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Opinião: Dissonância discursiva

Opinião: Dissonância discursiva

Economia em queda. Colapso da confiança. Investidores a fugir do país. Saque fiscal. Descontrolo das contas públicas. Segundo nos garante a oposição, tudo isso que está a acontecer em Portugal. O país vive uma espécie de PREC e caminha para o abismo. Que a realidade (e a lucidez) teime, sistematicamente, em desmentir a histeria deste tipo de discurso parece ser coisa de somenos importância. A oposição entrou em modo pós-factual e vê o apocalipse em todo lado.

Na frente económica, mesmo com as sucessivas revisões em baixa da economia mundial e europeia, todos os indicadores apontam para uma aceleração do crescimento em Portugal, invertendo a tendência que se vinha verificando desde o segundo trimestre de 2015. É certo que a economia cresce menos do que o Governo previa e que cresce menos do que é necessário, mas não há qualquer fundamento para dizer que a economia está a desacelerar, muito menos que está em queda, como afirma a oposição (e alguns comentadores).

No investimento não há nenhum colapso, nem o atual Governo ou a maioria que o suporta destruiu a confiança dos investidores. Segundo o INE, o investimento empresarial subiu cerca de 8% no primeiro semestre de 2016 e os empresários, durante o primeiro semestre de 2016, reforçaram as suas intenções de investimento para este ano. O volume recorde de candidaturas a fundos europeus confirma esta tendência.

Quanto ao investimento direto estrangeiro (e apesar deste não ter necessariamente relação com o investimento em contas nacionais, que é o que conta para o PIB), ao contrário do que diz um cartaz do CDS, não caiu desde que este Governo assumiu funções; aliás, aconteceu o contrário: subiu.

O Investimento total está a cair, não por causa de qualquer colapso na confiança dos investidores, mas, em grande medida, porque os fundos europeus estão a arrancar mais lentamente do que seria desejável e porque 2015 foi o ano de encerramento do último quadro comunitário, o que implica uma execução mais elevada nesse ano, embora com uma forte travagem no segundo semestre.

A aceleração da execução dos fundos, que está a acorrer; a recuperação no investimento em construção, que os últimos indicadores de licenciamento confirmam; e o atual bom comportamento do investimento empresarial, que deverá ser reforçado, tudo isto aponta para uma recuperação do investimento a partir do segundo semestre de 2016. Aliás, no segundo trimestre de 2016, apesar de cair em termos homólogos, já houve crescimento em cadeia.

A queda da taxa de poupança das famílias, que vinha ocorrendo desde o primeiro trimestre de 2013, foi travada. Isto mostra que o crescimento do consumo se faz hoje numa base mais sustentável do que nos últimos 3 anos. Como nos diz o INE “o crescimento do rendimento disponível das famílias resultou principalmente do aumento de 0,8% das remunerações recebidas, devido sobretudo às remunerações pagas pelas Sociedades Não Financeiras (taxa de variação de 0,9%). Os impostos pagos sobre o rendimento e património diminuíram, efeito que foi parcialmente compensado pelo aumento das contribuições sociais das famílias”. Ou seja, mais emprego e maiores salários (fim dos cortes nos funcionários públicos e aumento do salário mínimo) e, ao contrário do que muitos afirmam, menos impostos pagos pelas famílias. Estes números mostram que, sem a devolução de rendimentos feita em 2016, o rendimento disponível das famílias seria menor, o que, sem uma nova redução (insustentável) da taxa de poupança, implicaria necessariamente menos consumo privado. Não faz, portanto, qualquer sentido dizer que a estratégia de devolução de rendimentos falhou, porque ela está a ter exatamente o efeito pretendido: aumento do rendimento disponível das famílias, travagem da queda da taxa de poupança e crescimento do consumo sustentável, assente no crescimento do emprego e dos salários e sem fazer disparar as importações.

E aqui chegamos às finanças públicas, o tal diabo de que falava Passos Coelho. Ora, contrariamente a todas as previsões de que as metas orçamentais seriam inatingíveis e de que a política de aumento de rendimento e reposição de direitos iria levar ao descontrolo do défice e a um segundo resgate, eis que chegamos ao final de setembro com o Conselho de Finanças Públicas a melhorar a sua previsão para o défice em 2016 (passou de 2.7% para 2.6%), com as agências de rating a dizer que estão tranquilas com Portugal e com a DBRS, em particular, a elogiar a execução orçamental do primeiro semestre. Depois de se saber que o défice no primeiro semestre ficou em 2.8%, melhorando 1.8% face ao período homólogo, quando a meta anual implica que melhore cerca de metade, parece que quem precisa de um plano b são os catastrofistas e a oposição, não seguramente o Governo.

Portanto, em suma: o colapso da economia e da confiança é uma ficção, a subida da carga fiscal é um mito, o fracasso da estratégia económica é uma história muito mal contada, não consta que haja uma fuga de investidores e as contas públicas, essas, parecem bem encaminhadas, não só para ficarmos com um défice abaixo dos 3%, mas, sobretudo, para que 2016 seja o primeiro ano, desde 2007, em que Portugal cumpre ou fica abaixo da meta do défice acordada com a Comissão Europeia. Não será o paraíso, mas não é seguramente o inferno de que fala a oposição.

(in Expresso)