UMA TRAGÉDIA
Há factos e há opiniões. Anos e anos de agressões ambientais – poluição do ar, da água e da terra, impermeabilização dos solos, desordenamento do território, sobrecarga urbanística, abuso do automóvel e elevadas emissões de CO2 – levaram ao sobreaquecimento do planeta, às alterações climáticas e ao aumento das catástrofes naturais. Mesmo os mais céticos, exceto Trump, se rendem à evidência: o clima já não é o que era. Dantes, sabia-se que havia calor no verão e frio no inverno. Quando surgia um dia diferente, mais não era que a exceção a confirmar a regra. Agora, pode haver períodos de seca e incêndios, seguidos de outros de chuvas torrenciais.
Em 2005, no Parlamento Europeu, no “relatório sobre catástrofes naturais (incêndios, secas e inundações) – aspetos ambientais” de que fui autora, deixei alguns alertas, muitos deles recolhidos no périplo que fiz pelas zonas afetadas, que podem ajudar à reflexão. Mais de 90% da área ardida na Europa ocorre na Península Ibérica. Em 2004, só em Espanha arderam cerca 34 mil hectares. Também nesse já distante verão de 2005, as condições climáticas foram excecionais, devido a uma seca prolongada e a temperaturas muito elevadas, o que provocou uma propagação mais rápida dos fogos. Algumas das áreas florestais afetadas eram consideradas modelos de manutenção, na limpeza, na abertura de corta-fogos e no repovoamento com espécies apropriadas. Embora muitos dos incêndios sejam de origem criminosa, outros são consequência da falta de consciência de que a floresta é um bem precioso da comunidade e que a sua utilização obedece a regras e implica deveres.
A frequência de catástrofes tem vindo a aumentar mundialmente. Na Europa, o número anual de catástrofes quintuplicou. Calcula-se que, nas últimas décadas, tenham vitimado mais de 100 mil pessoas, afetado mais de 30 milhões e causado mais de 250 mil milhões de euros em perdas económicas. A maioria destas catástrofes teve origem em fenómenos hidrometeorológicos. Embora se tenha aumentado e melhorado a capacidade de prevenção e resposta, a gestão e a redução de riscos continuam a ser um desafio global.
Aproveite-se a comoção nacional e a atenção do momento para se fazer um debate sereno sobre o combate às alterações climáticas, a preservação da biodiversidade, o ordenamento e o planeamento da floresta e sobre o que cada um de nós pode e deve fazer para melhorar o statu quo. É mais fácil atirar culpas que meter a mão na consciência. E é tão português! Deveres para os outros, direitos para nós. Ora, se cada um der o seu contributo, o ambiente agradece. E a Terra será mais sustentável.