Passos Coelho, um politico obcecado pelo poder
A frase mais reveladora desse discurso de Passos Coelho é a seguinte, dirigida a António Costa:
“Julga que, acusando, insinuando, denegrindo o seu antecessor, resolve o seu problema de poder ser visto como quem usurpa o que não conseguiu conquistar por direito próprio e de poder afinal ter ficado apenas com uma réplica da verdadeira fonte de autoridade que precisa de destruir e aniquilar para que a falsificação não seja notada”.
No mais íntimo do seu ser, Passos vê-se ainda como primeiro-ministro e também por isso usa na lapela, qual amuleto, a bandeirinha nacional que mandou fazer quando era primeiro-ministro. Na sua cabeça ainda não entrou o facto de o seu governo ter sido chumbado no Parlamento pela maioria dos deputados democraticamente eleitos. Quando afirma que António Costa lhe “usurpou” o poder e que esse poder não foi conquistado “por direito próprio”, Passos Coelho está a negar ao Parlamento a função que a Constituição lhe atribui de aprovar ou rejeitar o programa do governo. Passos nega, pois, o nosso regime constitucional, ao considerar que a única “fonte de autoridade” do governo emana das eleições. Queria ser primeiro-ministro mesmo depois de o seu programa de governo ter sido rejeitado pelo Parlamento.
O discurso de Passos Coelho é ainda revelador de uma mentalidade mesquinha e antidemocrática quando afirma que o debate político e as diferentes opções do governo de António Costa e as críticas ao anterior governo são uma forma de “aniquilar” e “destruir” a (única e verdadeira) “fonte de autoridade”, isto é, a dele próprio, que nas suas palavras, Costa “falsificou”.
O discurso de Passos Coelho é o de um político obcecado com o poder, que não aceita a realidade. Por isso, não quer discutir o orçamento, nem apresentar propostas de alteração. Não lhe interessa o País nem os portugueses. Interessa-lhe apenas alimentar o rancor contra os “usurpadores” de um poder que era seu e só seu.
Mas o debate do orçamento trouxe novamente à superfície o preconceito da direita contra os partidos à esquerda do PS. A maneira displicente e arrogante como se referem a estes partidos e às suas propostas é reveladora de uma mentalidade anti-democrática, como se tudo o que venha deles e seja aceite pelo PS não fosse tão natural como o PSD ter aceite propostas do CDS e vice-versa, quando ambos estavam coligados.
O “drama” artificial criado pela direita, com apoio de alguns jornalistas, quanto às chamadas “cedências” do governo a propostas do BE e do PCP é mais um sinal do muito que ainda falta para que em Portugal tenhamos uma verdadeira democracia.