Isabel Moreira, que falava sobre o decreto que responde ao segundo acórdão do Tribunal Constitucional sobre a morte medicamente assistida, explicou que “o Tribunal entendeu que a expressão ‘sofrimento físico, psicológico e espiritual’, retirada da lei dos cuidados paliativos e inspirada na lei espanhola, por sugestão geral do anterior acórdão, não clarifica se estamos perante uma situação alternativa ou de cumulação”.
“Isto porque se considerou – ao contrário do legislador – ‘sofrimento’ como sinónimo de ‘dor física’. Para o legislador, ‘sofrimento’ não se confunde com ‘dor física’, mas temos, naturalmente, de respeitar o Tribunal Constitucional”, disse.
A socialista esclareceu depois que, “entendendo alguns juízes que a conjunção ‘e’ é alternativa, mas outros juízes que é cumulativa, optámos por regressar ao conceito de ‘sofrimento’ sem adjetivos já legitimado pelo Tribunal Constitucional em acórdão anterior”.
“Por outro lado, da leitura cruzada do acórdão e das declarações de voto, é plausível que se tivesse sido questionada a não consagração expressa da subsidiariedade da eutanásia em relação ao suicídio medicamente assistido, e de forma inequívoca, a atual composição do Tribunal Constitucional ter-se-ia pronunciado pela inconstitucionalidade da referida não subsidiariedade. Faz, assim, todo o sentido antecipar mais esta exigência implícita e nova do acórdão”, defendeu.
Depois de “quase uma década de debate sem precedentes na sociedade civil, nos órgãos de comunicação social e no Parlamento em várias legislaturas”, foi feito um diálogo de construção que “tem tudo, até por ter tudo o que nenhum diploma análogo teve noutro país, para ter chegado a bom porto”. “Estamos, enfim, mais próximos dos Tribunais Constitucionais de outros países que asseguram o direito que defendemos”, comentou a parlamentar.
Por isso, os deputados do Partido Socialista acreditam que “estão criadas as condições de conforto para uma promulgação por parte de Sua Excelência o Presidente da República” e garantem que “a margem de conformação do legislador foi testada como nunca”, tendo sido respeitado “cada teste, um depois do outro e depois do outro. Esta é a lei mais escrutinada de que temos memória e, de certa forma, ainda bem, e é também a lei com uma das maiores maiorias parlamentares de sempre”.
País precisa de ver em vigor a sua vontade expressada mais do que uma vez
Isabel Moreira sublinhou que todo este processo “tem sido incrivelmente difícil para os doentes”. “Foi desolador para quem a lei tardou” e foi “desolador ouvir de quem morreu pedindo por um direito que ainda é crime”, lamentou.
Considerando esta uma “lei profundamente societária e profundamente legitimada”, a deputada do PS alertou que “o país precisa de ver em vigor aquela que foi a sua vontade expressada aqui [na Assembleia da República], esmagadoramente, uma e outra e outra vez”.
Isabel Moreira pediu que se honre e recorde, “em ação consciente, gente como Laura Ferreira dos Santos e João Semedo, porque é mesmo indigno que a vida dos mortos desapareça da memória dos vivos que decidem”.
No final da sua intervenção, a socialista deixou mais um apelo: “Precisamos de paz e de pôr fim, de uma vez por todas, à perseguição penal”.