Cenário macroeconómico – Convenção
Em Novembro de 2014 tive a honra de ser convidado pelo Dr. António Costa para coordenar um Relatório que definisse as linhas gerais de governação económica e de estratégia orçamental para a próxima legislatura. Este documento dever-se-ia enquadrar na Agenda para a Década e definir um conjunto de princípios de governação económica e de políticas públicas que recolocassem o país numa trajetória de crescimento sustentável.
Foi um desafio único. Inovar a discussão de políticas públicas em Portugal. Torná-la transparente e auditável. Colocar anos de análise e estudo ao serviço do futuro de Portugal.
A economia portuguesa foi gerida nos últimos anos com base no medo e na culpa. Quase perdemos a confiança em nós. Fomos convidados a procurar alternativas fora de Portugal.
A primeira tarefa do grupo que coordenei foi diagnosticar. Desmontar uma realidade construída com mitos. Era necessário conhecer Portugal. No final dessa exploração, chegamos ao ponto de onde partimos. E, pela primeira vez, conhecemos o país que queremos construir.
Queremos que as decisões dos portugueses sejam tomadas em Portugal, mas queremos que Portugal seja parte da Europa, de uma Europa que está, ainda hoje, como esteve há 40 anos, connosco!
A cidadania europeia é parte insubstituível do nosso trajeto económico, cultural e social. Mas não há cidadania plena num país desigual. Onde os mais jovens procuram o retorno dos seus investimentos lá fora. Perdemos 253 mil jovens nos últimos 4 anos.
Temos uma sociedade caracterizada pela conjugação de dois problemas intergeracionais: a desigualdade e a falta de mobilidade social. A educação é o fator chave para promover a mobilidade e reduzir a desigualdade. É um investimento dos pais nos filhos, que permite que a próxima geração esteja mais capacitada. Em Portugal este processo é lento e não está ao alcance de todos. Devemos dar os parabéns aos pais que conseguiram que os seus filhos fossem mais além em termos de escolaridade. Porque ao contrário de outros países europeus, esta ainda não é a norma em Portugal. Sobretudo para as famílias que têm dificuldades financeiras. Urge quebrar este ciclo.
Nos últimos anos a política económica foi definida de costas voltadas para os portugueses. Esconderam-se cortes salariais, para sustentar a redução do salário mínimo. Lançou-se uma geração de novos e talentosos trabalhadores numa rotação de emprego desenfreada, dizendo que tínhamos um mercado de trabalho rígido. Argumentou-se que vivíamos acima das nossas possibilidades e promoveu-se o maior aumento de impostos da nossa democracia. Reduziram-se as prestações sociais e os salários para criar em Portugal os trabalhadores pobres, os mais competitivos na retórica vigente. Aqueles a quem a elevada precarização das relações laborais impede, em cada ano, de ganhar mais do que o salário mínimo nacional.
Estes são 41% dos trabalhadores portugueses. Conseguirão 41% dos portugueses viver “acima das suas possibilidades” recebendo menos de 6800 euros por ano?
Temos que eliminar todos os obstáculos ao crescimento da produtividade, que impedem os trabalhadores portugueses de ambicionar salários mais próximos dos nossos parceiros europeus.
Para isso propomos a criação de um Complemento Salarial Anual. Uma prestação que vai ajudar quem trabalha a sair da pobreza. A elevar a ambição de empresas e trabalhadores.
A Segurança Social é uma das grandes preocupações da sociedade portuguesa. A sua sustentabilidade depende do crescimento económico. Emigração, empobrecimento, desemprego e precariedade são sinónimos de destruição do Estado Social. Por isso propomos uma estratégia focada na criação de emprego, na fixação dos jovens no nosso país, na valorização salarial e na redução da precariedade. O desemprego em Portugal não subiu por causa do aumento dos despedimentos. O desemprego subiu porque as empresas deixaram de contratar trabalhadores. Empresas e trabalhadores fizeram um enorme esforço para manter os postos de trabalho. Temos que lhes dar os parabéns.
As medidas de estímulo ao emprego são exigentes. Devolvem às empresas e aos trabalhadores a responsabilização pelas suas decisões.
Propomos, uma redução do âmbito dos contratos a prazo – o maior flagelo do nosso mercado de trabalho –, o agravamento da taxa contributiva para as empresas com rotação excessiva de trabalhadores e um novo procedimento conciliatório que aumente a transparência na cessação da relação laboral. Mas propomos, também, um desagravamento fiscal, nomeadamente no IRS e nas taxas contributivas para a Segurança Social, aliviando restrições de liquidez de empresas e trabalhadores.
Apresentamos aqui um conjunto de propostas concretas e rigorosas. Que criam emprego, ao mesmo tempo que reduzem a carga fiscal e o peso da despesa pública.
As pensões em Portugal são baixas. Porque os salários são baixos e foram cortados. Porque as trajetórias contributivas são instáveis e cada vez mais precárias.
Os cortes salariais têm um impacto permanente no valor das pensões. Quatro anos a ganhar menos 30 euros por mês (um corte de 5% num salário de 625 euros) reduz o valor total da pensão em 8400 euros. Mas se o mesmo trabalhador tiver um período de desemprego de quatro anos, mesmo que continue a receber proteção social, a quebra do valor total da pensão atinge 22000 euros. Estes são os números do flagelo social que a queda de 40% das contratações, o aumento da duração do desemprego e a generalização dos cortes salariais provocaram nas pensões dos portugueses, sem que de tal NOS tenham dado conta. As duas medidas de redução da taxa contributiva por si só permitem um ganho de remuneração. É esta a valorização que propomos e que se opõe aos cortes observados nos últimos quatro anos.
Estas medidas garantem uma participação ativa de Portugal na construção da área do euro e um Orçamento do Estado mais sustentável, porque há mais portugueses a contribuir e porque essas contribuições são mais equitativas.
A redução do desemprego não é uma garantia, é o resultado de políticas. É o resultado do aumento do investimento, desde logo em novas contratações. Com apoio à inovação, com maior eficácia na utilização dos fundos europeus, com redução da carga fiscal de empresas e trabalhadores, ao mesmo tempo mais amiga do trabalho.
A redução da pobreza não chega na forma de um subsídio. Resulta de uma fiscalidade que eleva o rendimento dos mais pobres, aumentando ao mesmo tempo a coesão social. De um esforço de empregabilidade dirigido aos mais desfavorecidos no mercado de trabalho.
Uma palavra final para a Administração Pública. Um Estado com sucesso necessita de uma Administração Pública forte, eficaz, técnica e socialmente. A destruição da autoestima, do rendimento e das condições de trabalho na Administração Pública tem que ser parada. Os Centros de Competência têm que ser dinamizados.
Hoje, devemos refletir. Para perceber que a inação gera a estagnação económica. Em que o desemprego desce, porque se emigra. Em que o emprego cresce, porque se precariza. Em que as pensões se atualizam, porque são cortadas.
Hoje, estamos aqui porque queremos mudar Portugal. Para afirmar uma alternativa. Para mostrar que a solidariedade não é uma palavra esquecida. Não devemos perder esta oportunidade.