Efeméride do trimestre
Mas em cem dias muito se passou em Portugal. Sobretudo lá fora, na Grécia e em Bruxelas, onde pela primeira vez a vida nacional é influenciada de modo decisivo de fora para dentro. O governo da Grécia, brincando a aprendiz de feiticeiro, convenceu-se de que o apreço mediático e o bluff substituíam uma política consistente, mudando os dados injustos e imorais em que nos movemos. Andou quase sempre a cantar a solo e à capela. Mas foi a solidariedade socialista que, nos derradeiros momentos, ainda lhe deitou a mão e o trouxe a bordo, evitando um afogamento de proporções imprevisíveis. Com o fogo não se brinca. Por muito injustos e indecentes que sejam os pirómanos que lentamente o atearam, asfixiando as franjas da Europa, não se luta sozinho contra um incêndio de grandes proporções.
Por cá, em noventa dias confirmou-se o rumo de navegação aos bordos deste governo. Tentando restaurar o irrestaurável, ou seja, a confiança do povo, desdobrando-se em bónus e promessas. Já vai tarde. Não existe uma segunda ocasião para causar uma primeira boa impressão. Passos oscila e na falta de melhor, dispara em várias frentes: vem de Bruxelas e gaba-se de ter desbloqueado uma decisão difícil. Quantas vezes Guterres foi a luz ao fim do túnel de infindas discussões, sem jamais vir aos compatriotas gabar-se do feito. Passos devia saber que “presunção e água benta, cada um toma a que quer” mas também que não adianta elogio em boca própria. É vitupério. Mas pior, Passos continua a ter interpretações próprias dos factos, tentando vender como verdade o que entra pelos olhos dentro como mentira. Os números do desemprego são um bom caso psiquiátrico. A forma como tentou apresentar o inapresentável, deixou os seus seguidores pouco à vontade, como se viu nos media. Passos deve ser dos que pensam que, se uma mentira várias vezes repetida se transforma em verdade, várias mentiras repetidas se transformariam num programa de governo. Deve acreditar que um bom lote de promessas tardias e tão ocas que todos se perguntam porquê só agora, substitui a incapacidade da coligação apresentar propostas sérias. Ele sabe que não e ao insistir demonstra que a mentira se lhe agarrou à pele, de tal forma que já não a consegue sacudir.