À saída da reunião que manteve, ontem à tarde, em Lisboa, com chefe do executivo, o líder socialista reafirmou a disponibilidade do partido para um entendimento construtivo, mas avisou Montenegro que esse caminho exige respeito pelos princípios democráticos e pelas responsabilidades de cada força política.
“Foi transmitido ao senhor primeiro-ministro que, se quer o diálogo com o PS, é com o PS que deve dialogar”, afirmou, salientando o papel histórico desempenhado pelo partido na edificação da democracia portuguesa, porque “o PS não é um partido qualquer”.
A audiência, que decorreu na residência oficial do primeiro-ministro foi, nas palavras do Secretário-Geral, “muito construtiva”, com “matérias para consenso e matérias para dissenso”, deixando em aberto, para setembro, novas conversações sobre temas estruturais para o país.
José Luís Carneiro traçou, assim, uma linha divisória clara entre áreas onde é possível encontrar entendimento — como a política externa, a defesa, a justiça ou a reforma do Estado — e outras em que o PS manterá uma oposição firme: “as questões da saúde, habitação, legislação laboral, as formas como se respondem às preocupações das pessoas e ao aumento do custo de vida”.
Uma das críticas mais incisivas do líder socialista visou as propostas do executivo em matéria laboral, com José Luís Carneiro a destacar, com preocupação, a tentativa de prolongar os contratos a termo, particularmente no caso dos mais jovens.
“Preocupa-nos o prolongamento dos contratos de seis meses para um ano e de dois para três anos”, afirmou, defendendo antes “a contratação coletiva e o trabalho com dignidade e justamente remunerado”.
Portugal não pode ficar para trás no reconhecimento da Palestina
Outro ponto abordado no encontro com Montenegro foi a questão da Palestina, uma matéria sensível na qual o líder do PS apelou ao envolvimento ativo de Portugal na defesa de uma “solução justa e humanitária”.
“Não pode este assunto ser tratado com insensibilidade”, frisou, defendendo que o país “acompanhe os esforços que estão a ser feitos por outros estados com vista a podermos reconhecer a Palestina”.
Apesar das divergências, José Luís Carneiro não deixou de apontar áreas em que as propostas socialistas encontram abertura por parte do executivo.
Na defesa, tema que o levou a enviar uma carta a Montenegro no início de julho, o Secretário-Geral adiantou que a proposta do PS sobre este setor “está a ter o melhor acolhimento”.
“O Governo encetará um diálogo com os partidos com assento parlamentar, particularmente com o Partido Socialista, para explicitar o modo como alcançaremos os 2% de investimento e como é que, no futuro, há a previsão de garantir que o investimento previsto para a defesa possa contribuir para o desenvolvimento da economia do nosso país, para a modernização do nosso tecido científico e para a criação de emprego qualificado”, indicou.
Já na saúde, lembrou a proposta para uma unidade de coordenação de emergências hospitalares, enviada a Montenegro a 16 de julho, e revelou que já está a ser trabalhada.
“Foi-me transmitido que já há uma equipa a trabalhar” nesta ideia do PS “para garantir que ela possa ter prosseguimento”, relatou o líder socialista.
E a propósito de habitação, insistiu na necessidade urgente de responder à crise, particularmente em situações de emergência como as que recentemente vieram a público na Área Metropolitana de Lisboa.
Neste ponto, o Secretário-Geral do PS recordou a existência de uma lei de 2021 sobre alojamento temporário, sustentando ser importante “dar força a essa estrutura normativa com financiamento”.
Para além das respostas imediatas, reiterou a importância de avançar com soluções de médio prazo, como “habitações modulares” e programas de habitação a custos controlados.
Lei da Nacionalidade: Tratamento justo e recíproco para a CPLP
Sobre a revisão da Lei da Nacionalidade, José Luís Carneiro reconheceu haver ainda condições para dialogar com o Governo, faltando “perceber em que termos é que há abertura para que esse diálogo possa existir”.
Acrescentou ser fundamental, neste domínio, assegurar um tratamento diferenciado para os países da CPLP, com base na reciprocidade.
E deixou ainda uma nota sobre a Lei dos Estrangeiros, recordando que a posição do PS coincide com a do Presidente da República, que remeteu o diploma para o Tribunal Constitucional.
“Aguardamos agora a decisão do tribunal”, afirmou o líder do PS.
Quanto ao acordo comercial entre a União Europeia e os Estados Unidos, salientou mais uma vez que é preciso de preparar o país, reiterando a sugestão de serem constituídas equipas técnicas transversais, “capazes de avaliar impactos, antecipar riscos e criar oportunidades” para apoiar as empresas, “tal como foi feito no Brexit”.
Questionado sobre o próximo Orçamento do Estado, José Luís Carneiro foi direto: “não foi objeto de qualquer conversa”.
Todavia, vincou que o PS acompanhará atentamente o rumo das propostas do executivo na rentrée política.