Comentando a proposta do executivo comunitário, de um orçamento da União Europeia (UE) a longo prazo até 2034 de dois biliões de euros, acima dos 1,2 biliões do atual quadro, que inclui mais contribuições nacionais e três novos impostos, abrangendo o consumo de tabaco, um recurso empresarial para a Europa e sobre resíduos eletrónicos e o comércio eletrónico, a também correlatora do Parlamento Europeu para o documento notou que se trata de um orçamento “aparentemente” maior, mas que suscita várias reservas.
“Não se pode dizer que se tem um orçamento de um tamanho muito superior quando, por exemplo, lá dentro estão os juros e o pagamento do Next Generation EU [Fundo de Recuperação e Resiliência, que financia os PRR] e quando estamos a falar de um cálculo de preços que não corresponde àquilo que pode tornar o orçamento mais claro”, disse Carla Tavares, falando à imprensa portuguesa em Bruxelas, acrescentando que esta é uma questão que tem de ser clarificada, uma vez “que é diferente quando se fala de preços correntes e de preços constantes”.
Uma segunda questão, notada pela eurodeputada socialista, prende-se com o facto de o Parlamento Europeu defender “uma maior ambição, uma maior flexibilidade, uma maior transparência”, entendendo, contudo, “que é impossível fazer mais com menos ou com o mesmo”.
Em causa, detalhou, está “uma fusão de um conjunto de programas, nomeadamente das áreas da coesão, das áreas associadas ao Fundo Social Europeu, de partes de um programa muito relevante [relacionado com] a agricultura, dentro de grandes planos nacionais”, plasmando uma intenção de reduzir o peso relativo da Política Agrícola Comum e da Política de Coesão, com parte dos montantes a ser canalizado para áreas como segurança ou defesa.
Para a eurodeputada, esta proposta “não serve a Portugal”, principalmente dado o peso dos fundos agrícolas e da coesão no país, com estes últimos a serem responsáveis por 90% do investimento público. Carla Tavares reconhece a necessidade de reforçar a segurança europeia, mas alerta que “o Parlamento também sempre disse, e é unânime, que não pode ser à custa da coesão e da política agrícola.”
“Não defendermos a política agrícola comum, não defendermos as questões da coesão. Põe em causa os valores da União”, alertou Carla Tavares, lembrando que o PE “sempre foi muito claro”, em relação a que “quer a coesão, quer a agricultura se mantivessem autónomos”.
“Nós sabemos que vamos ter um processo muito difícil, mas o Parlamento é uma entidade que merece ser respeitada”, afirmou a eurodeputada, considerando que está em causa “uma atitude de sobranceria da Comissão face ao Parlamento”, que este “também não pode aceitar”, nem pode passar “cheques em branco”.
Carla Tavares alertou também que o novo modelo orçamental reduz o papel do Parlamento Europeu. “Cada vez mais a Comissão tem poderes, retirando ao Parlamento a possibilidade de exercer as suas competências enquanto autoridade orçamental”, advertiu, apontando para um sistema baseado em planos nacionais negociados diretamente entre cada Estado-membro e a Comissão.