Maria Manuel Leitão Marques
Uma enorme alegria de viver
Mário Soares era um homem de causas. A sua grande causa de vida foi a política no que ela tem de melhor, com convicções mas sem dogmas. “Sabemos hoje quão fácil é cometermos erros em política e nos enganarmos; em que medida precisamos sempre do concurso dos que de nós divergem para corrigirmos erros e naturais insuficiências. (…) Acreditamos que, em política, não há soluções definitivas nem verdades absolutas” (in Conferências sobre Balanço do Século). Antes e depois do 25 de abril, cuidou da nossa liberdade, cuidou da igualdade e dos direitos sociais, cuidou a cultura como parte da identidade de um país que amava e conhecia profundamente.
Quando deixou de ser Presidente da República, em 1996, foi professor de Relações Internacionais na minha Faculdade, em Coimbra. É frequente isso acontecer com antigos presidentes ou políticos experientes em grandes universidades por esse mundo fora, mais do que em Portugal, infelizmente. Eu era então presidente do Conselho Científico, a sua “diretora” como carinhosamente me chamava. Durante esse tempo, partilhou com os alunos a sua rica experiência internacional, as histórias que os livros não contam mas que fazem a História muito mais rica e interessante, e partilhou connosco, nos intervalos, algumas das suas memórias pessoais. Mesmo as do tempo da sua deportação em S. Tomé tinham sempre um cunho divertido – como o “jogo do gato e do rato” com o PIDE que o vigiava nessa ilha –, momentos de quem da vida procura sempre aproveitar a melhor parte.
É assim que me recordo de Mário Soares, como alguém que passou por vitórias e derrotas sempre com determinação, espírito de risco, coragem e uma enorme alegria de viver. Pessoas grandes como ele não morrem. Viverão para sempre na nossa memória.