Temos poderes na União Europeia e temos que os exercer
Defendendo que o Tratado Orçamental foi feito para “criminalizar o socialismo e a social-democracia”, Pacheco Pereira afirmou não ter dúvidas de que a ideia de socialismo não existe nem mesmo no projeto político do PS, e “muito menos neste neo-PSD” que, segundo afirmou, “há muito que abandonou qualquer ideia ou princípio que se possa assemelhar a políticas sociais-democráticas”.
No PS, salientou, existem hoje, indiscutivelmente, com o Governo de António Costa, políticas de centro-esquerda, designadamente através de medidas que apontam para a reversão de políticas assumidas pela anterior maioria, “conseguiu mesmo já recentrar as políticas”, mas depara-se com esse facto intransponível de ter assinado e “aceitado as regras do Tratado Orçamental” que o impede de avançar com políticas que sejam verdadeiramente de cariz socialista.
Para Pacheco Pereira o Tratado Orçamental mais não representa do que uma barreira e um obstáculo “às políticas tradicionais de socialistas e sociais-democratas”.
Lembra a propósito os enormes obstáculos que o Governo do PS enfrentou assim que apresentou em Bruxelas um programa de valorização dos rendimentos dos trabalhadores e de aumento do seu poder de compra, tendo-se deparado, de imediato, com a “exigência dos burocratas de Bruxelas com a obrigação do Executivo português de aumentar os impostos”.
Para o ex-dirigente social-democrata, o que isto vem provar é que nem o Parlamento nem o Governo português “têm autonomia” ou capacidade política para enfrentar os burocratas da União Europeia e decidir os assuntos orçamentais que “só a nós dizem respeito”.
Mas se este cenário não fosse já “muito criticável”, segundo Pacheco Pereira, então o que dizer da anterior maioria de direita que decidiu mexer e alterar de forma radical um conjunto vasto de políticas que estavam na base do percurso da democracia portuguesa, tendo-o feito “sem consultar ninguém” e em “cumplicidade com os burocratas de Bruxelas”, dando como exemplo o que se passou em relação ao chamado caso Banif.
Lamentou, por isso, que Portugal não seja, “como devia ser”, gerido por políticos eleitos pelo povo, mas por “funcionários da União Europeia”, situação que em sua opinião “esvazia o voto popular”, tornando-o “quase inútil”, o que permite à Europa “impor as suas políticas”, que normalmente são “de cariz punitivo”.
Pacheco Pereira referiu-se ainda ao papel das empresas portuguesas, defendendo que o verdadeiro problema que enfrentam não é o da luta dos trabalhadores por melhores salários, “mas da má gestão de que têm sido vítimas”, lembrando que a desigualdade é o que separa as águas, não só em Portugal, mas na Europa, entre os que aceitam as desigualdades como uma inevitabilidade e os que não a aceitam.
Voltar a olhar para a centralidade do Estado
Também a ex-deputada do BE, Ana Drago, interveio neste debate, para defender que o “socialismo democrático nasceu como contraponto ao comunismo”, sustentando que interessa hoje analisar, numa Europa dominada por políticas “cada vez mais radicalizadas à direita”, que contributo é que o socialismo democrático é ainda capaz de dar para consolidar a democracia e fazer frente à ideologia dominante na União Europeia, protagonizada por uma direita radical que tem vindo a inverter “paulatinamente” o legado deixado pelo socialismo democrático.
Para Ana Drago, importa saber que benefícios podem ainda os trabalhadores e a classe média europeia esperar das propostas políticas dos partidos socialistas e sociais-democráticos e que espaço ainda dispõem hoje para imporem os seus princípios políticos, manifestando apreensão em relação ao futuro da Europa, dominada por políticas “pouco ou nada interessadas nos valores da social-democracia e do socialismo democrático”,
Segundo Ana Drago, o socialismo democrático está hoje “refém das políticas neoliberais que dominam a Europa”, uma política que, garante, é dominada por uma direita extremamente agressiva, sendo que a questão que se coloca, como referiu, é saber que respostas os partidos socialistas e sociais-democratas serão efetivamente capazes de desenvolver para responderem às “verdadeiras ambições e necessidades das populações”, contrapondo alternativas que impeçam que a direita continue a “cavalgar” em pressupostos que, tarde ou cedo, vão acabar por destruir “esta União Europeia”.
Ana Drago criticou ainda o imbróglio em que a UE se deixou envolver, “com a cumplicidade da esquerda europeia” onde predominam as sucessivas “negociações e renegociações” sem se chegar a parte nenhuma, apelando ao PS e aos partidos sociais-democratas europeus para voltarem a olhar para a “centralidade do Estado e para as políticas de emprego e para a economia”, defendendo que a aposta da direita, ao ter criado elites económicas para “alavancar o desenvolvimento”, teve como única consequência, uma acentuada regressão na qualidade de vida das populações, empurrando o Estado para um papel secundário e pouco determinante, apelando a socialistas e sociais-democratas para que definam e esclareçam “sem ambiguidades” quais as estratégias e políticas que defendem para a Europa.