Defesa da escola, ponto. Será mesmo?
Estes pais defendem um ensino de qualidade. E fazem bem, porque os pais dos alunos da escola pública também. Contudo, fazem mal quando desconsideram o trabalho desenvolvido nas escolas públicas e quando aceitam rotular as 1,5% das escolas privadas visadas como as “escolas de qualidade”.
É este argumento que deve levar-nos a questionar sobre esta luta e sobre os seus pressupostos. É este argumento que deve levar-nos a refletir: é justo que o Estado continue a financiar os 1,5% de colégios privados que oferecem uma oferta educativa redundante, em detrimento de toda a restante oferta pública existente?
Onde esteve a comoção deste movimento na defesa das escolas públicas que durante os últimos anos se têm deparado com inúmeras dificuldades? Como justificar que existam escolas como a de Oliveira do Hospital que ainda tenham coberturas de amianto nos seus edifícios e tal nunca tenha merecido qualquer menção por quem hoje se indigna com o fim dos contratos de associação? Como justificar que algumas das escolas mais emblemáticas do concelho de Coimbra não mereçam a mesma energia na defesa de obras de requalificação? Como justificar que o financiamento a apenas um colégio privado do Norte do país seja praticamente equivalente a todo o montante disponível para as obras de requalificação de todas as escolas públicas?
Como justificar o argumento da “liberdade de escolha” quando um aluno não tenha, na sua área de residência, uma única escola pública e tenha que frequentar uma escola privada não por opção mas, sim, por falta dela? E não é este o argumento que deveria motivar a que as atividades extracurriculares das escolas com contrato de associação fossem também todas elas gratuitas, ao invés de serem pagas a peso de ouro como acontece em alguns casos?
Não é o argumento do desemprego e dos despedimentos de professores das escolas com contratos de associação o mesmo que deveria ter motivado a que se manifestassem em solidariedade na defesa dos desempregados da escola pública?
Não é o argumento da justiça social um pouco difícil de aceitar quando o Estado financia escolas com contratos de associação em zonas em que a sua oferta educativa é redundante, duplicando custos, para financiar escolas que, em alguns casos tinham, segundo o estudo de António Rochette, menos de 2% dos seus estudantes abrangidos pelos escalões A e B da Ação Social Escolar?
As escolas com contratos de associação não são todas iguais, é certo – e concede-se que possam existir casos pontuais em zonas periurbanas dignos de análise.
Todos os pais têm o direito a desejar o melhor para os seus filhos. E todos os pais têm o direito de querer que os seus filhos tenham a melhor educação de todas. Contudo, ao Estado cabe criar condições de equidade para que todos possam ter acesso a uma educação de qualidade e não perpetuar injustiças sociais e ineficiências na alocação de dinheiros públicos. Cabe ao Estado governar segundo critérios universalmente aplicáveis. Cabe ao Estado não criar condições de privilégio para 1,5% das escolas privadas e muito menos para escolas onde 98% dos seus alunos não sejam abrangidos pela Ação Social Escolar.
Dizem os manifestantes «nem defesa da escola pública, nem defesa da escola privada. Defesa da escola, ponto». Bem vistas as coisas, será mesmo?