PEQUENOS PASSOS
Trata-se de uma luta diária, que consome energias e tempo, para se conseguirem pequenos avanços, muito aquém do enorme esforço despendido. A lei, recentemente aprovada para assegurar um pouco de equilíbrio de género nos conselhos de administração das empresas públicas e cotadas em bolsa, foi tirada a ferros. Foi preciso calcorrear muitos corredores, vencer muitos obstáculos, realizar muitas reuniões, negociar fórmulas, prazos e percentagens, contar votos, sofrer até ao fim. Pouco antes da votação, tendo em conta o anunciado voto contra do PSD, a contagem das intenções de voto declaradas e previsíveis dava apenas uma vantagem de dois votos.
A luta por uma sociedade paritária é dura, tem muitos e poderosos adversários, incluindo mulheres. Adversários que recorrem a argumentos distorcidos, fragmentados, ilógicos, mas que conseguem apanhar os mais desatentos nas malhas da demagogia.
Em relação ao sistema de quotas, seja na política seja na economia, a lengalenga é sempre a mesma. É uma humilhação para as mulheres. Elas têm mérito para aceder a todos os cargos, pois se até ficam nos primeiros lugares em provas concursais. Se elas são mais do que eles a concluírem licenciaturas, mestrados e doutoramentos, para que precisam elas das quotas? Alegam com hipocrisia os adversários da igualdade de género. A resposta é óbvia. Precisamente porque não se acede por concurso aos lugares onde reside verdadeiramente o poder. Precisamente porque as mulheres têm habilitações académicas, capacidades e competência para exercerem as mais altas funções, mas encontram o tal “telhado de vidro” que as não deixa progredir. Está, aliás, provado que sem a quota as mulheres terão de esperar várias gerações para terem as mesmas oportunidades dos homens.
Há dias, o Luís Aguiar-Conraria (LA-C) escreveu um interessante texto no Observador sobre a vantagem das quotas. Não se limitou a opinar. Referiu factos e dados. E tirou conclusões sustentadas em estudos concretos e bem identificados. Sobre os resultados na política, escreve o articulista: “a conclusão foi de que a imposição de quotas levou a um aumento considerável da qualidade dos políticos eleitos. Essa melhoria deveu-se essencialmente ao facto de políticos (homens) medíocres terem sido substituídos por mulheres mais competentes. Ou seja, ao contrário do temido por muitos, as quotas, em vez de promoverem a incompetência, tiveram como principal efeito afastá-la”. E, no sector empresarial, o que revelam os estudos citados por LA-C? “O receio de mulheres incompetentes não se confirmou. O principal efeito foi o de substituir os homens menos experientes por mulheres nos Conselhos de Administração. Adicionalmente, fazendo mais alguns testes, puderam verificar que não houve especiais dificuldades de recrutamento de mulheres competentes. Elas estavam lá, profissionalmente preparadas para serem promovidas. Simplesmente, não o eram. As quotas vieram alterar essa realidade”. Mais palavras para quê?