Ainda que os dois países ibéricos estejam “firmemente ancorados” na Europa e ambos serem acérrimos defensores da criação de uma união “cada vez mais estreita entre os povos europeus”, tal não impede, defendeu António Costa, que não devam desempenhar em simultâneo “um papel único” no relacionamento da Europa com o vasto espaço atlântico, quer com “os aliados na América do Norte, ou com os vizinhos africanos”, sem esquecer os povos de “língua portuguesa e espanhola na América Central e do Sul”.
De acordo com o primeiro-ministro, hoje já são poucos os europeus que têm dúvidas sobre o enfraquecimento que o Brexit e os sucessivos alargamentos “trouxeram à vertente atlântica da União Europeia”, fenómenos que vieram acentuar, ainda segundo António Costa, uma dimensão continental, numa altura em que se verifica a “ascensão da China” e o “desviar do olhar” dos Estados Unidos da América para o Pacífico e para a Ásia.
Estes novos alinhamentos na geoestratégia mundial, em caso algum, na ótica do líder do Governo português, devem fazer com que os 27 Estados-membros da União Europeia reajam com a “sua própria retração”, optando aos poucos por se tornarem “prescindíveis enquanto parceiros e aliados”. Para António Costa, pelo contrário, o caminho passa por uma Europa sempre mais forte e mais coesa, afirmando-se como um “ator global no mundo multipolar”.
A tão reivindicada autonomia estratégica da União Europeia é, para António Costa, algo que deve assentar, antes de mais, numa voz comum que seja não só ativa, mas sobretudo credível no mundo, não tanto para que a UE “atue sozinha ou ao serviço das prioridades de alguns dos seus membros”, mas antes para que melhore “as suas capacidades de defesa”, garantindo assim a “complementaridade e a coerência com a Aliança Atlântica”.
Desprezar ou minimizar a importância estratégica e a capacidade da Europa de produzir mais e sempre mais riqueza é, para o primeiro-ministro, um contrassenso, lembrando que os 27 têm o potencial instalado necessário para “manter e aumentar a sua relevância”, lembrando a este propósito que, com apenas 7% da população mundial, a União Europeia é a responsável por cerca de “1/6 do PIB global”, sendo o continente “mais bem preparado para a dupla transição climática e digital”, duas das matérias que o líder socialista considera serem as que mais vão “marcar as sociedades do futuro”, a par da “exploração e da proteção dos oceanos”.
Pilar da democracia e da segurança
Para António Costa, o vínculo euro-atlântico é também “um pilar insubstituível”, não só na defesa da democracia e da segurança, mas também na “estabilidade e na prosperidade global”, garantindo não existir “alternativa duradoura a este bloco”, pelo que Portugal e Espanha devem avançar o quanto antes com a missão histórica de ajudar a consolidar e a reforçar a vertente atlântica da União Europeia, evitando a sua “excessiva continentalização”.
Ainda sobre os dois países ibéricos, o primeiro-ministro defendeu que ambos dispõem do “necessário potencial” para se tornarem numa importante “porta de entrada” no continente europeu, quer das “rotas de abastecimento energético, quer do comércio internacional marítimo e da conectividade digital”, sendo para isto necessário que, antes de mais, Portugal e Espanha reforcem “os seus próprios laços”, fortalecendo “as suas regiões de fronteira e desenvolvendo a sua própria conectividade”.
Iniciativas para as quais António Costa lembrou que foram já dados importantes passos nas três últimas cimeiras luso-espanholas, designadamente em relação à construção de uma estratégia comum de desenvolvimento transfronteiriço, reafirmando o primeiro-ministro ser este um dos aspetos mais determinantes para que ambos os países consigam, num tempo relativamente rápido, “vencer o desafio demográfico” e progredir “na valorização do interior”.