Opinião: Trump – uma primeira reflexão
O fenómeno de Trump não é um fenómeno isolado. É gigante, porque está em causa a eleição do presidente dos EUA. A vitória a que assistimos de boca aberta foi, em primeiro lugar, uma tragédia. Foi uma tragédia para os valores constitucionais, foi a vitória do populismo, foi a vitória do racismo e foi a vitória do autoritarismo, alegadamente escondido no facto de Trump não pertencer a “essa coisa horrível” – o sistema.
Temos de nos perguntar como foi possível a vitória esmagadora de um homem que mostrou desprezar liberdades fundamentais, imigrantes, mulheres, hispânicos, muçulmanos, instituições, a ordem mundial tal como a entendemos, ignorante e sem qualquer experiência.
Temos de nos perguntar como foi possível um cínico perigoso, com um historial miserável, apregoando promessas explosivas vencer as eleições à mulher mais bem preparada de sempre para ser presidente dos EUA.
Começo a ficar exausta de ouvir que, basicamente, os americanos “não aderiram” a Hillary Clinton sem que depois se explique o que está verdadeiramente em causa.
Ora, há dois pontos que quero salientar.
Esta eleição grita sexismo.
Hillary Clinton foi a nomeada democrata por ser muito melhor que o seu opositor Sanders. Não lhe bastaria ser melhor. Porque é mulher. E toda a sua vida demonstra como a questão de género esteve sempre lá, como uma pedra no sapato.
As infinitas vezes que se ouviu falar em “falta de empatia do povo americano relativamente a Clinton” nunca teve a ver com o seu percurso (inigualável). Teve sempre, mas sempre a ver com estar em causa eleger-se uma mulher. E não uma qualquer mulher.
Não estamos a falar de uma mulher que cede aos estereótipos “comportando-se como deve ser”, como Sarah Palin. Não perceber isto é criminoso.
A esse propósito, vale muito a pena ler o artigo “The Hillary Hatters”:
Questão diversa é a que nos deve levar a pensar no futuro. A níveis diferentes, o que se passou no Brasil, na campanha do Brexit e agora na campanha de Trump têm em comum a exploração deplorável das pessoas mais afetadas pelos efeitos de uma má distribuição de rendimentos, pela pobreza, pela exclusão. Estamos a falar de milhões de pessoas sem credo em sistema algum, vivenciando interiormente um “não-sistema”, um mar cheio para a pesca extremista e altamente eficaz que se verificou nos EUA.
Os homens brancos e com baixas qualificações foram muito importantes na vitória de Trump e estamos todas e todos recordados das diferenças de perfil dos votantes aquando do referendo no Reino-Unido.
Tendo em conta o que foi dito por Trump, desde as nomeações para o Supremo Tribunal, à política internacional e a tudo o resto, a única certeza de que dispomos é a incerteza.
Temos, porém, de tirar lições, quando vemos, aqui na Europa, o mesmo método que referi a crescer em resultados. É tempo de apostar em políticas socais que se vejam, políticas de integração e de igualdade, que não cedam espaço ao “tiro ao sistema” em prol da vitória do fascismo.