Pedro Delgado Alves, que intervinha durante o debate de urgência, requerido pelo Chega, sobre o acolhimento e integração dos refugiados ucranianos, sublinhou que quando se quer discutir o acolhimento de refugiados, seria de esperar que fosse apresentada “uma lista de problemas” sobre este tema. Ora, não foi isto que “ouvimos da parte do proponente deste debate”, lamentou.
De acordo com o socialista, “todos os outros partidos têm aproveitado o debate para colocar questões” à ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares e à secretária de Estado da Igualdade e Migrações, presentes no debate, “para que haja alguma utilidade”. “Não que a utilidade seja trazida pelo proponente do mesmo – isso é que é o estrondoso –, são os restantes partidos que estão a dar algum uso útil a este debate fazendo questões sobre aquilo que interessa”, vincou.
Pedro Delgado Alves defendeu que “podemos e devemos aprofundar a informação a que temos acesso”, mas salientou que, “graças às várias audições parlamentares, ordinárias e aquelas requeridas adicionalmente”, foi já possível apurar “o número de pessoas que foram beneficiárias de proteção temporária – mais de 40 mil –, o número de crianças”, cerca de 12 mil de acordo com dados divulgados há algumas semanas. Foi igualmente revelado que “temos sete vezes mais refugiados a ser acolhidos em 2022 que nos anos anteriores” e assim, neste contexto, é “insuperável a resposta que a República Portuguesa tem dado face à escala do desafio e face ao facto de sermos um país especialmente procurado pela comunidade migrante ucraniana, porque sabe que aqui tem raízes, porque sabe que aqui tem uma rede de associações, porque sabe que aqui estão muitos dos seus familiares”, referiu.
“A resposta de portugueses e de ucranianos neste país tem sido, a esse nível, exemplar”, congratulou-se o vice-presidente da bancada do PS, que acrescentou que “foram adaptadas e foram introduzidas várias medidas legislativas e de regulamentação que asseguram acesso à escola, acesso à proteção social, acesso ao emprego, acesso a números de identificação”. “Tudo isto sabemos porque, de facto, o Parlamento tem funcionado dentro da normalidade. E tem funcionado também escrutinando a atividade do Governo”, ressalvou.
Pedro Delgado Alves notou ainda, por parte do Chega, “uma clara intenção de confundir” dois temas de debates separados: o primeiro ponto do debate desta tarde, referente ao acolhimento de refugiados, e o segundo ponto, também proposto pelo Chega, de criação de uma comissão de inquérito parlamentar à atuação do Estado português no estabelecimento de parcerias com associações de cidadãos russos no acolhimento e integração dos cidadãos ucranianos em Portugal.
Há uma tentativa de “simplificar o que é especialmente complexo”, denunciou o socialista, que alertou que quando se fala no “apoio que certas associações de migrantes tiveram em Portugal nos últimos dez anos” não se pode esperar fazer um debate “sobre o que aconteceu há dez anos com factos a que temos acesso há dois ou três”. E questionou: “Espera-se julgar factos de há dez anos com base em comportamentos que ocorreram há três ou quatro meses?”.
“O que é facto é que houve transversalmente às várias forças políticas que desde 2011 asseguram a governação – quer quando foi a coligação do PSD com o CDS, quer quando foi o Partido Socialista a governar, e ainda governa – apoios a várias associações que preenchiam os requisitos constantes da lei”, explicou.
E acrescentou que “a composição do Conselho Consultivo do ACM [Alto Comissariado para as Migrações] também ela tem regras estipuladas e firmadas na lei em que há que respeitar aquilo que ainda somos, felizmente – um Estado de direito que não discrimina nem os cidadãos portugueses, nem os cidadãos ucranianos que entre nós residem. Por isso mesmo, nesses momentos foram beneficiários dos apoios desde que preenchessem os requisitos e desde que também, evidentemente, cumprissem e respeitassem a ordem jurídica portuguesa”.
Concretamente sobre o acolhimento de refugiados ucranianos no município de Setúbal, Pedro Delgado Alves indicou que “foi o único que, até ao momento, permitiu identificar dificuldades”. O parlamentar socialista esclareceu que a “administração central exerce as suas competências e quando os municípios querem estabelecer um protocolo com a administração central – que tem regras para ser feito e os municípios que o fizeram são monitorizados –, tem uma carta ética anexa ao protocolo que assinam com os municípios e com o ACM e, portanto, é perfeitamente possível fazer esse acompanhamento. Aquilo que infelizmente tivemos no caso de Setúbal foi a ausência de protocolo e a ausência desta possibilidade de ter apoio adicional e de ter regras que assegurariam e cumpririam este funcionamento”.
Num Estado de direito democrático o escrutínio tem regras
Já sobre a proposta de criação de uma comissão de inquérito, a deputada do PS Alexandra Leitão foi assertiva: “Aqui, esta casa, já escrutinou onde e como devia e não vamos dar azo a aproveitamentos políticos inqualificáveis de situações que merecem ser tratadas com seriedade”.
A socialista deixou claro que “num Estado de direito democrático existe escrutínio e, neste caso, houve e está a haver escrutínio. Só que num Estado de direito democrático o escrutínio tem regras, porque assim é que se evita que sob a capa do escrutínio se faça, na verdade, um aproveitamento político inqualificável de uma situação que não é para aproveitamento político”.
Neste ponto, Alexandra Leitão deu exemplos do escrutínio que tem sido feito: “Na comissão foram ouvidos os ministros, a presidente do ACIM, o secretário-geral do Sistema de Segurança Interna, a Comissão de Fiscalização do SIRP [Sistema de Informações da República Portuguesa], associações de ucranianos”, tendo todos eles concluído que “não havia um problema sistémico no acolhimento de refugiados ucranianos em Portugal”, sendo o caso de Setúbal “uma questão localizada”.
Dirigindo-se à bancada do Chega, a socialista lamentou que pareça que querem “discutir política de Setúbal na Assembleia da República”. E recordou que “já está a ocorrer, tanto quanto sabemos, uma fiscalização em sede própria cumprindo e respeitando o princípio da autonomia local”.
Alexandra Leitão comentou que “os serviços e entidades competentes do tal Estado de direito democrático que todos nós prezamos – uns mais do que outros – já estão a atuar. Está a atuar a Inspeção-Geral de Finanças, a Comissão Nacional da Proteção de Dados e o próprio Ministério Público”.