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ELAS CONTINUAM A SER ASSASSINADAS POR ELES

ELAS CONTINUAM A SER ASSASSINADAS POR ELES

Maria, 56 anos, conseguiu finalmente pôr fim a 34 anos de violência doméstica. Foram os filhos, adultos e emigrantes, que a convenceram. Sem eles por perto, como poderia evitar o pior?

Opinião de:

ELAS CONTINUAM A SER ASSASSINADAS POR ELES

Muitas vezes pensara acabar com «o inferno diário de violência física e psicológica», mas faltara-lhe sempre a coragem para dar o último passo. A educação que recebera inibia-a. Tinha vergonha do que diriam a família, os amigos e vizinhos. Abandonar a sua casa era impensável para esta beirã a residir na cidade. Receava também que ele cumprisse as frequentes ameças de morte caso apresentasse queixa às autoridades ou contasse a alguém. Foram anos e anos de solitário e silencioso sofrimento. Tudo fazia para que os filhos se não apercebessem do que o pai fazia quando, altas horas, chegava a casa embriegado. Sufocava os gritos de dor e disfarçava as marcas. As idas ao hospital eram justificadas pela sua propensão para embater nos obstáculos e para dar aparatosas quedas que ninguém da família presenciava. 

O drama de Maria é idêntico ao de milhares de mulheres portuguesas de diferentes idades, profissões e níveis socioeculturais, porque a violência doméstica é um fenómeno transversal. E, apesar de ser crime público desde 2000 (por iniciativa do PS), rara é a semana em que não há notícia de uma mulher assassinada por atuais ou ex-cônjuges, companheiros ou namorados.

Este ano, no nosso país, já morreram vinte e sete mulheres num contexto de relações de intimidade. Em 2014, quarenta e duas mulheres foram assassinadas e mais quarenta e sete foram vítimas de homicídio na forma tentada. Nos últimos dez anos, foram brutalmente assassinadas 398 mulheres que deixaram uma vida por viver. Entre 20112 e 1014, foram 229 os filhos que ficaram sem mãe e 112 ficaram órfãos. Uma média de três mulheres por mês são assassinadas por eles. Por aqueles com quem partilham a casa, a mesa e a cama. Pelos pais dos filhos. Por aqueles que as deviam respeitar e amar, assim o juraram, e com elas partilhar as alegrias e as tristezas de uma vida em comum. Algumas dessas mulheres foram mortas à frente dos filhos, outras morreram tentando protegê-los e outras ainda morreram com eles.

No dia internacional pela eliminação da violência contra as mulheres, é preciso recordar sublinhar que a violência contra as mulheres representa uma grave violação dos direitos humanos. As mulheres vítimas de violência são obrigadas a prescindir de liberdades fundamentais e ficam vulneráveis a novos abusos. E têm mais probabilidades de terem filhos doentes, de sofrerem perturbações emocionais e de recorrerem ao suicídio. 

O que explica que uma mulher permaneça numa relação violenta? Há várias razões, muitas vezes, cumulativas: medo de prejudicar ou perder os filhos; ausência de recursos económicos; crença de que o agressor vai mudar; sentimento de culpa; falta de apoio da família; vergonha dos amigos e familiares. É, pois nestas áreas, que as políticas de prevenção devem incidir. Combater a violência doméstica é um dever. Como disse Ban Ki-Moon, Secretário-geral da ONU, “existe apenas uma verdade universal, aplicável a todos os países, culturas e comunidades: a violência contra as mulheres nunca é aceitável, nunca é perdoável, nunca é tolerável”.