Ainda o Syriza
Vale a pena recordar que, há cerca de um ano, coincidindo em parte com a entrada em funções da nova Comissão Europeia, mas claramente antecedido de um movimento de reflexão e propostas surgidas na família socialista, havia sido encetado um debate sobre o modo como deveriam ser futuramente desenhadas políticas alternativas ao rigor extremo das receitas austeritárias.
Essa receitas, impostas pelas “troikas” mas que ecoavam uma filosofia dominante cega ao sofrimento imposto às polulações, afinal acabara por ter, num caso como o nosso, meros efeitos cosméticos no número do défice, que escondem um agravamento trágico da dívida, do PIB, do desemprego, da emigração, das desigualdades e das clivagens sociais, para além de uma carga fiscal elevadíssima, com uma brutal queda do investimento.
Com efeito, em Portugal como noutros países, essas políticas haviam mostrado à evidência a sua ineficácia, revelando-se detrimentais para o crescimento, afetando fortemente a eficácia das políticas públicas, o que havia gerado uma perigosa desafetação dos cidadãos com a própria ideia europeia.
A nova Comissão Juncker dava sinais de ter entendido esta mensagem trazida pela realidade e, no discurso assumido e nas suas primeiras medidas, notava-se que algumas lições tinham sido aprendidas. A conjugação com as propostas que a Europa socialista estava já a desenvolver parecia então possível.
A austeridade não afetou todos os países da mesma forma e, por isso, em cada um deles, as consequências políticas acabaram por assumir expressões diversas. Na Grécia, um país cuja situação económico-social havia atingido níveis de desespero, o voto concentrou-se no Siryza, um partido radical que havia feito da luta contra a austeridade a sua quase única bandeira.
A vitória do Siryza foi saudada em muitos países europeus como a expressão de que, também na Grécia, se abria uma nova frente na luta europeia contra as políticas de austeridade. Em Portugal isso também aconteceu e António Costa e outros dirigentes políticos e muitos comentadores deixaram, com naturalidade, uma nota pública pública de respeito pela decisão democrática do povo grego.
O que ninguém podia prever foi o modo como o novo governo grego veio a colocar-se perante as instituições de que o país era credor. Ao adotar uma postura negocial sem um mínimo de flexibilidade, o governo grego não apenas se deixou encurralar num “beco sem saída” – com as consequências que hoje estão à vista – como acabou por “caricaturar” o combate às políticas austeritárias, como se estas se pudessem resumir à sua agenda confrontacional. Com esta atitude, a Grécia acabou por facilitar a vida à ala conservadora europeia, que não queria ver postas em causa as opções que havia feito na linha das políticas de austeridade que havia imposto aos seus países.
O debate sereno e moderado que antes havia sido iniciado pela família socialista europeia, com apoio da nova liderança da Comissão Europeia, ficou assim fortemente prejudicado. E o que se viu foi a imposição, no imaginário público europeu, da ideia de que só havia duas posições: ou a atitude “à grega” ou o prosseguimento das receitas anteriores, impostas pelas “troikas” e por quantos lhe tinham imposto tal filosofia. A Grécia, aliás, foi quem acabou por pagar um duro preço ao não ter sabido colocar-se no debate com realismo e moderação.
É assim tão difícil compreender isto?