Vice-reitora da Sorbonne é do PS
Ser portuguesa, ser mulher, ser jovem e estar no topo de uma universidade francesa de prestígio como a Sorbonne é, de facto, algo de extraordinário… Como foi o percurso até aqui?
Para singrar no mundo universitário francês e em particular na Sorbonne, é necessário dar provas concludentes de credibilidade e de capacidade em diferentes níveis, nomeadamente científico, pedagógico e de gestão administrativa. Só assim conseguimos o reconhecimento dos nossos pares. As universidades francesas têm a sua própria autonomia e quem chefia acaba por se tornar um autêntico gestor num universo altamente competitivo. Foi a minha capacidade de gerir, enquanto diretora, o quotidiano da Faculdade de Línguas Estrangeiras Aplicadas, considerada a mais complexa da Sorbonne devido à sua especificidade, que me permitiu aceder ao cargo de vice-reitora. Foi um longo percurso de luta interna e, ainda hoje, continua. É desta forma que se desenrola a gestão universitária. A aceitação de estrangeiros na gestão da universidade não é fácil. Há um chauvinismo um tanto desmesurado, acresce o facto de ser mulher. Contudo, estas circunstâncias não tiveram influência determinante neste meu percurso. Acresce que nunca abdiquei, nem nunca abdicarei de “Madame Oliveira”, tendo muito orgulho nas minhas raízes portugueses e faço questão de continuar a levar as cores de Portugal pelo mundo.
Quais os desafios no curto e medio prazos?
Centro os desafios em três campos de ação, embora distintos mas complementares:
– Desenvolver uma estratégia institucional para a qualidade a nível da megaestrutura “Université Paris Sorbonne Cité (USPC)” expressa na sua política para a qualidade do ensino e da investigação e consubstanciada num sistema interno de garantia de excelência;
– Continuar a discutir as questões das políticas linguísticas ao nível do ensino, da investigação e da gestão política da diversidade cultural num plano internacional;
– Redobrar esforços para valorizar, defender e promover a língua e cultura portuguesas em França e no mundo.
Na Sorbonne, está na linha da frente da defesa da francofonia num terreno global dominado pela língua inglesa. Nesta ordem de ideais, o que tem a dizer sobre a promoção e divulgação da língua portuguesa nestes últimos anos?
Há muito a fazer para a efetiva promoção e divulgação da língua portuguesa. A primeira medida, para constituir o alicerce desse trabalho, é a criação de verdadeiras políticas linguísticas para a internacionalização do Português, sendo indispensável um sólido conhecimento sobre a língua que queremos difundir. Os esforços de promoção do Português precisam de um foco, deixando de lado a atual falta de rumo com que nos deparamos. Perceber o Português como língua pluricêntrica é fundamental para o desenho de uma política linguística efetiva, embora, por si só, não resolva o crónico problema da nossa falta de autoestima.
É urgente adotar, também, uma atitude ambiciosa a nível das organizações internacionais, nas quais o futuro da língua portuguesa também está em jogo, pois a escolha da língua na qual nos expressamos constitui, de forma indelével, um ato político proeminente. Por último, a promoção da língua portuguesa tem de ser assumida por todos e sempre, seja internamente seja no estrangeiro. Para tal, é fundamental que se arquitetem propostas concretas e não meras teorias vagas e pouco fundamentadas. Nesta matéria, não há lugar ao conformismo. Os problemas concretos não se resolvem com retóricas. Exige-se credibilidade, conhecimento aprofundado e experiência. Só assim é possível uma efetiva afirmação política que impulsione uma nova orientação para a lusofonia.
Ao refletir sobre a dura realidade do também seu país, Portugal, o que é que se lhe impõe dizer?
Sou sensível e preocupo-me com as dificuldades de muitos portugueses, resultantes da crise que há anos perdura. Os efeitos sobre a população portuguesa das opções políticas que têm sido tomadas pela Europa e por este Governo são devastadores. Acompanho aqueles que pensam que é necessário parar com a austeridade e retomar os velhos mas nobres princípios europeus de solidariedade e da coesão. O que, necessariamente, obriga a uma mudança global na UE, a uma reformulação de políticas dos diferentes governos que a integram. Basta observarmos o que se passa na Educação, na Saúde e na Justiça, os três pilares de uma sociedade democrática que estão numa situação de grande desnorte. Todos sentimos isso. E esta situação gera insegurança e perda de confiança. É pois, urgente, uma mudança de paradigma, capaz de devolver a esperança a Portugal e aos portugueses.
O que mais a desiludiu e desilude da (in)ação do Governo atualmente em exercício em Portugal?
Não duvido que qualquer governo democrático quer o melhor para o seu país. Contudo, o atual Governo, ao implementar medidas tão austeras, e fê-lo por convicção ideológica, impulsionou um histórico crescimento das desigualdades sociais, traduzido num forte aniquilamento da classe média. Esta realidade fez crescer a emigração para um recorde histórico. E a agravar tudo isto, deparamo-nos com a falta de políticas efetivas para as questões da emigração. Basta observarmos o que se passa com o atual funcionamento dos consulados e embaixadas que, para as nossas comunidades, deveriam constituir verdadeiros “portos de abrigo”.
Neste ir e vir de França para Portugal e vice-versa, como encara e como faz militância socialista?
A distância a que me encontro no exercício da minha atividade profissional não é, de todo, impeditiva do exercício de uma militância ativa. O que é essencial é o que se faz, o que se faz bem, independentemente do lugar onde trabalhamos ou residimos. Os avanços tecnológicos dos nossos dias permitem-nos agir em tempo real. O PS não tem fronteiras e, como tal, a militância é sempre possível e desejável nos espaços onde nos encontramos em cada momento. Se não, como valorizaríamos os contributos das nossas comunidades da diáspora? Sou militante do PS, na concelhia de Barcelos, há cerca de dez anos. Aí desenvolvi as primeiras ações de militância na freguesia de naturalidade, Negreiros, onde constituí a primeira lista do PS às autárquicas de 2005 a convite do Dr. Horácio Barra, ex-líder da Concelhia de Barcelos. Fui deputada na Assembleia Municipal de Barcelos e Vereadora na Câmara Municipal. Deste modo, tive o privilégio de iniciar a minha militância política com um grande líder político, Dr. Horácio Barra, que sempre fez aquilo que estava certo e não aquilo que era conveniente.
Estou atenta e olho a política como uma atividade de enorme magnanimidade. E, por isso, não transijo com os que, de forma deliberada, a tentam conspurcar.
O que espera da liderança de António Costa?
Reconheço no Secretário-geral do PS, António Costa, craveira intelectual e política que, aliadas à sua larga experiência partidária e governativa o coloca, sem dúvida, no topo das expectativas e da preferência dos portugueses nas próximas eleições legislativas. Mas não podemos escamotear que a condição essencial para António Costa vencer as eleições seja uma efetiva capacidade de mobilizar Portugal e os portugueses. Para tal, é um imperativo que Portugal e os portugueses se identifiquem com as suas propostas, acreditem no seu projeto e confiem na sua liderança. Estou convicta de que o Partido Socialista obterá um bom resultado eleitoral, necessário à concretização das propostas que tem para a ação governativa, algumas das quais já conhecidas e traduzidas na “Agenda para a Década”.