Muitos anos de vida
De facto, a CRP de 1976 é a primeira constituição portuguesa a libertar-se da maldição de vida efémera das constituições democráticas anteriores. Até agora, das seis constituições portuguesas em quase dois séculos, só as duas constituições “outorgadas”, a Carta Constitucional de 1826 e a Constituição do Estado Novo de 1933, tinham vencido o teste do tempo.
Esta é a primeira marca distintiva da CRP de 1976, que presidiu durante estas quatro décadas a um regime democrático estável, sem ruturas nem perturbações da ordem constitucional. Não é pequeno feito na nossa atribulada história constitucional.
2. Em segundo lugar, trata-se sem margem para dúvidas, da mais avançada das constituições portuguesas, quer em termos democráticos, quer quanto aos direitos fundamentais (incluindo os direitos sociais), quer no respeitante às descentralização local e regional.
Pela primeira vez, Portugal constitui um Estado de direito democrático e social que não perde no confronto com nenhuma outra constituição europeia. Estado constitucional, república constitucional, democracia constitucional – eis conceitos que a CRP de 1976 tornou realidade para os cidadãos comuns.
3. Em terceiro lugar, a CRP de 1976 é a primeira Constituição dotada de um efetivo sistema de fiscalização da constitucionalidade, a cargo especialmente do Tribunal Constitucional, o que lhe confere uma efetividade que nenhuma outra teve entre nós.
Como Lei Fundamental, a CRP de 1976 tornou-se efetivamente no padrão de referência da organização e funcionamento dos poderes públicos e de toda a ordem jurídica.
4. Quatro décadas decorridas e apesar das diversas revisões, que alteraram substancialmente alguns capítulos constitucionais (nomeadamente a “constituição económica”) e constitucionalizaram a integração na União Europeia, a CRP mantém incólumes os seus traços originários essenciais, tal como expressos nos princípios fundamentais introdutórios e nos limites materiais de revisão (art. 288º). Nada permite recear que esse “núcleo duro” da CRP de 1976 alguma vez venha a ser posto em causa.
5. Há milagres que nem as constituições bem sucedidas conseguem. Por um lado, nenhuma constituição consegue realizar-se a si mesma: são precisas políticas determinadas a isso. Por outro lado, nenhuma constituição pode impedir que os governos aproveitem a sua liberdade política para prosseguir más políticas.
Todavia, além de cumprir a sua incontornável missão de assegurar o funcionamento das instituições democráticas, a CRP de 1976 tem também sido capaz de impedir ou dificultar as políticas anticonstitucionais e de favorecer ou estimular as políticas mais amigas da Constituição.