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PRESTAÇÕES SOCIAIS SEM CONDIÇÃO DE RECURSOS

PRESTAÇÕES SOCIAIS SEM CONDIÇÃO DE RECURSOS

Desde que se iniciou um tempo novo em Portugal, com o governo do PS, apoiado nos acordos celebrados com BE, PCP e PEV, para além, das inversões de privatizações que ainda foi possível travar e/ou minorar, e da recuperação de rendimentos por parte de trabalhadores e pensionistas, foram criadas várias prestações sociais em áreas que têm a ver com a satisfação de necessidades básicas dos cidadãos.

Opinião de:

PRESTAÇÕES SOCIAIS SEM CONDIÇÃO DE RECURSOS

Foi o caso em matéria de educação da possibilidade de todos os alunos do 1.º ano terem acesso a manuais escolares gratuitos, medida já alargada este ano a todos os alunos do 1.º ciclo. 

No caso do acesso a transportes públicos, após a travagem do processo de privatização da Carris e no quadro da sua municipalização foi adotado um novo tarifário em toda a rede da Carris e do Metro, com a redução de 60% no passe para utilizadores com mais de 65 anos, de que resultou que em três meses mais de 300 000 idosos tiveram acesso aos transportes públicos, e com tarifários gratuitos para as crianças até aos 12 anos.

E, recentemente, o primeiro-ministro António Costa anunciou o restabelecimento a partir de setembro do passe sub23 que permite um desconto de 25% nos transportes aos estudantes do ensino superior.

O que há de comum a todas estas medidas é o facto de se dirigirem à satisfação de necessidades básicas e não ter sido fixada uma condição de recursos para os seus destinatários poderem beneficiar das mesmas.

A questão que se poderá colocar é a de saber porque é que estas medidas, que são apoiadas pelos partidos de esquerda, não são graduadas em função dos rendimentos dos seus destinatários.

Numa ótica social-democrata a redistribuição de rendimentos deve ser feita através da tributação sobre os rendimentos, designadamente, do IRS, definindo com rigor os escalões e a sua progressividade, não sendo legítimo que por pagarem e bem impostos significativamente mais elevados os que têm maiores rendimentos se vejam discriminados negativamente no acesso a prestações sociais que têm a ver com a satisfação de necessidades básicas.

A circunstância de não haver condição de recursos evita a criação de uma máquina burocrática dispendiosa para verificar os rendimentos declarados por cada um, sendo certo que quem paga mais impostos pagaria, de novo, mais para este efeito.

Medidas deste tipo têm ainda a virtude de gozar de um apoio social alargado, permitindo reunir em torno da sua defesa não só as classes trabalhadoras, mas também as classes médias, aliança essencial para tornar viáveis medidas que retomam a mais antiga tradição social-democrata. Medidas de tipo universalista, ao contrário daquelas que são segmentadas em função dos rendimentos, como quer a direita, permitem ainda três coisas: 1) menor corrupção, pois se todos beneficiam, não é preciso enganar o Estado, 2) maior sentido de coesão coletiva e intergeracional, 3) são mais difíceis de reverter pelos governos de direita no futuro.

Quem leu o testamento de Tony Judt, Um Tratado sobre os nossos atuais descontentamentos, e a sua preocupação com o futuro da social-democracia digna desse nome, poderá responder que, entre nós, ela está viva, bem viva, a desenhar os contornos do futuro.