E o Futuro? Inteligente e Sensível
Um mundo que cria mais muros que pontes, especializou o conhecimento e perdeu a noção da totalidade. Um mundo em que o diálogo é ainda considerado um sinal de fraqueza, onde só nos pedem para estarmos ao lado do bom contra o mau, do branco contra o preto, do cowboy contra o índio, esquecendo-se que ser inteligente é ter a capacidade de interligar, de fazer pontes, de criar novas combinações.
Num estudo publicado em 2012, os professores Andre Spicer (da Cass Business School – City University de Londres) e Mats Alvesson (da Universidade de Lund, na Suécia), referem que a cultura da estupidez estaria na origem da crise financeira da City e que a utilização da totalidade das capacidades intelectuais, da inteligência dos seus funcionários, em estruturas e instituições onde o conhecimento tem um lugar privilegiado, é sistematicamente desencorajada em tempos de crise. “Não pense sobre isso, faça” é a postura desenvolvida, onde a reflexão sobre as questões chatas e inoportunas é sistematicamente desencorajada, numa cultura organizacional a que os autores do estudo chamam de “estupidez funcional”. Quando o modelo de gestão evita toda a forma de confrontação, de troca de ideias e de perspetivas, quando impede que se reflita profundamente sobre cada projeto, está-se a privar do que é a essência do conhecimento, bloqueando a ação e impedindo que se saia do caminho traçado, que se pense “fora da caixa”. A estupidez “inteligente” provoca a instabilidade e a esterilidade da vida intelectual, e, não sendo uma doença mental, não é menos perigosa que a mais perigosa das doenças do espírito porque ameaça a própria vida. Tal como aconteceu nos finais da década de trinta em plena ascensão do nazismo.
Estamos a sair de um tempo pesado, para entrar num tempo que privilegiará a inteligência, a imaginação e a sensibilidade, um novo tempo que irá dar corpo às ideias que começaram a tomar forma nos anos 60. Quase sessenta anos depois das grandes mudanças anunciadas, hoje podemos intuir que algo está a emergir e a ganhar forma, possivelmente algo de que Agostinho da Silva já falou, está a emergir um tempo em que, com a riqueza e o saber que a sociedade já atingiu, se chegue a um ponto em que haja tudo para todos, tal como na Ilha dos Amores, que Camões tão bem contou nos Lusíadas. Um tempo em que a economia será uma recordação do passado, como queriam os tais portugueses do século XIII, onde o Homem possa passar à sua verdadeira vida que é a de contemplar o mundo, de ser poeta do mundo, de tal forma que ninguém se preocupe por fazer tal e tal obra, mas por ser único no mundo. Vamos entrar numa coisa parecida como a que os portugueses e alguns italianos intitulavam de Idade do Espírito Santo, a Idade em que as crianças cresceram tanto que a sua espontaneidade e capacidade de sonhar nunca se extinguisse e um dia fossem capazes de dirigir o mundo.
Para que o futuro ou estes futuros sejam possíveis, para que cada um seja único no mundo, necessitamos urgentemente que os cidadãos do futuro, todos aqueles que já são únicos no mundo e os agentes da mudança, se ponham em marcha, se liguem e se mobilizem por todo o lado, para que todos ouçam, como nos anos 60 foram obrigados a ouvir Martin Luther King, que nós temos um sonho e que o nosso sonho é defender um mundo onde dê gosto e valha a pena viver, onde seja possível ser feliz.
Os sinais da mudança estão por todo o lado, saibamos ser capazes de surfar as ondas da crise e olhar para além dos horizontes limitados em que nos querem confinar.
É a hora.