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Eutanásia: Projeto do PS foi gerado com “humanidade e cuidado”, não condenando ninguém a uma pena de sofrimento extremo

Eutanásia: Projeto do PS foi gerado com “humanidade e cuidado”, não condenando ninguém a uma pena de sofrimento extremo

O projeto de lei do PS sobre a despenalização da morte medicamente assistida “vai ao encontro de garantir um processo rigoroso, continuamente acompanhado por médicos e outros especialistas, com uma preocupação de reforçar a possibilidade de utilizar cuidados paliativos e permitir ao cidadão, maior de idade, livre e esclarecido, uma escolha num quadro paradigmático de doença incurável que compromete a vida e que causa um sofrimento intolerável”, assegurou, no Parlamento, o presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, Eurico Brilhante Dias, tendo a deputada Isabel Moreira defendido que não existe “lei mais defensiva” do que esta.

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Eurico Brilhante Dias

A deputada do PS Isabel Moreira, que citou as palavras do Tribunal Constitucional para afirmar que “o direito à vida não pode transfigurar-se num dever de viver em qualquer circunstância”, sublinhou que, “na sequência do pedido de fiscalização preventiva feito pelo Presidente da República, o Tribunal Constitucional considerou que o princípio da inviolabilidade da vida humana não constitui, em geral, um obstáculo à morte medicamente assistida”. Ou seja, o Tribunal Constitucional “aceitou a regulamentação da morte medicamente assistida, pondo de lado a argumentação contrária, pelo que já não estamos aí”, vincou.

A socialista, que apresentava o projeto de lei do PS, explicou que, “em respeito pela pronúncia do Tribunal Constitucional”, foram densificados conceitos, “em particular o de ‘lesão definitiva de gravidade extrema de acordo com o consenso científico’”.

A parlamentar deixou uma certeza perante todas as bancadas: “Podíamos ter confirmado o diploma, seguindo alguma doutrina constitucional, mas como em todos os momentos que marcaram este tema tão digno, não queremos outra coisa que não democraticidade sem mácula, pelo que aqui estamos com um projeto de lei que uniformiza todas as definições a partir do artigo 2º e que, em resposta ao veto do senhor Presidente, especifica que não se trata de ‘doença grave ou incurável’, mas de ‘doença grave e incurável’, definida como ‘doença que ameaça a vida, em fase avançada e progressiva, incurável e irreversível, que origina sofrimento de grande intensidade’”.

“Por sua vez, como já constava do decreto anterior, entende-se por ‘lesão definitiva de gravidade extrema, a lesão grave, definitiva e amplamente incapacitante que coloca a pessoa em situação de dependência de terceiro ou de apoio tecnológico para a realização das atividades elementares da vida diária, existindo certeza ou probabilidade muito elevada de que tais limitações venham a persistir no tempo sem possibilidade de cura ou de melhoria significativa’”, esclareceu.

Isabel Moreira chegou mesmo a lembrar que, “por duas vezes, a Assembleia da República aprovou, por bastante mais que a maioria absoluta de deputados, a despenalização da morte assistida”. “Uma lei que para alguns peca por demasiado cautelosa que, em suma, reconhece isto: em casos estritamente delimitados, a irreversibilidade da degradação física e o sofrimento atroz por ela provocado justifica aceitar a vontade de antecipação da morte de quem experimenta esse fim de vida difícil de adjetivar”, salientou.

Para o Partido Socialista, não há, “em termos de direito comparado ou nacional, conceitos mais densificados do que estes nem lei mais defensiva”, asseverou.

Isabel Moreira referiu em seguida que, “por duas vezes, o Presidente da República não promulgou o que o Parlamento aprovou”. E recordou: “Na primeira vez, invocou para isso dúvidas de constitucionalidade, o que deu azo ao acórdão que afirma que não há um dever de viver. Depois, vetou politicamente, invocando dúvidas de interpretação jurídica. Mas não esqueçamos que, no seu requerimento de apreciação da lei pelo Tribunal Constitucional, o Presidente da República não solicitou que essa apreciação incidisse sobre a variedade de fórmulas verbais – ‘doença incurável e fatal’ em dois artigos e ‘natureza incurável da doença’ num outro – usadas para referir a condição de doença de extrema gravidade como requisito para a solicitação da morte medicamente assistida”.

“Ou seja, a variedade terminológica para enunciar o requisito de doença existia realmente já na versão inicial da lei. A realidade é o que é”, assinalou a socialista, que adiantou qual o facto em questão: “Num segundo momento, e no seu pleno direito, o senhor Presidente teve dúvidas e aqui estamos. Mas sabemos – e sabe quem está de boa-fé –, lendo as definições de conceitos que sempre estiveram na lei aqui aprovada que ‘doença fatal’ nunca significou ‘morte iminente’. Esteve sempre em causa uma doença de extrema gravidade que põe em risco a subsistência mesma da vida, causando um sofrimento atroz ao paciente”.

“Esta sempre foi a lei que dignifica as pessoas e inscreve-se na tradição do Partido Socialista de contribuir para uma sociedade plural, na qual todas e todos, com as suas conceções éticas, filosóficas, religiosas e políticas tenham lugar”, atestou a deputada do PS.

Isabel Moreira disse ainda que “esta sempre foi a lei da não perseguição penal” e que “parte do princípio de que é o próprio sujeito autónomo que deseja a eutanásia, sujeito esse que, tendo liberdade para tomar decisões vitais ao longo da vida sem possibilidade de interferência por parte do Estado, também tem liberdade para ter um espaço legalmente reconhecido de decisão quanto à sua própria morte”.

“Esta sempre foi a lei que nos convida a aceitar o outro”, garantiu Isabel Moreira, que deixou um conselho: “Na dúvida, tolerância”.

Decisão do cidadão permite reversibilidade a todo o tempo

Já no encerramento do debate, Eurico Brilhante Dias frisou que se trata de “um processo em que o cidadão livre e esclarecido, perante um cenário de irreversibilidade na doença, de acordo com especialistas, escolhe com dignidade a forma como quer viver e também como deseja deixar de viver, num quadro de sofrimento intolerável”.

O presidente do Grupo Parlamentar do PS destacou depois que a “consciência de um cidadão maior de idade permite a reversibilidade a todo o tempo, nas várias etapas da decisão tomada, juntando num processo sólido e robusto a intervenção de médicos e de uma Comissão de Verificação e Avaliação plural que, a anteriori, avalia todos os aspetos já previamente identificados e analisados por especialistas”.

O líder parlamentar do Partido Socialista referiu-se ainda à “grande humanidade e cuidado” com este este projeto foi gerado. “É um projeto de lei que responde também à interação com outros órgãos de soberania, que respeitamos, e que ajudaram à melhoria e à densificação conceptual do diploma, bem como reforçaram a consistência interna do trabalho final que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista e outros grupos parlamentares apresentam hoje nesta câmara”, declarou.

O projeto do PS representa “um trabalho longo, que teve a participação de outras bancadas, num processo conjunto que valorizamos e que queremos sublinhar”, mencionou o dirigente socialista.

Este trabalho conjunto foi construído “com a inquietação permanente de fazer bem, de legislar bem, que coloca no centro da decisão o cidadão – o ser humano – que sofre e que tem o direito de que a comunidade, coletivamente, respeite a sua vontade, num quadro de proximidade, garantindo um processo seguro, acompanhado e esclarecido”, acrescentou.

Eurico Brilhante Dias concluiu a sua intervenção dizendo a todas as bancadas que “este é o momento de decidir, este é o momento para enfrentarmos a realidade respondendo àqueles que, com enorme sofrimento, esperam que o legislador defina um quadro estável e seguro, que tenha adesão a um cenário social que merece a nossa atenção”.

O projeto do Partido Socialista, bem como os diplomas do Bloco de Esquerda, Iniciativa Liberal e PAN, foi aprovado na generalidade, seguindo agora para o trabalho na especialidade.

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