O açúcar e a ciência que foi silenciada
Uma das consequências deste artigo e da subsequente publicação, em 1980, das primeiras recomendações dietéticas do governo federal americano, foi a aposta draconiana na alimentação com baixos níveis de gordura. Alimentos esses que frequentemente tinham níveis aumentados de açúcar para os tornarem mais saborosos. Uma aposta que dominou a indústria alimentar até há bem pouco tempo. Ainda me lembro de ouvir dizer que tudo o que fosse crispy, crunchy or creamy com baixos níveis de colesterol e … doce, seria certamente um sucesso de vendas.
Foi só muito recentemente (em 2015) que as recomendações dietéticas finalmente enfatizaram fortemente a necessidade de reduzir o consumo de açúcar na prevenção de doenças cardiovasculares. Não admira, portanto, que o tema do açúcar na alimentação dos jovens (e não tão jovens) tenha passado a ter tanta visibilidade na atualidade.
O que é chocante é sabermos hoje que os professores de Harvard que, em 1967, publicaram o artigo acima referido, foram financiados pela Sugar Research Foundation da época, para propositadamente minimizarem a importância dos estudos já existentes nessa altura, sobre os riscos cardiovasculares do consumo elevado de açúcar.
É importante (e grave) percebermos de que forma, interesses financeiros conseguiram determinar o conteúdo de artigos publicados numa das mais importantes revistas da área da saúde, com autores que eram professores de uma das mais prestigiadas universidades do mundo. E como esses artigos influenciaram de forma negativa toda uma agenda de investigação tão relevante na área cardiovascular e durante tanto tempo. A ênfase sobre as gorduras saturadas e o colesterol desviou, intencionalmente e durante décadas, as atenções sobre o açúcar.
Não admira que os investigadores de hoje sintam uma pressão cada vez maior para declararem as suas fontes de financiamento. Não resolve todos os problemas, mas suspeito que, se os autores do artigo acima referido tivessem declarado as suas fontes de financiamento, talvez o impacto desse trabalho sobre a agenda da nutrição tivesse sido menor.
(Baseado num artigo de Laura Beil na Science News Magazine de 15 Out 2016)