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Ufa!

Ufa!

Sim, ufa! Hoje é o último dia completo de Aníbal Cavaco Silva como Presidente da República. É, portanto, um momento adequado para nos despedirmos, com incontida satisfação, do pior (a longa distância) Presidente da República na história da Democracia portuguesa. Parte sem deixar um pingo de saudade, um caso acabado de parto sem dor. E parte, muito justificadamente, com o mais baixo nível de popularidade de um PR na nossa democracia.
Ufa!

É preciso perceber, em abono da verdade, que os portugueses estavam mal habituados. Desde a implantação da Democracia, em 25 de Abril de 1974, tinham elegido para o cargo António Ramalho Eanes, Mário Soares e Jorge Sampaio. Indiscutivelmente três grandes personalidades, muito diferentes entre si, três grandes Presidentes da República, que souberam sempre dignificar o cargo que exerceram, servir Portugal e os portugueses. Curiosamente, mas não por acaso, os três eleitos com o apoio do Partido Socialista. Todos eles souberam, cada um à sua maneira, ser presidentes de todos os portugueses, fazendo cessar a maioria que os elegeu no próprio dia da eleição.

Basta recordar o tristemente inesquecível discurso da noite em que Aníbal Cavaco Silva foi reeleito, no Centro Cultural de Belém, para ficar feito o retrato: um Presidente de fação, tacanho e medíocre. Há pessoas que quando são eleitas para um cargo relevante ganham dimensão e se superam a si próprias. A história está cheia desses casos. Mas Cavaco não. Manteve-se o mesmo até ao fim, provinciano e desprovido de todo o tipo de grandeza. Apoucou a função, pequenito até ao fim, como comprovou a muito recente condecoração de António Sousa Lara, um obscuro subsecretário de Estado da Cultura (imagine-se!!!) de um seu Governo, e alguém cuja única relevância na sociedade portuguesa foi ter vetado a indicação de um livro de José Saramago (O Evangelho segundo Jesus Cristo) para o Prémio Literário Europeu. Sousa Lara, o censor, explicou, na altura a sua atitude: “Um Governo tem uma conotação ideológica.(…) É um Governo da maioria contra a minoria, em última análise.” Estamos conversados sobre a natureza da personagem que Cavaco achou por bem condecorar, antes de deixar Belém.

Saramago serve, aliás, de teste do algodão para Cavaco Silva. A ausência do Presidente da República de qualquer das cerimónias fúnebres do nosso único Prémio Nobel da Literatura disse tudo sobre a sua incapacidade para o mais pequeno gesto de nobreza.

É esta criatura sem mundo e mesquinha que deixa amanhã de ser Presidente da República. Como escreveu Ricardo Araújo Pereira há alguns dias, isso é algo que garante desde já ao seu sucessor a qualidade de “melhor Presidente da República dos últimos dez anos”.

Cavaco parte amanhã. Só me ocorre uma manifestação, sentida e genuína, vinda lá bem do fundo: Ufa!

Duarte Moral