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Obrigado, Mário Soares

Obrigado, Mário Soares

Na cerimónia de homenagem a Mário Soares, que hoje teve lugar nos claustros dos Jerónimos, em Lisboa, João e Isabel Soares evocaram a coragem política do seu pai, descrevendo-o como um “homem livre” e como uma das “grandes figuras do Portugal democrático”, que sempre soube enfrentar os momentos difíceis antes do 25 de abril de 1974, sem se lhe ouvir um “queixume, uma palavra de desalento ou de desânimo”.

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Obrigado, Mário Soares

João Soares lembrou que o pai “viveu mais tempo em ditadura do que em liberdade”, preso pela Pide 13 vezes, “contando com a deportação para São Tomé e Príncipe” e forçado ao exílio em Paris, durante quatro anos, onde “fez uma vida simples, como podemos testemunhar”, soube enfrentar todas as privações à sua liberdade, impostas pelo ditadura, com “grande dignidade e mostrando sempre uma enorme coragem”.

De cravo vermelho ao peito, João Soares contou algumas estórias da passagem do pai pelas prisões do Estado Novo, garantindo que, quando o iam visitar ao parlatório do Aljube ou a Caxias, tanto ele como a irmã Isabel cumpriam, à risca, a recomendação da mãe e do avô, de que “à frente dos pides não se chorava”.

O filho do fundador do PS quis ainda lembrar a mãe, Maria de Jesus Barroso e o avô, João Soares, que, como enfatizou, também “não podiam deixar de ser lembrados neste momento”.

João Soares terminou a sua intervenção de forma emotiva, despedindo-se com um “adeus querido pai”.

Exemplo de ânimo e coragem

Com a voz embargada, a filha Isabel Soares lembrou os “tempos difíceis” que Mário Soares passou nas prisões da Pide, pela deportação para São Tomé ou pelo exílio em Paris, sem todavia se ter ouvido, da sua parte, como lembrou, “um único queixume ou uma palavra de desalento ou de desânimo”.

A filha de Mário Soares recordou ainda “os dias de chumbo” da ditadura, lembrando que, quando visitavam o pai na prisão, “cheios de raiva e de lágrimas” contidas, era o “pai que nos dava alento, nos consolava e nos dava ânimo”.

Foi ele, acrescentou ainda Isabel Soares, que “nos ensinou desde muito pequeninos a não ter medo do escuro nem das ondas do mar da Foz do Arelho”, mas também a “nunca desistir e de lutar sempre por aquilo em que acreditávamos”.

Antes, Isabel Soares tinha invocado a memória da mãe, referindo-se ao poema que se ouviu nesta homenagem, lido por Maria de Jesus Barroso, mencionando que “foi nossa vontade que a voz da nossa mãe estivesse aqui, neste momento de despedida”, sublinhando que Mário Soares e Maria de Jesus Barroso “tinham a mesma dimensão”, o que “era o nosso maior orgulho”.

Mário Soares partiu como sempre viveu, disse Isabel Soares, a “lutar até ao fim e ladeado pelos seus dois filhos”, despedindo-se emocionada com um “até sempre pai”.

A emoção, as palmas, a música e a poesia marcaram a sessão solene evocativa, que juntou mais de 500 convidados nacionais e estrangeiros nos claustros do Mosteiro dos Jerónimos, no mesmo local onde Mário Soares, então primeiro-ministro, assinou a 12 de junho de 1985 o tratado de adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia (CEE).

Depois de se ouvir o hino nacional e a voz de Mário Soares proferindo o início do discurso da cerimónia de assinatura do tratado de adesão à CEE, intervieram João e Isabel Soares, ouvindo-se também a voz de Maria de Jesus Barroso declamando “Os dois poemas de amor da hora triste”, de Álvaro Feijó.

Intercaladas por intervenções musicais do coro do Teatro Nacional de São Carlos e da Orquestra Sinfónica Portuguesa, foi depois a vez das intervenções do presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, do primeiro-ministro, António Costa, através de uma mensagem gravada na Índia, e do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

A cerimónia terminou com o hino nacional e palmas dos convidados, antes de a urna sair dos claustros para o cemitério dos Prazeres, num percurso acompanhado por muitos populares, efetuando paragens em frente da Assembleia da República e da sede nacional do Partido Socialista, no Largo do Rato.

Aguardado por muitas centenas de pessoas, entre fundadores do Partido Socialista, dirigentes, militantes e cidadãos, o cortejo foi recebido com emoção, afeto e muitas flores lançadas para cima da urna.

A voz de Mário Soares ouviu-se ainda nos altifalantes, numa evocação intemporal: “Viva o socialismo! Viva a liberdade!”.