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João Torres ao podcast ‘Política com Palavra’: “Nenhuma empresa ou pessoa deve ficar para trás”

João Torres ao podcast ‘Política com Palavra’: “Nenhuma empresa ou pessoa deve ficar para trás”

João Torres, secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor, falou ao ‘Política com Palavra’ de vários temas que têm feito a atualidade nos últimos quase dois anos.

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João Torres, podcast Política com Palavra

Dos apoios do governo às empresas durante a pandemia, ao receio de muitos empresários com o fim das moratórias de crédito. Da necessidade do governo de preservar o maior número possível de micro e pequenas empresas, à necessidade de existirem grandes empresas. Da importância do setor da restauração, à qualidade dos produtos portugueses. Dos empregos que deixarão de existir, aos que nem sequer imaginamos que poderão surgir. Falámos também do dia em que procurou o número do Partido Socialista nas Páginas Amarelas com o objetivo de ter informações sobre a Juventude Socialista. Uma entrevista importante com um dos valores mais seguros do PS na geração que ainda não completou 40 anos.

Luís Osório – É verdade ou um mito urbano que se filiou no PS depois de consultar as páginas amarelas?

João Torres – Estávamos em 2001, foi há muito tempo. É verdade. Fui às páginas amarelas para encontrar o número de telefone do Partido Socialista, tinha 15 anos. É uma história verdadeira e como tal tem uma certa beleza. Desse tempo procuro preservar muitos sonhos e a vontade de contribuir para o meu país. É uma história que me orgulha porque não tinha ninguém no meu círculo familiar que militasse politicamente, mas ainda assim isso não me demoveu de enfrentar o desconhecido.

LO – Foi um percurso impressionante, das páginas amarelas à presidência da Juventude Socialista. Na sua opinião as juventudes partidárias continuam a fazer sentido?

JT – As juventudes partidárias fazem todo o sentido, são mesmo fundamentais. Para refrescar e renovar o discurso político, para preparar a maturação do pensamento e a ação dos partidos políticos, neste caso do PS. Não tenho em relação a isso a mais pequena dúvida. No meu caso compatibilizei esse percurso político com o meu percurso académico, licenciei-me e completei o mestrado em engenharia civil, trabalhei no setor privado e costumo apresentar-me assim, sou um engenheiro civil.

LO – Antes de irmos aos temas de atualidade, uma última questão inicial. Como tem sido trabalhar com o ministro Pedro Siza Vieira?

JT – Tenho reservas à lisonja, mas claro que tenho uma estima e admiração pelo ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, é uma personalidade superior. É um privilégio o país poder contar com o ministro Pedro Siza Vieira numa pasta tão importante para o futuro do país.

LO – O que teria acontecido se o governo português não tivesse apoiado as empresas? Existe algum estudo sobre o impacto dos apoios.

JT – Em relação aos setores que acompanho mais diretamente diria que os apoios às empresas tiveram três vetores fundamentais: liquidez, manutenção do emprego e arrendamento. Reconhecemos desde o primeiro momento que uma crise desta natureza acarretaria sempre impactos muito profundos, mas também que à medida que restringíamos iríamos desenvolver novas formas de apoio. É uma mensagem coerente desde o primeiro dia até ao dia de hoje. Ainda na quarta-feira, o senhor ministro da Economia anunciou na Assembleia da República novos apoios para os estabelecimentos de animação noturna parado desde o início da pandemia. Desde o primeiro dia que criámos, no conjunto, um escudo económico e social muito importante que nos ajuda a preservar a nossa capacidade produtiva, o nosso tecido económico e a defesa do emprego.

LO – Os números de desemprego ficaram aquém das piores previsões do próprio governo.

JT – Quer no que diz respeito ao desempenho da economia, quer à taxa de desemprego, ficámos muito longe em relação às previsões mais pessimistas que se fizeram durante o primeiro confinamento e em 2020.

LO – O que poderá acontecer quando os apoios deixarem de existir? Receia pela falência de muitas empresas em Portugal?

JT – Os dados de 2020 em matéria de insolvências não foram tão negativos como alguns esperavam. Falo muitas vezes com empresários e adoto sempre um comportamento que tenta aliar a humildade e a assertividade. Reconheço que numa crise como esta algumas empresas encerram a sua atividade, enquanto outras vão surgindo. No ano que passou nasceram mais empresas do que aquelas que morreram, é um indicador.

LO – Mas há inúmeros desafios por resolver.

JT – Evidentemente. Um deles diz respeito justamente ao fim das moratórias de crédito. Esta semana anunciámos mecanismos que procuram suavizar esta transição e focar as prioridades políticas e económicas do país na recuperação do nosso tecido produtivo e na sua capitalização. Será uma solução que permitirá uma transição mais suave. Empresas que irão, no fim das moratórias, enfrentar problemas de tesouraria poderão renegociar com os bancos as suas condições de crédito e o Estado garantirá uma parte desses montantes em dívida.

LO – A direita mais liberal acredita que seria preferível para a economia do país a falência das empresas que não têm condições para ser minimamente competitivas.

JT – Discordo dessa visão. Numa crise desta natureza não podemos ser conformistas em relação às empresas que morrem. Precisamos de todos, precisamos das microempresas e das grandes empresas; discordo profundamente dos que acham que a economia melhoraria se algumas empresas menos capazes morressem. Quando retirarmos a pressão nessa mola – falo figurativamente das restrições ao normal funcionamento dos estabelecimentos – queremos que esse dispositivo recupere a sua posição inicial de repouso, o seu estado tal como o conhecíamos antes dessa crise pandémica.

LO – E no seu setor essa imagem/objetivo é particularmente importante.

JT – Por todos os motivos. O comércio e os serviços, com particular enfoque na restauração, são setores decisivos para a economia portuguesa. Na criação de emprego, no contributo líquido para o valor acrescentado bruto para o país, na coesão territorial. Muitas vezes, nos territórios de baixa densidade, esses setores são os mais representativos de muitas cidades, vilas e aldeias do nosso país.

LO – Falamos da preservação das empresas, mas a mesma preocupação deve existir em relação às pessoas. Com a inevitabilidade das várias transições será muito importante investir na requalificação das pessoas.

JT – E aí o PRR consagra uma visão para o país – quer do ponto de vista da capitalização das empresas, quer no apoio à requalificação e formação das pessoas. Temos três objetivos essenciais, que aliás nos ligam à Europa, a transição verde e digital e a resiliência. Mas o nosso governo já estava a trabalhar nessas áreas, aliás eram temas que representavam o coração do programa do governo, a opção intensificou-se com a pandemia.

LO – Mas muitos empregos deixarão de existir.

JT – Sim, mas esta transição tem de ser justa, temos de procurar que ninguém fique para trás. Defendo uma economia social de mercado que não tenha complexos em relação à iniciativa privada e o papel do Estado é o de proporcionar que as empresas aproveitem estas oportunidades. As transições provocarão alguns problemas, mas estou convencido de que surgirão outras atividades que darão origem a empregos que nem sequer conseguimos hoje imaginar.

LO – O número das grandes empresas portuguesas é quase inexpressivo. Existe a odeia de que para a economia crescer precisamos de ter mais empresas grandes?

JT – O setor do comércio é muito emblemático em relação à heterogeneidade da nossa economia. Antes da pandemia tínhamos só no comércio, não estou a contar com a restauração, 200 mil empresas que dão trabalho a mais de 700 mil pessoas. De todas essas empresas apenas pouco mais de uma centena são grandes. Basta olhar para os números para concluirmos que precisamos de todos. As nossas grandes empresas do comércio, nomeadamente a distribuição moderna, que está a par do melhor que se faz no mundo, tanto ao nível no investimento em inovação como na sofisticação, devemos ter orgulho nisso. Mas não podemos esquecer a realidade das feiras e dos mercados, do comércio local e de proximidade e até na indústria dos centros comerciais.

LO – Não existe então nenhum preconceito ideológico em relação às grandes empresas.

JT – Nenhum preconceito ideológico. As grandes empresas são também importantes, mas temos de olhar para o tecido económico tal como ele é. Não podemos desvalorizar ninguém.

LO – Os profissionais da restauração têm sofrido muito. Nestas últimas semanas os fantasmas voltaram ao setor.

JT – O setor da restauração é muito importante, estamos a falar de 75 mil empresas antes da Covid-19. O que corresponde a cerca de 240 mil postos de trabalho, só na restauração. É um setor que tem sido dos primeiros beneficiários líquidos, já transferimos cerca de 1.100 milhões de euros no âmbito do programa Apoiar. Estamos em condições para ter mais confiança hoje do que tínhamos no último ano e meio. Há medidas no apoio ao emprego que foram prolongadas, como o apoio à retoma progressiva. Há muitos apoios que estão a ser dinamizados, por exemplo o incentivo extraordinário à normalização da atividade económica. O país no seu conjunto tem dado excelentes sinais, o apoio dos empresários tem resultado na preservação de emprego e do nosso tecido produtivo. É uma conquista coletiva por parte da sociedade, não apenas do governo.

LO – Há umas semanas perguntei à secretária de Estado do Turismo se aconselhava os portugueses a fazer as férias em Portugal. Pergunto-lhe o mesmo em relação ao consumo de produtos portugueses.

JT – Isso já está a acontecer. Há três evoluções nos padrões de consumo que se intensificaram muito com a pandemia. O recurso ao comércio eletrónico, as escolhas mais conscientes do ponto de vista do impacto ambiental e a valorização do produto português. Temos valorizado isso apesar de respeitarmos o mercado único, somos parte desse mercado com mais de 400 milhões de pessoas. Mas acreditamos bastante no valor acrescentado dos nossos produtos, por isso apostamos e valorizamos o programa Portugal Sou Eu. Vamos continuar a investir neste programa e reconhecemos que o recurso à compra de produtos portugueses ajudará certamente a nossa economia a prosperar.

LO – Que comentário faz ao nascimento de uma nova associação que junta as maiores empresas do país? Uma associação de peso que juntou na sua apresentação Vasco de Mello, Cláudia Azevedo e Paula Amorim.

JT – A liberdade associativa está prevista na Constituição. Da minha parte o que posso dizer é que estou sempre disponível para ajudar a construir. A existência de uma nova associação pode contribuir para que o país tome decisões e faça escolhas podendo atender ao contributo dessa nova organização. Pela minha parte acredito profundamente no valor do diálogo. E isso não pressupõe a anulação de opiniões diversas das minhas. Procuro sempre que possível ser um construtor de pontes, como bom engenheiro civil é isso que procuro fazer.

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