Eleição presidencial: uma vitória difícil, mas possível
Não há maneira de esconder que a esquerda democrática começou este processo eleitoral com uma dupla derrota. Nenhum dos vários candidatos que fariam previsivelmente o pleno desta grande área política aceitou concorrer; e os dois que se prestaram muito louvavelmente a concorrer dividirão inelutavelmente o conjunto dos militantes, simpatizantes e eleitores do Partido Socialista.
Por contraste, e mais uma vez, chegada a hora da decisão, a direita uniu-se em torno de um só candidato. Claro que isso significou uma tremenda derrota da atual liderança do PSD, que fizera aprovar em congresso uma moção de orientação política que expressamente excluía o apoio a Marcelo Rebelo de Sousa. Mas não altera o facto de, no próximo mês de Janeiro, só haver no boletim de voto um nome que conte da direita. Esta sensatez da direita e a multiplicação de candidatos ao centro-esquerda só prejudicam a possibilidade de ser eleito/a um/a candidato/a conforme aos nossos valores. Já tivemos essa lição em 2006 e em 2011, mas, pelos vistos, custa-nos a aprender.
A multiplicação de candidaturas não constitui apanágio do centro-esquerda. Os dois partidos à esquerda do PS não resistiram a repetir o seu número habitual: aproveitar as presidenciais para publicitar um seu ou uma sua dirigente.
São águas passadas, porém. Olhando para o próximo futuro, o que importa é ter bem consciência de três coisas. A primeira é que a figura e o papel do Presidente não podem ser desvalorizados: nos momentos críticos, ele pode ser determinante. Como aliás o estamos, por omissão, vendo. Em segundo lugar, num processo que é difícil para a nossa área, como ficou mostrado, é preciso que a campanha não acrescente mais dificuldades do que aquelas estritamente associadas ao livre debate democrático. Quer dizer: é preciso que ninguém se engane no adversário principal. Terceiro, mesmo que difícil, o processo está muito longe de decidido. Não está escrito em lado nenhum que o próximo Presidente não possa ser um ou uma candidata oriunda da esquerda democrática.
Na minha opinião, para que isso seja possível, é necessário reunir duas condições. A primeira é tornar claro que a esquerda entende a primeira volta das presidenciais como o equivalente prático de umas primárias – e, portanto, atua tendo em vista a unidade futura na segunda volta. E a segunda condição é pôr política e Estado no debate eleitoral. Marcelo pode ser (e em grande parte é) o “entertainer” do regime. Fará, se o deixarem, uma campanha sem política. Pois é preciso não o deixar fazer. As pessoas sabem distinguir o brilho comunicacional e a popularidade televisiva das funções nobres e críticas do Presidente da República. Dessas é que importa falar. E, quando se principia a falar delas, a estrela da TVI começa logo a empalidecer.