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Combater as desigualdades e discriminações é exigência a prosseguir com diálogo e políticas inclusivas

Combater as desigualdades e discriminações é exigência a prosseguir com diálogo e políticas inclusivas

“Ignorar diferentes eixos de desigualdade e as suas variadas interseções é um erro cujo preço estamos a pagar hoje e que pagaremos mais caro no futuro”, alertou ontem a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, em Coimbra, na Conferência 2020 Interseccional ‘Encarceramento e Sociedade’.

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Combater as desigualdades e discriminações é exigência a prosseguir com diálogo e políticas inclusivas

A governante falou em temas como o racismo, o colonialismo e a desigualdade a partir da sua experiência “pessoal e limitada” enquanto “mulher e negra”. E considerou que no Portugal contemporâneo ainda subsiste “um padrão que discrimina com base na raça, com base na etnia, e que essa discriminação se intersecciona com a discriminação económica e social”.

“A discriminação não é um produto de mera ação de indivíduos isolados. Institui-se como um sistema, com raízes históricas perfeitamente identificadas, mas um sistema que se alimenta e se institucionaliza através da perpetuação por ação ou por omissão de ação de estereótipos que depreciam, diminuem e aviltam a humanidade de determinados grupos”, sublinhou.

Francisca Van Dunem referiu depois que se a existência desse sistema de crenças, “que se constrói na primeira infância”, não for “claramente assumida e politicamente enfrentada, aquilo que teremos é a proliferação e manutenção de ‘sociedades de inimizade’”, utilizando a expressão do camaronês Achille Mbembe.

Se assim for, “não chega proclamar a inexistência de problemas raciais quando eles tendem para a radicalização”, sendo necessário que os casos como aqueles que têm vindo a público não fiquem “encerrados na sua mera dimensão judicial”, defendeu.

Criar espaços de diálogo

A governante deixou uma série de perguntas: “Como podemos acabar com o medo do outro? Como é que podemos lidar eficazmente com a xenofobia? O meu marido tinha a mania de perguntar: ‘Como se formam democratas?’. E eu pergunto: Como se formam antirracistas? Como podemos criar sociedades em que cada um sinta que o outro, na sua diferença, o complementa na sua humanidade?”.

Respondendo à sua questão, a ministra da Justiça disse que é preciso “encontrar espaços de diálogo que permitam dar voz às várias comunidades, nomeadamente às comunidades mais fragilizadas”. “Precisamos também de identificar políticas públicas justas e inclusivas e que tenham em consideração a heterogeneidade dos diversos grupos afetados pelas diferentes formas de discriminação. Consideraria mesmo que essa é a grande reparação que o presente pode exigir do passado”, acrescentou.

Francisca Van Dunem recordou que nasceu numa família negra em Angola, na altura uma colónia portuguesa, onde a diferença “mais patente e imediata era a diferença racial”. “Havia pretos – era assim que se chamavam – e havia mestiços que se distinguiam em duas subcategorias: mulatos e cabritos. E isso é pejorativo, porque mulato vem de mula e cabrito de cabra e essas subcategorias existiam e eram socialmente utilizadas”, vincou.

A ministra lembrou depois os bairros que foram sendo construídos em Portugal por pessoas das antigas colónicas que fugiam da guerra, salientando que foi lá que cresceram os filhos desses migrantes, em espaços que apesar de serem seus estavam – e estão – encostados “numa cidade que lhes é estranha e que lhes é hostil”.

“Nesses bairros, forjaram-se identidades de combate e resistência a um mundo que não os aceita como seus ou que eles sentem que não os aceita como seus. A verdade é que essas crianças hoje têm muitas delas 30 e 40 anos e precisam de ter um lugar na única pátria que conheceram e que não querem ser identificadas apenas como parte integrante dessa pátria quando, pelas suas qualidades, se distinguem em atividades que galvanizam o país, como é o caso do desporto. Querem ser reconhecidos todos os dias, nas suas qualidades, nas suas menores virtualidades”, asseverou a responsável pela pasta da justiça.