O poder potestativo
Os comentadores dividiram-se: dos económicos apenas um, conotado com a lapa no rochedo do PSD, manifestou um entusiasmo zeloso. A maior parte dos gurus receia a lavagem de roupa suja, mesmo que não haja roupa para lavar. Nos media, certamente a necessidade de grandes temas fez quase unanimidade, no acordo com o inquérito potestativo.
O melhor teste que se pode fazer à oportunidade da iniciativa será perguntar ao PSD se, estando ele a governar, teria também a mesma atitude de impor ao Parlamento um inquérito potestativo sobre tema tão divisivo e de tão imprevisíveis consequências para a paz dos caminhos. Na verdade, no momento em que repõe na Caixa o contador a zeros, qual a vantagem em remexer num passado tido por inenarrável, mas certamente mais prosaico do que se pensa? Nada melhor para lançar a dúvida em Bruxelas e no Banco Central que entrar no teatro anatómico para autopsiar um ser vivo com século e meio de história pública. Dizem-me que autópsias destas se fizeram já a três bancos. Responderei que os três eram cadáveres e apenas ressuscitaram por cuidados muito intensivos por parte dos governos. Autopsiar um ser vivo será como fez Pedro o Cruel, arrancar o coração pelas costas aos assassinos de Inês, com eles em vida. Reconheço o exagero da metáfora, mas os tempos de acalmia marcelina, não se coadunam com a violência mediática de uma oposição à espera de cada momento para fazer prova de vida. Mesmo que seja esfaqueando um ser vivo institucional.
Como classificar esta proposta? Não basta a palavra desconcerto. É mais do que isso. Além da óbvia falta de imaginação, a emulação dos jovens turcos do PSD para com Mortágua de bom juízo demonstra que nada os poderá deter numa esperada escalada escatológica. As ideias não se combatem com ideias, mas com processos de inquérito. A luta é pela disputa de tempo e atenção dos media. Claro que, esgotado o Europeu de futebol, que mais poderíamos ter, no Outono, para longas tardes nos canais por cabo?