Pátria partilhada
Mas a França é o país onde trabalham, estudam e vivem cerca de um milhão de Portugueses. Paris já não é de há muito o bidonville dos Portugueses, os nossos compatriotas já não são apenas conhecidos como bons canteiros e boas porteiras. Temos autarcas, académicos, intelectuais, cientistas e gestores em França, em postos da mais alta responsabilidade ou gozando de um prestígio de nível europeu. Bem sabemos que pela força dos argumentos da língua franca, o francês já não é a nossa primeira língua estrangeira, que a literatura, o audiovisual, as artes liberais se explanaram com criatividade nas Ilhas, nas Américas, na Ásia e nas Áfricas, que o pensamento único dos neoliberais empedernidos molda atitudes de menor respeito para com a pátria da revolução que destituiu o antigo regime e abriu as portas à declaração dos direitos do homem e do cidadão. Mas a França será sempre a França. Mesmo esta expressão tão banal chegou a ser vilipendiada e truncada na declaração do Presidente Juncker, omitindo os considerandos relativos ao esforço financeiro extraordinário que a França tem que assumir para fazer face, em nome e defesa de todos nós, ao terrorismo sem pátria nem sentido.
Temos que contribuir para repor o lugar da França no mundo e sobretudo no mundo dos valores, dos direitos, das causas, dos espíritos. No mundo que é o nosso. Temos que resistir à materialização do futuro, à financeirização dos estados, à obcessão dos défices de ridículas décimas. Temos que resistir ao dedo em riste dos tutores do bom comportamento. E mais ainda, sem rebeldias estultas, temos que mostrar que cumprimos os deveres da cidadania partilhada e da cooperação internacional e regional, sem dobrar a cerviz, nem reservas mentais.
Eis algumas das muitas razões para considerar bem-vindo o Presidente Hollande. Mais ocasiões surgirão para que ele possa, com tranquilidade, gozar a nossa companhia e os nossos primores. Neste momento de tamanha dor e tão grande incompreensão por parte de muitos dos seus concidadãos, devemos acolhê-lo com o brio e a gratidão de quem preside a uma Pátria ferida, partilhada por muitos Portugueses.