Obercom ou a necessidade da investigação
Concentrados que ficamos a olhar para os números e para as letras a negro ou sublinhados que aparecem nas notas explicativas do OE, esquecemo-nos de notar os pequenos pontos que por vezes constroem as grandes linhas.
Aconteceu este ano no debate com o ministro da Cultura e da Comunicação Social. Num debate em que a oposição se amarrou ao orçamento disponível para a cultura, faltou tempo para abordar uma pequena medida, que utiliza uma curta parcela do orçamento, mas que é suporte basilar de qualquer política pública na área dos media.
Refiro-me ao acordo de cooperação estabelecido por este Governo com a Obercom, imprescindível para avaliar políticas públicas na área da comunicação social e poder executá-las de forma sustentada.
A verdade é que não é possível, ou pelo menos desejável, o desenvolvimento de políticas públicas sem conhecer o meio sobre o qual se pretende trabalhar. Daí a necessidade de garantir cooperação institucional com um organismo como a Obercom que faz gestão das atividades de produção, recolha e tratamento de informação estatística e que desenvolve projetos de investigação que possibilitam o melhor conhecimento da área dos media.
Perceber a dinâmica de consumo mediático, o nível de confiança que os cidadãos dão aos conteúdos informativos transmitidos pelos meios tradicionais de comunicação, quais as tendências nacionais de consumo digital, conhecer as dinâmicas concorrenciais de audiências e publicidade na rádio, analisar os perfis de leitores de jornais regionais e locais, fazer o quadro relativo ao desempenho da imprensa em Portugal, ou perceber quais os desafios da TDT em Portugal são alguns dos muitos títulos de trabalhos académicos realizados pelo Obercom.
São esses trabalhos científicos que mais tarde nos permitem estar presentes e colaborar de forma ativa com entidades internacionais como o European Journalism Observatory, contribuindo com dados nacionais no mapeamento dos desafios da comunicação social europeia. Sem eles, não haveria diálogo entre profissionais e investigadores de media internacionais, muitas teses teriam ficado na gaveta e as nossas dinâmicas internas seriam um grande ponto de interrogação.
O que a Obercom faz é trabalho público, divulgando informação estatística e analítica de forma mensal, semanal e anual, fazendo da recolha de dados o seu ponto de partida, mas entregando à sociedade civil e aos decisores políticos, documentos que ativam a consciência crítica e propostas alternativas que podem gerar a mudança.
Em 2014, o Governo de Passos Coelho, ao decidir proceder à extinção por fusão do Gabinete dos Meios de Comunicação Social e integrando as suas atribuições em três organismos diferentes, levou a que a Obercom ficasse numa zona cinzenta, sem referências sobre a entidade a que reportar, ou percebesse quais as opções estratégicas a desenvolver.
Felizmente a solução política governativa encontrada no final de 2015, com a criação do Ministério da Cultura e da Comunicação Social, permitiu recentrar vontades e garantir um plano estratégico, que possibilitou a recuperação de estabilidade no funcionamento da Obercom com o acordo de cooperação agora protocolado entre a instituição e o ministério da Cultura e Comunicação Social.
Numa altura em que a transformação do ecossistema mediático é constante, em que se debate a qualidade da informação que temos, o pluralismo e a diversidade, em que a proliferação das notícias falsas ensombra a legitimidade dos mass media, é preciso garantir aos decisores políticos um conhecimento aprofundado das dinâmicas instaladas na área da comunicação.
Como diz Arthur Conan Doyle:” É um erro capital teorizar antes de conhecer os dados. Insensivelmente começa-se a torcer os factos para adequar às teorias, em vez de teorizar para adequar aos factos”.