Testemunho de Mário Barroso
“Mário Soares, o “tio” da tia Jujinha”
Era dela que eu gostava. Por ser bonita, terna, sensível. Por ser irmã da minha mãe, filha da avó Maria. Porque eu lhe adorava a voz, a elegância, a coragem. Porque nos ensaiava para as festas do Colégio. E, sobretudo, porque era a Mãe da Isabel e do João com quem nós brincávamos e de quem gostava talvez ainda mais do que dela.
Do Pai deles nem sei se gostava.
E o avô? Um herói ou qualquer coisa parecida. Um velho magnífico, bonito, grande e aterrador, culto, imponente. E, se não era rico, parecia. Tinha carro, chauffeur e, quando calhava, levava-nos a passear com os netos.
O pai deles, nunca.
Esse, quando aparecia, não tinha pachorra para nos aturar. Era assim uma espécie de avô deles mas em menos tudo. Para a família mais velha, gente já perto dos trinta como os meus pais ou os outros tios, era evidente que o Mário já impunha respeito e admiração. A mim também, mas isso era irritante porque nos impedia de fazer o que queríamos.
Quando nasci, estava ele preso na PIDE, a minha madrinha e tia Maria de Jesus batizou-me com o seu nome, Mário Alberto, de que hoje muito me orgulho,
Já adolescente admirava-o, como à minha tia, pela elegância, a coragem, o humor. Mas não me identificava politicamente, o que aliás ele nunca me criticou nem o incomodou.
Mais tarde, durante o seu exílio em França, tinha eu um pouco mais de vinte anos, aprendi a conhecê-lo. E, pouco a pouco, o tio transformou-se em amigo.
Penso que ele acabou por gostar de mim. Eu sei que acabei por gostar dele. Muito. Quase tanto como da minha tia.
Mário Barroso