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O TERRAMOTO MACRON

O TERRAMOTO MACRON

A vitória nas presidenciais de Emmanuel Macron foi como um terramoto para a vida política e o sistema partidário em França, com consequências que só serão melhor compreendidas em função do resultado das eleições legislativas de 18 de Junho. Mas tal como acontece com os terramotos violentos, é inevitável que depois do abalo se inicie o processo de reconstrução.

Opinião de:

O TERRAMOTO MACRON

Após a sua ascensão meteórica e apesar de não ter estrutura consolidada no terreno, conseguiu antecipar-se aos outros partidos e movimentos na apresentação das listas candidatas às legislativas. E, depois dos estragos que causou no PS, agora escolheu um primeiro-ministro, Edouard Phillippe, para deixar também em cacos os Republicanos. 

Percebendo o pulsar da sociedade francesa descontente com o sistema político-partidário, colocou-se acima dos partidos, manifestando agora uma surpreendente capacidade para sugar apoiantes de todos os quadrantes políticos, particularmente à esquerda e à direita, sem estados de alma, determinado em criar algo novo no panorama político francês.

O que mais uma vez revela um traço da sua personalidade, não só a sua determinação e capacidade de persuasão, mas acima de tudo a facilidade com que gera empatia à sua volta, característica que não deve ser menosprezada, sobretudo tendo em vista os tempos difíceis da governação que terá de enfrentar. Mas a ver vamos se o fenómeno Macron não será como o PRD em 1986 que subiu muito alto para se estatelar de seguida com um estrondo proporcional às alturas a que tinha subido. Para já, o novo Presidente encarna a renovação e a esperança, e há muitos franceses que desejam que ele consiga a estabilidade necessária para realizar o seu projeto de governação. E, a julgar pela sua personalidade e percurso, é muito capaz de continuar a surpreender.

Na linha dos acontecimentos inesperados que marcaram a primeira volta das eleições, merece destaque o episódio infeliz que teve como protagonista o ex-primeiro-ministro socialista Manuel Vals, que se ofereceu triunfalmente para “se inscrever na maioria de Macron”, vaticinando “a morte do PS”, acabando por não abrir a porta que pretendia e fechar a outra de que se distanciou.

Seja como for, para já foi afastado o perigo maior das eleições francesas, que era a vitória de Marine Le Pen, que mesmo assim conseguiu perto de 11 milhões de votos com um discurso de guerra social, de ódio e xenofobia e de completa irrazoabilidade económica. O fenómeno Macron também deixou as suas marcas na FN, que agora também está em convulsão interna. Mas nada garante, no entanto, que não consiga, daqui a cinco anos, alcançar a presidência que agora lhe escapou, sobretudo se forem goradas as expetativas criadas em termos de reformas económicas e sociais, de combate ao desemprego, de alívio da pesada fiscalidade, de criação de coesão nacional e afirmação da França na Europa e no mundo.

 Quanto ao PSF, este é o momento para uma clarificação interna dentro do partido, que precisa de ultrapassar as dissensões fratricidas que têm destruído a sua coesão. Será assim importante que se liberte do trauma da vitória de Macron e da pesada derrota de Hammon, e se reposicione inequivocamente no centro esquerda. Talvez assim o núcleo central socialista fique então mais claro e possa fazer o seu caminho, de forma coesa e construtiva. O PS francês é um dos grandes partidos históricos da esquerda europeia e mundial, que está profundamente enraizado por toda a França a nível municipal, pelo que está longe de estar morto, como vaticinou Vals, para justificar o seu afastamento em relação ao PS. A verdade é que o partido vale muito mais do que os pobríssimos 6,3 % de Benoit Hammon. Mas, claro, o problema de egos tão presente na política francesa terá de ser ultrapassado para que o partido possa ter a consistência e coerência programática que precisa aos olhos dos franceses. 

E o PSF poderá mesmo, eventualmente, desempenhar um papel fundamental como garante da estabilidade política, um pouco a exemplo do que se passa em Portugal com o apoio das esquerdas ao PS, assegurando a governabilidade da França, enquanto aproveita essa fase para se reerguer e reconstruir. 

Mas de momento nada está adquirido. A aritmética parlamentar e os compromissos que as novas lideranças forem capazes de assumir é que vão determinar o futuro da França … E da Europa.