O socialista começou a sua intervenção no debate sobre a revisão da lei dos estrangeiros a frisar que, “numa câmara democrática, há debates que, pela temática, são eloquentes na forma como permitem a um Estado posicionar-se, às democracias orgulharem-se dos seus eleitos ou, potencialmente às vezes, às democracias refletirem sobre como devem encarar o seu futuro”.
Pedro Delgado Alves acusou de “não só faltar à verdade dos valores, como faltar à verdade dos factos” aqueles que dizem que as pessoas “que há poucos anos são portugueses ou apenas entre nós convivem não contribuem com o seu suor para aquilo que esta câmara ostenta e nos exemplifica”.
E deu um exemplo, proferindo-o pausadamente para que todos o possam compreender: “Em 2019, o contributo dos cidadãos estrangeiros residentes em Portugal para a Segurança Social foi no valor de 820 milhões de euros, uma subida de 36% em relação ao ano anterior”.
Mencionando que os deputados do partido Chega fugiram “cobardemente às suas responsabilidades”, saindo do hemiciclo num momento de tensão com o presidente da Assembleia da República, o deputado socialista perguntou ao ausente deputado André Ventura “onde é que vai buscar os 820 milhões de euros que muita falta fazem a todos os portugueses e a todos os que residem em território nacional se escorraçasse do território nacional, se tratasse sem dignidade aqueles cujo suor – muitas vezes explorados entre nós – deixaria de contar para poder ajudar a construir o país”.
Ora, a proposta de lei do Governo “serve vários propósitos, uns têm que ver com obrigações internacionais decorrentes da nossa inserção no espaço da União Europeia, são fáceis de explicar e de justificar, são melhorias na qualidade do acolhimento das pessoas e no funcionamento das fronteiras externas da União Europeia, bem demonstrando que longe de nos estarmos a afastar desses países através do acordo da CPLP, estamos a acarinhá-lo e a fazer com que funcione”, salientou.
“Mas, por outro lado, representa também a vontade de garantirmos que os portugueses que residem no estrangeiro nos países da CPLP beneficiarão do mesmo regime facilitado e acessível, desburocratizado que se pretende consagrar para aqueles que junto de nós querem vir desenvolver a sua atividade profissional ou estudar”, explicou o vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS.
Sobre este acordo de mobilidade na CPLP, Pedro Delgado Alves deixou um aviso: “Não podemos às segundas, quartas e sextas fazer de conta que a lusofonia é uma prioridade e, depois, às terças e quintas, quando isso colide com a agenda populista que queremos prosseguir, deitar fora uma peça estrutural que dificilmente encontramos em Estados e soluções congéneres”.
“É de saudar o acordo da CPLP e é de saudar a forma como ele aqui é hoje implementado”, asseverou o socialista.
O vice-presidente da bancada do PS terminou a sua intervenção com uma reflexão, numa referência às críticas do partido da extrema-direita: “Muito do que ouvimos há instantes nesta câmara era precisamente o mesmo tipo de discurso ofensivo, degradante que os emigrantes portugueses em França tinham que ouvir da boca de Jean-Marie Le Pen nos anos 60”, político francês que presidiu até 2011 a Frente Nacional, um partido nacionalista de extrema-direita.
“Os nossos compatriotas que o tiveram de ouvir antes de a camuflagem esconder a verdadeira face da Frente Nacional em França não têm que, na sua câmara representativa, ouvir aqueles que supostamente representam os portugueses voltar a invocar em relação a quem junto de nós quer construir o futuro as mesmas aleivosias, as mesmas degradantes afirmações que pretendem discriminar e deixar de lado quem todos os dias – muitas vezes com grande sacrifício pessoal, muitas vezes explorados” – constroem a sociedade portuguesa, atestou.
Para Pedro Delgado Alves, é aqui que “certas linhas vermelhas devem ser traçadas”, em nome de todas estas pessoas.