pelas preocupações ecológicas, pela mudança na questão do ambiente, etc.
NSL: Quais são esses desafios do futuro, Joana?
JSP: Para já, acho delicioso o slogan que o PS escolheu para as comemorações dos 50 anos: Um futuro com história. No fundo, esta apologia de que a história não está toda feita, que é preciso dar continuidade ao atrevimento que muitos tiveram no passado. Os desafios são muitos. E um partido como o Partido Socialista nunca está satisfeito com aquilo que tem conseguido alcançar. Nós estamos agora a discutir, por exemplo, uma questão que eu acho que é central e que, durante anos, nos fomos esquecendo. De como é importante para as políticas sociais termos uma habitação de qualidade acessível para todos, para que as pessoas possam ter um sítio onde morar, com condições dignas. E nós estamos agora a operar uma dessas reformas que julgo que terá impactos extraordinários em todo o território. É natural que uma reforma como a habitação não se faça de um dia para outro, precisamos do tempo. Mas isso também é um sinal de como um direito fundamental, que é o direito à habitação, inscrito na Constituição da República, ainda hoje está a ser concretizado. Se pudesse ter respondido à pergunta do Alberto, teria dificuldade em escolher um. Mas se o Nuno me pedisse mesmo para escolher um, eu diria que uma das maiores conquistas foi mesmo a Constituição da República Portuguesa. Para a qual o Partido Socialista deu um contributo notável e que é hoje o nosso maior projeto social, que nos define, que nos identifica e que norteia a nossa ação política e que atravessa tantos governos, e que não deixou de ter a marca sempre presente do Partido Socialista. Mas os desafios são muitos. Para a minha geração, em particular, a habitação, eu diria que é a prioridade máxima, poderem sair da casa dos pais, poderem ter um sítio para constituir família. Mas depois também há o direito a ter um emprego digno. E para esse objetivo eu gostava de recordar o empenho que o Partido Socialista deu na agenda do trabalho digno, que foi um pacote que aprovámos muito recentemente, que colocou justamente a precariedade jovem como um dos objetivos primordiais da ação política do PS. Durante anos nós fomos ouvindo dizer - e a direita dizia muitas vezes - que a legislação laboral era um empecilho para quem queria fomentar o desenvolvimento económico. E hoje nós assistimos exatamente o contrário. Foi possível demonstrar que maior flexibilidade não trouxe mais direitos nem mais garantias para os trabalhadores. E desse ponto de vista, acho que a agenda do trabalho digno continua a dar esse sinal claro para a minha geração. Mas muitos jovens nasceram já estava Portugal na União Europeia, nesse projeto fantástico que é podermos conhecer aquelas que são as nossas culturas à volta de Portugal, de podermos fazer um programas extraordinários como o Erasmus e podermos também ganhar qualificações e competências nesta livre circulação. Julgo que a integração europeia também trouxe à minha geração a possibilidade de conhecer outras culturas, de poder ter experiências e oportunidades noutros países e, sobretudo, beneficiar desta solidariedade comum que foi tão importante na altura da Pandemia. Nós sentirmos que não estamos sozinhos quando é para enfrentarmos desafios maiores que o nosso próprio país. Mas enfim, eu diria que a nossa geração é politicamente activa, empenhada, tem interesse em participar civicamente, mas também espera dos partidos, espera dos políticos que se preocupem com eles e que, no fundo, se empenhem em encontrar melhores respostas. Há também uma grande diferença: no passado bem recente, à minha geração era dito que, se quisessem ter oportunidades, tinham que sair do nosso país. Hoje, felizmente, a postura é exatamente oposta. o Partido Socialista está empenhado em trabalhar para que os jovens que queiram ser felizes em Portugal encontrem um espaço de dignidade, onde se possam naturalmente desenvolver e emancipar, que é isso que nós queremos todos.
NSL: Todos estes desafios de agora não obrigam um partido a olhar para a sua estrutura e pensar se devia repensar a maneira como os partidos estão organizados?
AAC: Eu creio que o PS é um partido em constante introspecção. O PS tem refletido. Ao longo dos anos mudou os seus Estatutos por diversas vezes. O que eu creio que é importante para um partido é aproveitar as possibilidades que hoje a era digital nos dá. Ou seja, a forma como as pessoas hoje em dia podem participar nas reuniões presencialmente ou à distância. A forma como, com acesso à internet, têm acesso a um vasto conjunto de intervenções e de discussões, debates. Eu creio que isso é absolutamente relevante. Eu creio que este este espaço onde nós estamos, o Centro da Esquerda, é um contributo muito importante, que o PS dá, para encontrar um espaço de discussão, de debate, de participação, que eu creio que é absolutamente essencial para o futuro do partido.
NSL: Abertura para o resto do país e da sociedade?
AAC: O PS não se pode fechar sobre si próprio. Tem de, no seu interior, continuar a criar condições para uma grande participação dos seus militantes. Mas deve também estar em permanente contacto com a sociedade, sensível às sugestões, às posições, às opiniões do conjunto da sociedade e estimulando a participação e a discussão pública.
JSP: O PS é um partido que está em constante evolução e tem-se adaptado a estas novas formas de fazer política. Hoje os jovens já não estão tanto à mesa do café, na praça central, enfim, em sítios mais físicos, como estavam, se calhar, na altura do Alberto. Hoje os jovens estão à distância de um telemóvel, de um computador, de um tablet. Isso obrigou o Partido Socialista modernizar-se mais. E há formas diferentes de estar em permanente contacto com os jovens. Essa é uma delas. Mas há, naturalmente, uma preocupação - como dizia o Alberto - de o Partido Socialista ter uma ligação permanente à sociedade civil. Se me perguntasse sobre uma iniciativa que o PS tenha feito no passado, que eu achasse que pudesse ser repetida, que eu acho que teve esse mérito de fazer essa aproximação. Foi iniciativa do então secretário-geral, António Guterres, dos Estados Gerais. Se nós pudéssemos fazer uma iniciativa neste binómio do Futuro com a História, julgo que a iniciativa dos Estados Gerais - e desta permanente conexão do Partido Socialista aos jovens, aos menos jovens, à sociedade civil, aos trabalhadores, aos empresários. No fundo, ser este partido pluralista, uma casa comum de todos os que querem fazer política. Essa é uma iniciativa que eu acho que permitiria aproximar ainda mais o Partido Socialista. Mas, como digo, acho que esse caminho está a ser feito. O Partido Socialista tem, de facto, trabalhado para continuar próximo das novas pessoas. E não é só com metodologias, é também com políticas.
Eu acho que a melhor forma de respondermos às preocupações dos mais jovens, e à preocupação que temos em que os mais jovens olhem para o Partido Socialista como um partido preocupado com eles, é oferecendo as melhores políticas que podemos pensar para as novas gerações.
Portanto, aliar esta forma de comunicar, mas também a questão material, com conteúdo e com a ação.
NSL: E o problema do distanciamento, que é geral, não é só do país, nem do Partido Socialista, das pessoas em relação aos partidos e à própria política. Isso é um problema?
AAC: Mas isso era o início da Democracia. Os partidos têm de se abrir à sociedade civil e têm que encontrar formas de contacto, não apenas de participação dos seus militantes, mas de contacto permanente com a sociedade. É claro que já há imensas formas de participação. Falamos disso. Há imensas formas de participação no espaço público. E depois há outra questão que me preocupa muito, que é o facto de haver um clima de desinformação no espaço público que tem a ver com os novos media e com as redes sociais, onde, muitas vezes, encontramos as chamadas fake news que são preocupantes. Portanto, a presença de um partido no espaço público, a presença permanente das pessoas nos debates para esclarecer a opinião pública, para evitar a instrumentalização demagógica dessas falsidades, é também uma prioridade nos dias de hoje.
NSL: Joana, quer acrescentar algo mais?
JSP: Absolutamente de acordo. Principalmente para nós, jovens, que não temos a experiência que tem a geração do Alberto justamente dessa transposição de mundo que se deu no 25 de Abril. Somos os alvos mais vulneráveis para a era da desinformação. Enfim, muitas vezes quando vamos tentar esclarecer, já vamos a correr atrás do prejuízo e isso nem sempre é fácil. Portanto, eu diria que um dos grandes desafios que nós temos é esta grande liberdade que nos trouxe um conjunto de projetos aos quais Portugal aderiu. Também trouxe consequências que são, para nós, desafios. No caso concreto, não só a desinformação inocente, mas também a desinformação premeditada. Tanto uma como outra, gostava que isto pudesse ficar claro. Não atinge só o Partido Socialista. A desinformação inocente e a desinformação premeditada atingem, sobretudo, a Democracia. Porque hoje está o Partido Socialista no poder, amanhã estarão outros. A Democracia continua, os partidos vão alternando entre si. Mas a desinformação não é só um problema que ataca o Partido Socialista. Ataca o próprio sistema democrático, porque as regras da nossa convivência, do nosso debate político passam a ser outras. As regras e os procedimentos passam a ser outros. Enfim. Eu acho que os partidos que são hoje oposição não perceberam ainda que um dia pode ser a sua vez de ter que lidar com a desinformação. E talvez aí façam um ato de contrição sobre a forma como se portaram relativamente à forma de fazer oposição que, julgo eu, não tem sido a mais correta.