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Descentralizar, faz sentido

Descentralizar, faz sentido

Os portugueses anseiam por melhores condições de vida e sentem-se cada vez mais distantes em relação ao poder. Este sentimento explica-se em grande medida pelo mau desempenho económico da governação e pelo sentimento de profunda injustiça social que lhe está associado. Mas não podemos ignorar que, além de mudança de política económica e social, os portugueses exigem mudanças institucionais que lhes tragam outros meios de escrutínio e participação. Aliás, sem boas instituições democráticas dificilmente teremos boas políticas e boas performances económicas.

Opinião de:

Descentralizar, faz sentido

Uma dimensão importante das reformas institucionais que temos de realizar diz respeito à descentralização administrativa. Há que reforçar a eficácia das políticas públicas com mais proximidade democrática. Desse ponto de vista a experiência recente da Câmara Municipal de Lisboa pode constituir um exemplo inspirador. 

A legislação de novembro de 2012, que aprova a nova organização administrativa de Lisboa, abriu caminho à maior operação de descentralização administrativa que tivemos desde 1976. 

Os órgãos municipais deliberaram, com base num consenso político alargado, e enviaram uma proposta à Assembleia da República, que por sua vez respeitou integralmente a autonomia do poder local e o sentido da iniciativa que lhe havia sido submetida. 

Depois das eleições de 2013, a câmara dialogou várias vezes com cada uma das juntas de freguesia e com os representantes dos trabalhadores, e deu-se execução à reforma administrativa. 

Estamos a falar de 1280 espaços verdes, 1500 quilómetros de passeios, 100 equipamentos desportivos, 90 escolas, 70 jardins-de-infância, 7 equipamentos culturais, 28 mercados e feiras que passaram a ser diretamente geridos pelas juntas de freguesia de Lisboa. Desde a assinatura em março de 2014 dos autos de transferência, transitaram do município para as juntas 1270 trabalhadores, mais de 700 equipamentos e 350 hectares de espaços verdes. 

É hoje unânime que se tratou de uma mudança para melhor. Trata-se agora de trazer este método de diálogo político e esta dinâmica reformista para o centro da ação governativa nacional. É preciso alargar esse processo de descentralização a outras dimensões críticas: as instâncias territoriais intermédias e supramunicipais, como as CCDR e as juntas metropolitanas, carecem de uma maior legitimidade democrática para poderem exercer de forma eficaz novas competências; e as grandes câmaras municipais, como Lisboa, ao mesmo tempo que delegam funções nas freguesias, devem receber em contrapartida um novo reforço de competências. 

Que sentido faz a Área Metropolitana de Lisboa não participar na política de transportes ou na captação de investimentos? Que sentido faz um município como Lisboa não ter qualquer participação na gestão dos transportes públicos, na administração portuária, nas receitas fiscais do turismo ou no policiamento do trânsito? Nenhum sentido. Justamente: também em matéria de descentralização, precisamos de uma política que faça sentido.