Cruzada contra a inveja
O Portugal estruturado em castas, em que as famílias remediadas serviam de coletores de serviçais; o Portugal em que a autoridade do padre, do professor, do juiz, do chefe de secretaria ser sobrepunham à lei, ao básico da consagração de cidadania, esse Portugal ainda anda na cabeça de muita gente.
Não raras vezes se ouve, dos antigos poderes e poderosos, uma consagração sobre os “alpinistas sociais” como que a desgraduar as oportunidades que um Estado moderno deve conceder a todos, como que a resmungar no apelo incessante aos dias antigos. Não, não voltarão. Os meninos de família não vão poder iniciar-se com as sopeiras; os senhores não vão poder sovar os seres que se entregavam por pão e sopa; as senhoras não vão poder sair da missa com a quota de pobres que lhe cabe, salvando-se do seu pecado permanente.
Eu até compreendo que quem perdeu esse país antigo possa barafustar. Só não compreendo os filhos dos caseiros que, entretanto, pela emigração ou negócio rendoso, compraram as quintas dos senhores, se afirmem pelo mesmo ponto de vista, pelo mesmo Portugal amordaçado.
Perguntarão para onde vai esta minha catilinária. Eu direi simplesmente que vai para todos aqueles que se revelam, a cada passo, contra o facto de haver cônjuges socialistas competentes, filhos de democratas conhecedores e trabalhadores, gente decente que se entrega à causa pública e está disponível para servir o país.
A nova Secretária de Estado da Saúde é uma das personalidades mais reconhecidas no país. Só não poderia aceitar o cargo porque é esposa de um deputado europeu, outro grande académico e quadro do PS. Este país perdeu o juízo, este país bateu no fundo. Talvez seja importante que não nos fiquemos perante o linchamento que as redes sociais nos fazem, que sejamos corajosos perante esta loucura.
Um ministro deve ter a sua vida e a sua esposa não se pode sujeitar estar na sua sombra; um deputado deve afirmar-se sem limitar o futuro de seus filhos; um gestor não tem que deixar de o ser só porque o companheiro também o é.
Não há em Zorrinho, em Cabrita, em Vieira da Silva, em César nada de que não se possam orgulhar. Eu tenho orgulho neles e no muito que têm dado ao país.