Calou-se a voz sem medo do jardinismo
Cala-se, assim, após aguçada e valente resistência durante o longo período jardinista, a voz mais controversa e respeitada da Imprensa da Região Autónoma da Madeira, a voz da “independência” que acompanhou os 40 anos da autonomia através da escrita e que sempre defendeu os princípios que norteiam a liberdade de expressão e de opinião.
Para o secretário nacional do PS Bernardo Trindade, falar do Tolentino de Nóbrega é “falar de um amigo”.
“De um grande amigo, cúmplice de tantos momentos. Mas falo dele como admirador. da sua condição de jornalista numa terra onde é muito difícil fazer-se jornalismo independente, de qualidade, dadas as limitações e dependências impostas pelo poder político”, disse, numa emotiva declaração ao AS Digital Diário, aquele que também se confessa admirador do pai e do esposo que foi “Tino”, como se habituou a chamá-lo.
“Curiosamente o Tolentino deixa-nos no momento em que termina esse ciclo [o jardinismo], como se possuísse poderes messiânicos que anunciam um novo tempo”, referiu Bernardo Trindade, sublinhando que o amigo jornalista e a voz de liberdade que lhe era reconhecida começam desde já a fazer muita falta.
Recorde-se que Tolentino de Nóbrega era atualmente correspondente do jornal “Público” regional, mas começou a sua carreira jornalística em 1972, como colaborador do jornal “Comércio do Funchal”, fazendo parte do corpo redatorial do “Diário de Noticias” da Madeira, entre 1974 e 1993.
Licenciado em pintura pela Escola de Belas Artes da Madeira, o jornalista dedicou-se também ao ensino.
Nesta área, Emanuel Jardim Fernandes, presidente honorário do PS-Madeira, destaca o trabalho realizado por Tolentino de Nóbrega como professor de Geometria Descritiva, sublinhando que, na docência e na cultura, o jornalista “deixou marcas numa geração de jovens”.
Do “cidadão atento e interessado”, disse o dirigente socialista, “fica a memória e o exemplo de uma personalidade marcante”.
De salientar ainda que Tolentino de Nóbrega foi, em 2006, um dos seis jornalistas condecorados com o grau de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique pelo então Presidente Jorge Sampaio.
Quando recebeu o Prémio Gazeta de 1998, disse, numa entrevista ao jornal “Record”, não ser um crítico de Alberto João Jardim, mas sim de “todas as formas de autoritarismo e de todas as formas de governo que desrespeitem as liberdades”.
E acrescentou: “Sem uma imprensa livre não há democracia. Se há, numa região de Portugal, pressões e coações contra jornalistas, restrições ao acesso às fontes de informação, não há democracia plena, há défice democrático.”
Ironias da vida, o estado avançado da doença prolongada não permitiu a Tolentino de Nóbrega acompanhar o ato eleitoral que selaria o fim do jardinismo.