Áfricas
Não tem sentido tentar esconder, por detrás de um qualquer discurso congratulatório, a subsistência de naturais diferenças, na abordagem de certas temáticas, nomeadamente as que se prendem com questões de democracia, de Direitos humanos e do funcionamento do Estado de direito. Se algum exemplo mais concreto fosse necessário, aí estaria o recente caso do acesso da Guiné-Equatorial à CPLP como prova de que nem sempre as perspetivas coincidem. Mas isso faz parte da natureza de Estados que nascem e evoluem em contextos diferentes, com histórias e processos internos muito díspares. A sabedoria de uma diplomacia madura reside, precisamente, na capacidade de sublinhar os fatores de identidade e de potencial aproximação, não deixando que a magnificação das diferenças prejudique aquilo que é essencial.
Ao longo das quatro décadas que passaram desde a independência das colónias africanas, não raramente o, também variado, olhar de Lisboa divergiu do dos governos desses novos Estados, quer na avaliação dos esforços para a sua reconciliação interna, quer no modo como alguns valores comummente aceites pela comunidade internacional, em matéria político-institucional, neles mereceram observância. Curiosamente, e em tempo mais recente, vimos também emergirem, da parte desses Estados, críticas a determinados aspetos do sistema institucional português.
Às vezes, o tom de algumas dessas apreciações ultrapassa o razoável, roça a ingerência, pode ser lido como desrespeitoso das ordens jurídico-políticas. A linha é muito fina entre aquilo que pode configurar uma legítima observação sobre certas disfunções dos sistemas e um tom crítico que pressupõe a não aceitação dos fundamento da ordem de valores em que eles se apoiam.
Compete aos agentes políticos manter a serenidade e ver um pouco para além da espuma polémica de alguns dias, de algumas vozes mais excitadas e de alguns títulos de jornais. Cabe às diplomacias, sob a sua orientação, preservar e desenvolver o tecido comum de relações e olhar para ele na perspectiva da História e dos interesses comuns de que se alimenta.