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Partido Socialista: Na luta contra a Ditadura, pela Democracia e pela Liberdade

Partido Socialista: Na luta contra a Ditadura, pela Democracia e pela Liberdade

Em março de 1972, há precisamente 50 anos, o Portugal Socialista, instrumento de luta política fundamental para os socialistas nos anos de chumbo da ditadura portuguesa, publicava um artigo em que deixava bem patente o campo ideológico em que estes se situavam: “Nós somos, portanto, a corrente portuguesa do socialismo democrático que não abdicou da construção de um projeto socialista original para Portugal”.

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O «Ação Socialista» é o jornal oficial do Partido Socialista, cuja direção responde perante a Comissão Nacional. Criado em 30 de novembro de 1978, ...

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Os socialistas estavam, então, reunidos em torno da Acção Socialista Portuguesa (ASP), um movimento político que havia sido constituído em 1964, quando Mário Soares, Francisco Ramos da Costa e Manuel Tito de Morais se encontraram em Genebra. A ASP seria o embrião do Partido Socialista e, nesse mês de março de 1972, tinha ainda apenas o estatuto de Observador da Internacional Socialista, vindo a integrá-la como membro, meses depois. Um passo, sem dúvida, de grande relevância na afirmação internacional do socialismo democrático português.

Agindo na clandestinidade, o combate dos socialistas contra a ditadura portuguesa, quer no interior de Portugal, ou a partir do exterior, denunciando o Regime internacionalmente, foi intenso, levando à repressão, prisão e exílio político de várias das suas principais figuras. Mas estes foram também anos de reflexão e de construção de um projeto político para o futuro do país.

Em 19 de abril de 1973, num Congresso que decorreu em Bad Münstereifel, na Alemanha, foi fundado o Partido Socialista (PS), estando presentes figuras como Tito de Morais, Ramos da Costa, Catanho de Menezes, Maria Barroso, António Arnaut, José Neves, Arons de Carvalho, Jorge Campinos, Liberto Cruz, Mário Mesquita, entre outros. Para Mário Soares, fundador e logo nesse dia eleito secretário-geral do partido, pretendia-se que o partido viesse a ser um “um instrumento para transformar o país”.

A ambição era clara e foi sucessivamente invocada durante o célebre Congresso de fundação do PS: derrubar o Regime, a mais longa ditadura da Europa.

Fundado o partido, Mário Soares desenvolveu, de imediato, contactos com os principais líderes políticos europeus, procurando apoios para concretizar ações que planeara contra o Regime. Em paralelo, iniciaram-se os trabalhos de redação do primeiro Programa e da Declaração de Princípios do PS, essencialmente por um “núcleo duro” composto por Mário Sottomayor Cardia, António Reis e Marcelo Curto.

Tanto o Programa como a Declaração de Princípios ficaram prontos em setembro desse ano de 1973, naturalmente marcados pelo contexto da época e pela tentativa de conciliação de posições diversas que existiam no seio do partido. O PS “propõe um socialismo que acolha e desenvolva o pluralismo, no respeito da dignidade do homem, na prática da livre crítica, no exercício da cidadania e na organização de um Estado de Direito”. Ficaram claros muitos outros posicionamentos socialistas perante questões políticas relevantes. No entanto, o desígnio essencial era o “o combate anti-fascista e anti-colonialista”.

Quanto ao Programa do PS, produzido em ditadura, mostra-nos um projeto para um futuro do país em democracia e em liberdade. Estão presentes a garantia do direito à greve, da liberdade sindical, a abolição do corporativismo e da repressão patronal, a aplicação do princípio “a trabalho igual salário igual” (dirigindo-se, em particular, aos jovens e às mulheres), a redução do tempo de trabalho, o fim da censura, o combate ao analfabetismo, o acesso de todos ao ensino e à cultura, a aposta na investigação científica, a defesa de um sistema de segurança social generalizado à população e o direito à saúde, entre muitos outros objetivos. A nível institucional, a defesa da eleição, por sufrágio universal, direto e secreto, de uma Assembleia de Representantes do Povo, mas também do Presidente da República e de Autarquias Locais, bem como uma reestruturação das Forças Armadas. Era ainda defendido o fim da guerra colonial, a aplicação do princípio da autodeterminação dos povos e que “a ideia europeia supranacional deve ser consolidada”.

Estando também presentes no documento medidas mais polémicas, designadamente em termos económicos, que não reuniam consenso no partido, Mário Soares, que discordava de muitas delas, na introdução que redige ao Programa, deixa patentes as divisões que o documento acabaria por refletir e, em aberto, a possibilidade de alterar algumas das medidas nele defendidas. Escreveu então Soares: “Não se trata pois de uma obra acabada, nem muito menos ainda tecnicamente perfeita”, mas, sim, “de um trabalho sério que foi tão longe quanto se podia ir”. Mas estava, efetivamente, concluída a etapa fundamental que era a elaboração dos documentos doutrinários do recém-criado Partido Socialista.

Cerca de um ano depois, a 25 de Abril de 1974, o Regime foi derrubado pelo Movimento das Forças Armadas. O Partido Socialista viveu intensamente os meses agitados e de duras lutas políticas que marcaram a Revolução. Rapidamente se instituiu, por via das primeiras eleições democráticas, para a Assembleia Constituinte (1975), como o principal partido português e defensor de um regime político pluripartidário, de tipo ocidental.

Mário Soares foi a figura que preconizou essa via política para o futuro do país, conquistando uma visibilidade e reconhecimento internacionais que mais nenhum político português então atingiu. Isso foi fundamental não só no período de transição, como também na consolidação da democracia portuguesa, para a qual contribuiu decisivamente.

Desde logo, porque foi nos primeiros governos constitucionais do Partido Socialista, liderados por Mário Soares, que vimos concretizar os princípios basilares do Regime Constitucional e do Estado Social: a criação do Serviço Nacional de Saúde e as amplas mudanças nos domínios da educação, da justiça e nos direitos sociais. A legislação então produzida é vasta e compreende, por exemplo, a lei da reforma agrária e do arrendamento rural, a integração dos chamados retornados, a liberdade sindical e a proteção do direito sindical; a criação de um sistema público de educação pré-escolar, escolas normais e de educadores de infância; o direito à greve; a regulamentação da pensão social e do abono de família; os princípios para atribuição do subsídio de desemprego; o passe social; a proibição de despedimentos sem justa causa e a permissão para o governo legislar sobre a revisão do Código Penal, do Código Civil, do Código de Processo Civil e do Código Comercial, entre muitas outras.

Assistimos também a uma alteração radical no paradigma da política externa, com o pedido de adesão de Portugal à Comunidade Europeia, cujo tratado seria assinado em 1985, processo para o qual a ação de Mário Soares e do PS foram determinantes.

Fundamental foi também o contributo do PS na elaboração da Constituição democrática de 1976 e, depois, nas suas várias revisões.

Hoje, quando Portugal atinge mais um dia de democracia do que aqueles que viveu em ditadura, importa olhar para esse passado de lutas e de conquistas fundamentais. E, olhando para esse percurso, compreende-se que o Partido Socialista teve, indiscutivelmente, o papel mais determinante na construção da democracia portuguesa. Nada do que nela é fundamental foi feito sem o PS.

Maria Fernanda Rollo

Pedro Marques Gomes

Filipe Guimarães Silva

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