Vicente Jorge Silva (1945-2020)
Todos aqueles que privaram com Vicente Jorge Silva são unânimes a reconhecer-lhe a genialidade, o arrojo, a ousadia, o talento infindável, a coragem, a frontalidade, o sentido de humor tantas vezes cortante e corrosivo, e muitas outras características próprias dos génios, com tudo o que isso acarreta.
Pioneiro e protagonista de várias revoluções no panorama dos media e da cultura em Portugal, Vicente Jorge Silva começou por, enquanto membro da direção do Comércio do Funchal, ser um opositor acérrimo do regime salazarista e do Estado Novo.
Mais tarde, e já depois do 25 de Abril, haveria de ser o criador da Revista do Expresso, uma inovação completa com a atribuição de papel relevante à cultura e aos temas internacionais, reforçando desta forma o posicionamento do semanário como jornal de referência e retirando-nos do confinamento paroquial em que, até então, vivíamos em Portugal. No fundo, como se costuma dizer, o Vicente Jorge Silva foi, nesta altura, um homem à frente do seu tempo.
Já no ano de 1990, sonhou, criou e fez nascer o Público, jornal de que foi o primeiro diretor. Mas foi muito mais do que isso. Vicente Jorge Silva foi o Pai de uma ideia e de um projeto editorial que, sob a sua liderança, se transformou num título incontornável e influente da imprensa portuguesa, trazendo aos leitores uma nova forma de fazer jornalismo com rigor e com ética, ao nível dos principais jornais que se publicavam no mundo inteiro.
Sempre atento e curioso pelo mundo que o rodeava, Vicente Jorge Silva aventurou-se então pela política, tendo sido eleito deputado pelo Partido Socialista, do qual era militante, num mandato que durou apenas dois anos, entre 2002 e 2004. Politicamente incorreto, porque frontal, Vicente Jorge Silva admitiu que esta foi uma experiência que não lhe encheu as medidas, porque, “para um jornalista, não é possível mudar de pele e alma”.
Saiu do Parlamento, apesar deste desconforto, tendo prestigiado a atividade parlamentar e o Grupo Parlamentar do PS com a sua inteligência, a sua irreverência, o seu imperativo ético e republicano e a sua visão do país e do mundo. Porém, nunca abandonou as suas matrizes ideológicas nem as renegou. Gostava de dizer, sempre que lhe perguntavam, que “desde que me conheço, sempre me considerei uma pessoa da esquerda democrática”. Essas preocupações e esses pensamentos estiveram sempre presentes nas crónicas que publicava nos jornais por onde foi passando enquanto colunista.
Apaixonado pelo cinema e pela fotografia, fez algumas incursões pelo universo artístico, tendo sempre a Madeira natal e o Funchal como referências obrigatórias. Vicente Jorge Silva era um inconformado, um rebelde, um exemplo de alguém que não se submetia aos que lhe queriam violentar a consciência ou a natureza. O Vicente Jorge Silva será sempre um exemplo e uma referência das convicções, do combate justo e leal, da honestidade e da franqueza.
Devemos-lhe, todos os democratas, um imenso obrigado e a certeza de que não deixaremos morrer a sua memória nem o seu legado.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista lamenta a perda de Vicente Jorge Silva e endereça as mais sentidas condolências à sua família.
Até sempre, Vicente Jorge Silva!