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O que é que os nossos pais alguma vez fizeram por nós?

O que é que os nossos pais alguma vez fizeram por nós?

O PSD radicalizou-se. Esta não é uma afirmação de campanha, é uma constatação comprovável, ainda que nem sempre assumida, chegando até a ser dissimulada, afinal, a PAF agora é pelo social!

Opinião de:

O que é que os nossos pais alguma vez fizeram por nós?

Mas a dissimulação não é ela própria consistente. Veja-se a clareza com que a PAF defende marcas claramente ideológicas no seu programa eleitoral, finalmente divulgado em cima das férias. Este é um programa orgulhosamente distante dos vestígios de social-democracia, mesma na versão suave e peculiar de que o PSD foi protagonista nos últimos 40 anos. A PAF, que é pelo social, pretende chegar lá pela “liberdade de escolha”. Uma liberdade exclusiva daqueles que têm mais. Uma liberdade de poderem escolher contribuir menos para o bolo coletivo. Afinal, porque hão de pagar a reforma de outrem quando nem a sua têm segura?

Ouço isto e penso na minha própria vida. No que seria eu hoje se ao longo das minhas duas primeiras décadas de vida estivesse em vigor esta “liberdade de escolha” na segurança social, na educação, na saúde. Durante mais de duas décadas não paguei impostos, frequentei escolas públicas, usei o SNS. Ninguém teve a liberdade de escolher não me facultar o acesso em paridade a esses recursos que me formaram e permitiram ser quem sou hoje, tendo inequivocamente ascendido em termos sociais. Notem que não me ofereceram um mínimo comum a todos como agora propõe a PAF. Ofereceram-me um máximo que ajudou a anular diferentes pontos de partida e me deu genuína oportunidade de alcançar um bom ponto de chegada. Eu, neto de avós analfabetos, filho de pais migrantes internos, esforçados e empenhados no meu futuro. 

Durante esses mais de 20 anos, os meus pais e outros como eles (incluindo contribuintes da União Europeia!) garantiram-me com os seus rendimentos e impostos tudo aquilo de que precisei, da escola à saúde, passando pela segurança pública e por todas as infraestruturas e serviços coletivos municipais e nacionais de que direta e indiretamente beneficiei. Como estarão as minhas contas do deve e haver, eu, que hoje estou entre os 20% que mais recebem no país? Um país onde o salário médio ronda os €900/mês, recorde-se. Em que posição estará o saldo da minha solidariedade intergeracional? Eu que, se a PAF vier a governar, passarei provavelmente a ter “liberdade de escolha”. 

Dito isto, convinha que o PS tirasse mais e melhores ilações do que temos em jogo. Infelizmente vejo demasiados camaradas a terem dificuldades em se adaptarem a esta nova geometria e a continuarem a fazer política como se estivéssemos em 1980. Se o PSD se desvia para a direita, o PS não tem que ir atrás mudando o centro. Business as usual ? Não! 

Há aqui lições que o partido devia estar a ajudar os portugueses a tirarem e não a ignora-las. Felizmente é isso que o nosso Secretário-geral tem feito e é algo que todos devíamos fazer, não por obrigação conjuntural mas como produto de uma análise do tempo que vivemos. O cenário mudou e quem não tiver densidade política quanto baste vai paga-lo, caro. A curto e, principalmente, a médio prazo. É esse o desafio. Em Portugal e não só.