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A FALSA NARRATIVA DA DIREITA

A FALSA NARRATIVA DA DIREITA

A coligação partiu para a campanha eleitoral com uma estratégia bem definida: esconder Passos Coelho dos eleitores, a começar pelos debates com os outros partidos; capitalizar a sorte de beneficiar de uma ténue retoma económica totalmente depende das decisões do Tribunal Constitucional (que impediram cortes salários das função pública, nas pensões, nos subsídios de doença, nos subsídios de desemprego e nas pensões de sobrevivência), da politica expansionista do BCE, da forte baixa do preço do petróleo, e no regresso do consumo a crédito; e transformar as eleições num referendo às políticas passadas e propostas do PS, chamando o desempenho económico e orçamental dos anteriores governos socialistas para a campanha.

Opinião de:

A FALSA NARRATIVA DA DIREITA

Este último eixo da estratégia da coligação assenta, porém, num conjunto de mitos sobre o passado e sobre as propostas eleitorais do PS.

Sobre o passado, a direita afirma sempre que pode que, durante a primeira década do século XXI, os governos socialistas estimularam o consumo privado e apostaram no investimento público para fazer crescer a economia. Esta narrativa, conveniente para descrever o que se teria passado entre 2000 e 2008, tem apenas um problema: é falsa.

Durante este período, o consumo privado cresceu em média 1,6% ao ano, um dos valores mais baixos da União Europeia, e muito inferior ao registado na Grécia, Espanha ou Irlanda. Quanto ao investimento público, este esteve praticamente estagnado ao longo de toda a década, apenas crescendo nos anos de 2009 e 2010, resultado das políticas anti-cíclicas acordadas por todos os países da UE como esforço coordenado para combater a maior crise económica global das últimas décadas. Não é de espantar que, num contexto de combate a uma crise, este pacote de estímulo assentasse no investimento público; ao contrário da despesa corrente, que é mais difícil de cortar no futuro, a despesa de capital é discricionária e é relativamente fácil invertê-la (como aliás aconteceu).

Naturalmente, estes mitos, propagandeados ao longo da última legislatura, continuam a ser usados hoje para caraterizar o programa eleitoral do Partido Socialista para os próximos quatro anos, como se a sua estratégia económica assentasse simplesmente no estimulo à procura. Esta crítica, porém, não passa de uma caricatura e não resiste a uma análise séria.

O que o Partido Socialista propõe é uma estratégia concertada de médio prazo que articula de forma equilibrada medidas do lado da procura e do lado do oferta. Dela constam medidas que, por um lado, visam aliviar os orçamentos familiares e das empresas – o crédito mal parado continua a subir, sinal de que continua a haver seriíssimos problemas de liquidez nas famílias e nas empresas portuguesas – e que, do outro, incentivem a modernização empresarial e estimulem o investimento privado, alavancado numa execução desburocratizada dos fundos comunitários.

A direita bem pode agitar o papão dos excessos do consumo privado e do investimento público, mas o objetivo da estratégia do PS é outra: facilitar o desendividamento das famílias e das empresas e evitar o recurso ao crédito para financiar o consumo; desbloquear o investimento privado; reorientar o investimento público para investimentos cirúrgicos de proximidade; e sujeitar as grandes obras públicas futuras a um amplo consenso interpartidário.

O mais marcante da falsa narrativa da direita, porém, é o seu descaramento. Descaramento sobre o passado – na década passada, o ano em que o consumo privado mais cresceu foi num ano em que o pais era governado pela coligação PSD/CDS (2,5% em 2004) –, sobre o presente – praticamente todo o crescimento atual de que a coligação se vangloria está assente no consumo privado, e ainda por cima alavancado no regresso do crédito ao consumo -, e sobre o futuro: como mostram os cálculos da UTAO, o Plano de Estabilidade 2015-2019 do governo assume que em 2019, o consumo privado pese mais no PIB em 2019 (65,1%) do que pesava em 2010 (62,1%). Esta é mais uma prova de que, com este governo, não só não houve como não haverá qualquer transformação estrutural da economia portuguesa.