Na conclusão do debate, requerido pelo CDS-PP, sobre a reestruturação do SEF, o deputado socialista referiu que ficou claro que “há muitos partidos a ver com bons olhos a separação entre o vetor policial e o vetor administrativo do sistema europeu e nacional de controlo de fronteiras e de gestão de questões relacionadas com estrangeiros”, apesar de a discussão desta tarde não ter sido clara nesse aspeto. “Quem olhar este debate de muito longe, não percebe isso”, ironizou.
José Magalhães, que frisou que este ponto da separação “é adquirido” e pode ter progressos, disse que “o debate também serviu para tornar muito claro que as ideias que há e que estão enunciadas na resolução do Conselho de Ministros não são de uma migração de um serviço público para uma espécie de inferno, mas para outras estruturas públicas onde, nesse ambiente, o ‘know how’ não será perdido”.
Admitindo que “há uma longa discussão a fazer” nesta matéria, o socialista mostrou-se disponível para a fazer e, perante críticas da bancada do PSD, chegou mesmo a sugerir aos deputados que apresentem “amanhã um projeto de lei sobre a separação e sobre um controlo de fronteiras”.
José Magalhães deixou depois um aviso a todas as bancadas: “Não estamos aqui para retrocessos em matéria de proteção de imigrantes”.
“Isto não é um salto no escuro, isto é um salto com rede em que há todos os meios de controlo parlamentar e nós queremos esses meios de controlo parlamentar e queremos conhecer o decreto-lei em causa [sobre a reforma do SEF], coisa que ainda nenhum de nós conhece”, afirmou o deputado socialista.
“Façamos o debate com toda a honestidade e o PS está a favor desse debate alargado”, concluiu.
Sobreposição de competências da PJ e do SEF prejudica a investigação de tráfico de pessoas
A deputada Cláudia Santos, por seu lado, frisou que só se conseguirá combater o tráfico de seres humanos se as vítimas compreenderem “que são vítimas de crimes graves e não apenas vítimas do infortúnio” e também quando perceberem que “não serão elas próprias castigadas e que não precisam de ter medo da polícia, porque há uma estrutura para as acolher ou proteger que é diferente daquela estrutura policial que investigará os criminosos”.
A socialista começou a sua intervenção a recordar que “a reestruturação do SEF consta do programa do Governo e antes dele já estava no programa eleitoral do Partido Socialista”.
“A ideia de que o conceito de segurança interna precisa de ser revisitado não é de hoje”, até porque “no mundo de hoje nenhuma segurança pode ser só interna”, defendeu Cláudia Santos, que disse que “hoje talvez se deva falar sobretudo em segurança humana”.
E explicou que “o conceito de segurança humana está centrado na pessoa e no bem-estar dos povos. Com este conceito de segurança, as questões propostas pelos migrantes são encaradas sob um novo prisma: cada país faz escolhas sobre os migrantes que pode acolher”.
“E o acolhimento de migrantes não deve ser enquadrado num contexto policial. Uma coisa é o acolhimento de migrantes, outra coisa é a criminalidade parasitária das migrações e dos limites que cada Estado lhes define. Essa criminalidade é assunto de polícia e deve ser tratada como criminalidade muito grave. Os migrantes merecem uma resposta. Os criminosos que se aproveitam das fragilidades dos migrantes merecem outra resposta”, asseverou.
Migrantes não sabem se serão tratados como vítimas ou criminosos
Cláudia Santos esclareceu que estas mudanças têm de ser feitas principalmente por causa do “medo que os migrantes têm da polícia e o receio de serem tratados como criminosos”. Isto “torna-os mais vulneráveis à exploração e dificulta a descoberta dos crimes de que são vítimas. Por isso, a estrutura que os tenha como interlocutores não deve ser também uma estrutura policial”, vincou.
A deputada assegurou que “as vítimas só denunciarão o crime de tráfico de pessoas se conseguirmos combater as armas utilizadas contra elas pelos seus agressores. E uma dessas armas é precisamente o medo da polícia”. “Só conseguiremos ajudar estas pessoas e combater o tráfico de seres humanos se elas compreenderem, primeiro, que são vítimas de crimes graves e não apenas vítimas do infortúnio”, acrescentou.
“Depois estas vítimas precisam de saber que não serão elas próprias castigadas e que não precisam de ter medo da polícia, porque há uma estrutura para as acolher ou proteger que é diferente daquela estrutura policial que investigará os criminosos permitindo a sua punição”, salientou.
Cláudia Santos deixou depois uma garantia: “A sobreposição de competências da PJ [Polícia Judiciária] e do SEF prejudica a investigação”. E adiantou que “a dispersão de competências na investigação foi identificada por magistrados e elementos das próprias polícias num estudo essencial publicado em Portugal sobre o tráfico de seres humanos. Nesse estudo afirma-se, de modo inequívoco, que a atribuição de competências à PJ e ao SEF determina a ‘confusão que ocorre no terreno com a sobreposição de investigações’”.
Assim, pode-se concluir que “são necessárias alterações a este modelo de investigação”, afiançou.
Dirigindo-se a todas as bancadas, Cláudia Santos reiterou que “as vítimas ‘coisificadas’ do crime de tráfico de seres humanos estão entre nós e, por isso, dependerá sobretudo de nós que passem a ser tratadas como aquilo que são: não como coisas, não como criminosos, apenas como pessoas”.