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O VÍRUS QUE PÔS O MUNDO ÀS AVESSAS

O VÍRUS QUE PÔS O MUNDO ÀS AVESSAS

No dia em que dou as boas-vindas à Primavera e comemoro o dia mundial da poesia, releio convosco parte do poema que ontem Manuel Alegre escreveu:<em> Lisboa não tem beijos nem abraços/ não tem risos nem esplanadas/ não tem passos/ nem raparigas nem rapazes de mãos dadas/tem praças cheias de ninguém/ […]/ ainda é Lisboa de Pessoa alegre e triste/ e em cada rua deserta/ ainda resiste</em>. Lisboa resiste. E o país com ela. Todos nós temos de resistir. E ganhar tempo para vencer o monstro invisível.

Opinião de:

PPUE 2021

Fomos todos – neste pronome indefinido incluo os países, os governos, as instituições, os cientistas, os académicos, os médicos, os analistas, os mercados, as pessoas – apanhados desprevenidos. Ninguém estava preparado para uma tal calamidade. Ninguém a poderia prever. Ainda ninguém conhece verdadeiramente o bicho. E estamos longe de encontrar o antídoto.

A mim parece-me o prolongamento de um pesadelo noturno que o amanhecer não desvaneceu. Sinto-me como figurante forçada de um filme de terror ou de ficção científica. Eu que nunca apreciei tais géneros. Perante este poderoso inimigo, porque invisível e devastador, o meu lado racional manda-me seguir todas as recomendações das autoridades de saúde e do Governo. Ficar em isolamento social e familiar (à letra, não sair de casa e não ver filhas nem netos), manter horários, estabelecer rotinas, fazer exercício físico, ter cuidado com a alimentação, apanhar sol por causa da vitamina D, lavar as mãos, lavar muitas vezes, lavar durante tanto tempo que, se não fosse o creme hidratante, a minha pele pareceria lixa.

Rendo-me à evidência: o que tem de ser tem muita força.

O ser humano não é uma máquina, embora alguns nos queiram fazer crer que sim. Temos sensações, pensamentos, emoções. Em situações-limite, de extrema adversidade e incerteza, as emoções podem impelir-nos para o erro. Já se percebeu que, na situação de emergência em que nos encontramos, o erro de um pode pôr em perigo a vida de muitos. Queiramos ou não, estamos todos no mesmo barco no meio de uma enorme tempestade, sem terra à vista. Porque a imprudência individual tem consequências na vida coletiva, ninguém tem o direito de correr riscos que, no fim da cadeia de ligações e relações, podem conduzir à morte, não se podendo prever (nem prevenir) de quem nem de quantos. Socorro-me da metáfora para melhor se compreender a dura realidade. Somos trapezistas sem rede, o descuido de um é a morte do outro.

Resta-nos, pois, seguir as orientações de quem tem competência e legitimidade para as dar, confiar nas autoridades de saúde e no Governo, e percebermos que precisamos, como nunca, uns dos outros. Só unidos venceremos.

Estou com Miguel Sousa Tavares, “António Costa tem sabido gerir com um misto de coragem e sangue-frio praticamente inatacáveis uma situação de uma gravidade que nenhum primeiro-ministro enfrentou antes em democracia”. No meio de tão grande tormenta, conforta-me saber que temos na Presidência da República e na chefia do Governo políticos experientes, democratas e humanistas. Façamos nós a nossa parte.