António Costa, que intervinha na cerimónia oficial de inauguração da Conferência sobre o Futuro da Europa, celebrada no Parlamento Europeu, enquanto copresidente da conferência, na condição de presidente em exercício do Conselho da UE, começou por apontar as diferenças entre o que é hoje a União Europeia e o projeto inicial, lançado a 9 de maio de 1950 com a declaração de Robert Schuman: “Há muito que não somos os seis países que se propunham criar um mercado comum do carvão e do aço. Fomos sempre crescendo na nossa vontade de fazer mais em comum, alargando sucessivamente a nossa diversidade com novas adesões. E há uma história de sucesso de que nos podemos orgulhar”.
Sublinhando que o projeto europeu exige “muita persistência e criatividade”, o primeiro-ministro português admitiu que “nem sempre avançámos em conjunto ou ao mesmo tempo, como Schengen ou o Euro bem exemplificam, nem concluímos ainda plenamente todos os passos que já demos, como Schengen e o Euro também bem demonstram”. “Se queremos ter sucesso – e devemos ter sucesso – não podemos iludir as dificuldades. Existe hoje um conjunto de debates de fundo sobre o que é e o que deve ser a nossa União, que não se limita a afastar Estados uns dos outros, mas que atravessam, dividem as próprias sociedades em vários Estados-membros”, asseverou.
António Costa frisou que existem várias questões às quais é necessário dar resposta, como saber se ainda se está aquém do necessário na UE, como conjugar valores comuns com o respeito pelas identidades nacionais ou como articular os interesses nacionais com a solidariedade, dando como exemplo a gestão da imigração.
“A Conferência sobre o Futuro da Europa é a oportunidade de assumirmos, com total franqueza e abertura, que hoje já não pensamos todos como pensávamos e que novos tempos exigem novas vontades. As vontades mudam com o tempo e multiplicam-se com a diversidade”, assegurou.
O chefe do Executivo português frisou depois que “esta é uma conferência dos cidadãos, pelos cidadãos e para os cidadãos” e, por isso, deve centrar-se no debate das vontades plurais dos europeus e não em negociações entre Estados.
Mencionando um recente inquérito Eurobarómetro, António Costa destacou que a resposta da União Europeia à crise pandémica ainda em curso colocou a UE “num nível máximo de confiança dos seus cidadãos”, saudando em seguida a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
E acrescentou: “Desta vez, a preocupação da União de tomar conta dos seus cidadãos foi muito clara. Desta vez, os cidadãos europeus não se sentiram abandonados à sua sorte e viram-se considerados como iguais”.
Para António Costa, a crise provocada pela Covid-19 permite tirar duas conclusões: “Primeiro, os cidadãos europeus reconhecem um valor acrescentado à ação da UE e, segundo, eles desejam que a União concentre a sua ação na resposta direta aos seus problemas concretos”.
Agenda Global para os Oceanos 2050
O primeiro-ministro alertou em seguida que a UE, “se quer ser um ator global, não pode ser confinada à sua dimensão continental” e deve “assumir a liderança nas grandes causas da humanidade deste século”. Por isso, “a presidência portuguesa vai propor que se trabalhe, no seio da UE, numa Agenda Global para os Oceanos 2050”, já que os oceanos são o mais importante regulador climático, são uma imensa fonte de recursos e necessitam de uma proteção urgente, avançou.
António Costa reafirmou que, “mais do que uma moeda única, um mercado interno ou uma união aduaneira, a Europa foi e é – e terá de ser – uma comunidade de valores e um espaço com um modelo social único no mundo, garante de proteção e igualdade de oportunidades para todos”.
“Mas só conseguiremos preservar esta nossa identidade se lhe acrescentarmos novas qualidades, aproveitando as oportunidades que temos pela frente”, avisou, recordando que a Europa começou, há 71 anos, “no carvão e no aço, bases da economia de então”, mas deve recomeçar agora “no verde e no digital”, os motores dos planos de recuperação para o futuro.
Lembrando o antigo Presidente da República Mário Soares, “pai da democracia portuguesa e um grande europeu”, que já em 1976 alertava para algo que permanece atual, ao afirmar que “construir a Europa não é tarefa fácil” e ao defender que “repensar a Europa e o seu futuro é um dever permanente que deve ser assumido com humildade face à importância histórica dos objetivos e que deve ser obra de todos os europeus”, António Costa salientou que “mais do que meros espectadores da mudança, os cidadãos europeus devem ser os obreiros dessa mudança”.
“Dirijo, pois, as minhas palavras finais diretamente aos cidadãos europeus, aos que aqui estão presentes, e sobretudo aos milhares que nos seguem à distância e estão conectados por via digital. Está aberta esta conferência, para que todos vós nela participem”, concluiu António Costa.