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“As principais obras estão a aproximar-se do fim”

“As principais obras estão a aproximar-se do fim”

A entrega da Carris à câmara a um ano das autárquicas é uma prenda do Governo?
De forma alguma. É o cumprimento de um compromisso do programa do Governo, mas também de uma ambição antiga da Câmara de Lisboa. Chegámos a ter negociações muito avançadas no anterior Governo. Só não foram concluídas por uma opção de natureza estritamente ideológica, em particular do primeiro-ministro à época. Ele entendia que as câmaras não tinham vocação para gerir sistemas de transportes e que teriam de ser privados.

Quanto é que a Carris vai custar à câmara por ano? Em 2017 está reservada no orçamento uma verba de 15 milhões de euros.
É esse o valor de base de referência, que pode ser aumentado. Será completado com outras fontes de receita que a própria Carris irá desenvolver, como a negociação da publicidade dos meios, cujos contratos estão a terminar. Vai ser complementado com o acesso a fundos comunitários para o investimento na renovação da frota. Por isso, esse é um valor que vamos adaptando com a evolução das necessidades.

Não há o risco de a assunção da Carris comprometer a saúde financeira da câmara?
A questão da sustentabilidade financeira da Carris e desta operação é de grande importância. O país conheceu nas últimas décadas dois modelos profundamente errados. O primeiro é achar que temos um serviço de transporte público e que não o pagamos. O modelo em que uma autoridade de transportes, seja o Estado ou o município, queira desenvolver os transportes públicos não os pagando, acumulando dívida, é totalmente insustentável. Afastamo-nos por completo desse modelo. Há um segundo modelo que se mostrou insustentável, que foi o modelo de reduzir tanto o serviço público, à quase inexistência, que passámos a ter um serviço de transporte que não serve as necessidades de mobilidade. O que estamos a propor é um modelo em que assumimos com clareza que o transporte público tem um custo, que não se paga só com as receitas dos tarifários e que tem que ser completado com receitas adicionais.

E isso não pode comprometer as finanças da câmara?
Na minha opinião não. As finanças da câmara têm a solidez e a robustez para esta aposta. Teremos obviamente de ir fazendo escolhas do ponto de vista da gestão dos orçamentos, mas não tenho dúvida de que esta é uma área estratégica em que temos de apostar.

Eventuais despesas relacionadas com os swaps serão assumidas por quem?
Quer a dívida histórica, quer as contingências associadas à gestão da empresa até à câmara a assumir correrão por conta do Estado.

Em relação ao Metropolitano de Lisboa, no acordo de princípio com o Governo fala-se em integração com a Carris, mas não se diz como será garantida.
O que está previsto é haver um contrato interadministrativo entre o Estado e a câmara que regule a forma como as duas autoridades de transportes se vão relacionar. Ainda iremos negociar os termos mais precisos, mas posso adiantar alguns aspectos que para nós são essenciais. Primeiro a participação da câmara na administração do Metro, retomando o que tinha sido uma realidade durante um período da história.

A câmara passará a ter um elemento na administração do Metro?
Que na minha opinião deve ser um representante da Carris, para facilitar os elementos de articulação operacional. Em segundo lugar o que me parece mais importante é que fique muito claro, do ponto de vista até dos próprios estatutos das empresas, que vamos manter a integração da bilhética, do tarifário, do sistema de informação ao munícipe. E que vamos, aliás, ambicionar em conjunto mais, que é proceder a uma integração maior a nível metropolitano. Não há resolução dos problemas de mobilidade na cidade de Lisboa pensada dentro das fronteiras do município.

Já se pronunciou favoravelmente sobre a ligação do metro entre o Rato e o Cais do Sodré. Mas a verdade é que com ela a zona ocidental da cidade continuará a descoberto. Isto preocupa-o?
A falta de metro na zona ocidental? Sem dúvida, é um problema essencial na cidade e não abdicamos de forma nenhuma dessa expansão.

E não devia ser esta a prioridade?
A ligação da linha verde à linha amarela vai-nos permitir fazer uma mudança muito grande na forma como o metro opera. Vamos passar a ter uma linha circular com grande capacidade de distribuição. Agora quero ser muito claro: o investimento na linha vermelha, no prolongamento do eixo São Sebastião, Campolide, Amoreiras, Campo de Ourique e depois até à zona ocidental de Alcântara, Ajuda, Belém, é prioritário. Não abdiquei dele. De forma alguma. Como também acho que é muito importante ser completada a extensão da linha vermelha do Aeroporto até Entrecampos.

Muitas pessoas dizem que Lisboa está transformada num estaleiro, porque se estão a fazer tantas obras ao mesmo tempo. E mesmo assim ainda há muitas por começar, como as do programa Uma Praça em Cada Bairro.
Mas vão reclamar comigo porque ainda não as comecei, certo? [Risos] Quem está na vida pública percebe que a crítica acompanha o cargo. Só podemos escolher de que lado é que levamos a crítica: podemos levar a crítica por não fazer ou podemos levar a crítica por fazer. Eu prefiro levar a crítica por fazer.Advertisement

O problema é serem tantas obras ao mesmo tempo. A vida dos lisboetas e de quem anda de carro em Lisboa está particularmente complicada.
Estamos a fazer várias obras, várias intervenções e tenho uma boa notícia para dar: as principais obras estão a aproximar-se do seu fim. Já estamos para lá da metade do prazo de conclusão das obras.

Quais são as que vão concluir?
O Eixo Central: Avenida da República, Saldanha e Fontes Pereira de Melo, contamos fechá-la em Janeiro. A frente ribeirinha estará concluída no início do segundo trimestre de 2017, havendo uma normalização da circulação viária antes disso, já no mês de Janeiro. O Cais do Sodré terminará em Janeiro, a Rua de Alfândega já terá terminado por essa altura e ficaremos depois confinados à parte final da obra que é a conclusão do parque de estacionamento do Campo das Cebolas.

O cidadão Fernando Medina nunca se irritou no trânsito com o presidente da Câmara de Lisboa?
[Risos] Era um pouco esquizofrénico. Não, isso não me acontece. Mas tenho bem a consciência das dificuldades e do impacto. Não as menorizo nem as desvalorizo. Acho que não nos podem fazer desistir do investimento na cidade. Recordo-me bem, quando assumi funções, que a grande crítica que havia sobre a cidade era que estava cheia de buracos, que não tinha investimento, uma cidade cujos passeios não eram reparados, que não tinha praças nem jardins infantis suficientes. Sei qual o sentido geral que as pessoas querem da vida da cidade. Agora, isto não é possível entregar sem termos um período de dificuldade. Estamos a tentar o que podemos para a minimizar.

Acha que Lisboa está longe de alcançar o seu potencial turístico? Ou neste momento o crescimento já é descontrolado?
Temos tido circunstâncias externas e temos tido o grande mérito interno de hoje em Lisboa o turismo ser uma actividade económica com uma grande capacidade de gerar emprego, investimento e modernização da cidade. Se hoje a cidade vive o dinamismo que vive deve-o muito ao turismo. Agora nós temos que nos adaptar e perceber que a cidade está a mudar, com rapidez, também por causa do turismo, e sermos capazes de gerir de forma positiva esta mudança.

Lisboa não está a ficar uma cidade igual às outras, descaracterizada, porque houve um crescimento acelerado do turismo?
Não. De forma alguma. A cidade está a mudar, isso é evidente. Em alguns aspectos naturalmente a mudança está a ser positiva. Eu recordo este facto: nas eleições de 2013, o grande tema da campanha era a reabilitação urbana. Como era o tema da cidade há 20 anos. Hoje não ouve este tema no debate político sobre a cidade.

Mas a expectativa era que quando essa requalificação avançasse contribuísse para o repovoamento da cidade e não é isso que está a acontecer. 
O que digo é que o turismo tem efeitos claramente positivos, alguns até de dimensão inesperada face àquilo que era a expectativa há poucos anos, e introduz necessidades novas de correcção, introduz riscos sobre a sustentabilidade, sobre o equilíbrio geral de algumas zonas da cidade, que necessitam de políticas. Defendo que o conceito de uma cidade, das várias zonas da cidade, deve assentar numa combinação múltipla de actividades nos mesmos espaços. Com o turismo passa-se a mesma coisa. Uma cidade que tenha zonas em que se concentrem só actividades de natureza turística é uma cidade que perderá a sua identidade.

Mas isso não está a acontecer?

Reconheço que há alterações que têm que ser geridas. O que estamos a fazer relativamente ao comércio tradicional, com as Lojas com História, é um programa precisamente nesse sentido. Quando defendemos na Assembleia da República que houvesse uma correcção da tributação relativamente ao alojamento local é outro instrumento nesse sentido.

É suficiente uma correcção ou devia haver uma equiparação?

É um avanço, é um sinal. A equiparação total não leva em conta que o alojamento local tem custos que o alojamento convencional não tem. Acho que temos que fazer essas políticas mas não me esqueço do seguinte: há dez anos não se circulava na Baixa a partir das seis da tarde por medo e insegurança. O turismo, nomeadamente na Baixa, está a ocupar um papel em zonas que já estavam a sofrer problemas de desertificação profundos há muito tempo. Na freguesia de Santa Maria Maior vivem hoje cerca de dez mil pessoas. Nos anos 60 a população residente chegava às 50 mil pessoas. A década em que há menos perda populacional neste centro histórico é precisamente a última década, a que é contemporânea do desenvolvimento do turismo. Por isso não é o turismo que contribuiu para a desertificação desta zona histórica da Baixa. Este processo da dinâmica turística está a ter um processo de requalificação muito profundo e muito importante.

Mas não está também a contribuir para que não ocorra o desejado repovoamento da cidade?

As dificuldades nessa matéria são muito mais profundas do que o problema do turismo. A questão do povoamento da cidade já tem décadas. Tem a ver com uma questão estrutural do preço dos terrenos, do preço das habitações, da política de compra de casa própria. O problema de voltarmos a ter mais pessoas dentro da cidade é um objectivo central para o executivo. Agora tenho a consciência que só conseguiremos chegar lá com uma nova política pública de habitação, com o Programa da Renda Acessível, que tem que ter uma escala, um tamanho muito grande. O desafio que temos é que estamos a construir este programa do zero porque em Portugal nas últimas décadas as políticas públicas concentraram-se muito em responder ao problema da habitação social. O país desarmou-se de instrumentos de política de acesso à habitação para a classe média.

Dizia o BE no outro dia na Assembleia Municipal que este programa depende quase exclusivamente do interesse e disponibilidade de investidores privados. Há aqui um risco de fracasso, está preocupado com esse risco?

Não há nada na vida pública que se faça sem risco, não há nada que possa ser dado como certo. Também posso dar o contrário: se fizer um programa de habitação pública totalmente dependente de investimento publico municipal, não corro risco nenhum, não vou conseguir fazê-lo porque não terei dinheiro para o fazer.

Tem tido manifestações de interesse de privados?

Há manifestações de interesse. Tenho confiança que vamos ser bem sucedidos. Não tenho medo nenhum de irmos adaptando e ter de mudar e ajustar a orientação do programa. O que me interessa mesmo é o objectivo e se for preciso inventar outras iniciativas, inventaremos outras iniciativas. De uma coisa tenho a certeza: se não tivermos um mercado de iniciativa pública de habitação na cidade não resolveremos os problemas de acesso à habitação, com ou sem turismo.

Os laços entre PS, PCP e BE “têm de ser reforçados no futuro”

O presidente da Câmara de Lisboa defende que o PS deve investir na cooperação com a esquerda. Fernando Medina elogia a “convergência”. A um ano das autárquicas, diz que é cedo para falar nas eleições e aponta o dedo a PSD e CDS por o fazerem sem ser “pela cidade”.

Este mês a câmara recebeu a Carris, o Governo deixou uma série de medidas para o Verão, como aumento de pensões ou o fim da sobretaxa. Não são demasiadas boas notícias pré-eleições?
As medidas do Governo havia até a vontade que já tivessem acontecido. Não tem nenhuma relação. Os eleitores já nos deram provas de saberem bem distinguir o que está em causa nos actos eleitorais. Além do mais, chegámos ao absurdo quando dizem: ‘As obras são más, só prejudicam.’ Depois do outro lado: ‘Mas ele só está a fazer por razões eleitoralistas.’”

A sondagem mostra um reforço dos partidos à esquerda e uma perda dos partidos à direita. É uma excelente notícia para os partidos que apoiam esta solução. Passado só um ano, conseguiram, a seu crédito, a descrispação do país e a normalização da vida pública. A intranquilidade, o negativismo permanente e o confronto desapareceram. Os partidos que apoiam o Governo tiveram um papel muito importante e também o Presidente da República: conseguiram mostrar que aquilo que Passos Coelho dizia que era impossível é possível e foi feito com uma grande serenidade.

As sondagens também mostram que quem está a capitalizar tudo isso é o PS. Tendo em conta que 2017 é um ano de autárquicas e para o PCP, por exemplo, é muito importante, este desequilíbrio não poderá ser perigoso para o Governo?
O que os partidos conseguiram demonstrar foi a importância do passo histórico que deram. A sondagem mostra que nenhum se prejudicou com esta solução. Alguns temiam que esta solução fizesse diluir as diferenças e provocasse a diminuição dos partidos, mas não está a acontecer. Mais: esta solução criou, ao conseguir resultados, laços de confiança que não existiam. Acho que têm de ser reforçados no futuro.

Mesmo que o PS tenha maioria absoluta, deverá chamar PCP e BE no futuro?
Estamos ainda muito longe de legislativas. Estes três partidos entraram numa dinâmica de cooperação. Estiveram durante muitos anos numa dinâmica de rivalidade e de uma certa competição. Esta solução traduz uma realidade nova, de acentuar os elementos de convergência e cooperação. O país reconhece isso como positivo. É uma obrigação do PS, e gostava de ver nos outros partidos um reforçar desses laços.

É possível essa dinâmica de cooperação, como lhe chama, em Lisboa?
As autárquicas não devem confundir-se com a lógica das legislativas.

Mas a lógica é a mesma: ou de competição ou de cooperação…
Sim, depende do grau, acho que estamos a fazer um debate importante na cidade. Tenho salientado a convergência importante que há à esquerda em matérias centrais.

Não sendo possível uma coligação pré-eleitoral, admite apostar em acordos pós-eleitorais?
Ainda é cedo para o debate sobre as soluções políticas. Só estamos a falar das autárquicas por uma vontade do PSD e do CDS, por interesse próprio, de natureza partidária que nada tem que ver com as preocupações da cidade. Os cidadãos não estão a pensar nas eleições. Nenhum partido, à excepção desses dois, se entusiasmou com o tema. E porquê? Por uma questão de sobrevivência e de afirmação das próprias lideranças — por motivos externos à cidade de Lisboa.

Não está afastada a possibilidade de uma coligação? Jerónimo de Sousa disse que a CDU ia concorrer sozinha em todo o país.
Ouvi. Volto a insistir: não é tempo de fazer o debate sobre as soluções — nem pré-eleitoral e muito menos pós-eleitoral. Há um diálogo que corre entre os partidos e forças políticas em permanência nos órgãos da câmara. Os quatro grandes desafios, na área da habitação, dos transportes públicos, do emprego e da inclusão, são desafios em que vejo espaços de convergência com os partidos à esquerda.

Parece conformado com a ideia de que se ganhar com minoria vai ter de fazer um acordo só nas políticas e não para governação.
Acho que isso já são muitos pressupostos (risos). Aliás, ainda nem anunciei que era candidato.

Em relação aos PS+, com os Cidadãos por Lisboa e à Associação Lisboa É Muita Gente, a ideia é reactivá-lo?
Acho que a experiência deste projecto político do PS+, que António Costa, Helena Roseta, José Sá Fernandes e o Manuel Salgado tiveram a arte de construir, teve resultados extraordinários. Em equipa que ganha não se mexe e por isso aquilo que provou bem deve ser mantido.

Prefere Assunção Cristas ou Santana Lopes?
Tenho muitos problemas com os quais tenho de lidar no dia-a-dia como presidente da câmara. Escolher quem é o candidato do PSD e do CDS não é um deles.

Como é que vê as críticas que lhe são apontadas pela candidata do CDS?
Acho positivo ter Assunção Cristas no debate sobre a cidade. Agora a sua entrada no debate não se fez propriamente pela cidade — fez-se mais por questões internas relativamente ao posicionamento do partido, à sua situação e ao diálogo do CDS com o PSD, do que propriamente com uma preocupação genuína relativamente à cidade. O que tenho visto em relação a temas centrais da cidade é um não-pronunciamento.